Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

terça-feira, 21 de novembro de 2023

Macau - Palestra sobre adaptação para cinema e teatro de obras de Senna Fernandes na Fundação Rui Cunha

“O que é melhor, o filme, ou o livro?”. Esta e outras questões associadas à adaptação de textos literários para cinema ou outras expressões como o teatro vão estar em debate na Fundação Rui Cunha, numa palestra da Associação dos Amigos do Livro em Macau que conta com Shee Va, Miguel de Senna Fernandes, e dois actores chineses que participaram naquela que foi a primeira adaptação para teatro inspirada em contos do autor macaense


Shee Va, médico gastroenterologista e escritor, revelou ao Ponto Final detalhes do debate a decorrer hoje, às 18h30, na Fundação Rui Cunha que, antes de mais, é “uma homenagem que a Associação dos Amigos do Livro em Macau quer prestar a Henrique de Senna Fernandes na comemoração do centenário do seu aniversário”.

Intitulada “A Arte para Além da Escrita: Adaptar Henrique de Senna Fernandes”, a sessão conta com Shee Va, Miguel de Senna Fernandes, e ainda os actores Chau Wai Fong e Un Kuok Weng, que em Outubro fizeram parte da peça de teatro organizada pela Associação de Cultura e Arte de Macau, numa adaptação do primeiro livro de Senna Fernandes. A encenação tomou como base a primeira história da colectânea de contos ‘Nam Van’, “da tancareira, e depois desenvolveram a história introduzindo alguns elementos do conto ‘Chá com essência de cereja’”, esclareceu o responsável.

Durante a palestra, pretende-se desconstruir e compreender os processos de adaptação de literatura para outras formas de expressão que, defende Shee Va, não podem nunca ser considerados uma tradução, sendo, acima de tudo, criações. “Sempre que se fala em adaptação de romances para cinema pergunta-se o que é melhor, se é o filme, ou o livro? Normalmente as pessoas têm tendência a dizer que é o livro. Porquê? Porque no livro há sempre a descrição do autor, e ficamos a conhecer os personagens não por aquilo que eles dizem, mas por aquilo que eles pensam e a maneira como o autor trata essas personagens”. No entanto, no cinema, o personagem já está a ver reproduzido através da “visão do realizador ou de quem escreveu o guião. Portanto essa é uma outra criação. Mesmo que se faça uma adaptação, essa é uma criação. Normalmente não podemos dizer que seja uma tradução, isto é, não se traduz palavras em imagens, mas faz-se uma nova criação”.

Nesse sentido em que o realizador ou o guionista “toma conta da história”, mas depois faz a sua versão e torna-a sua, o organizador da palestra quer justamente ir ao fundo deste questionamento e trocar impressões sobre o que, por um lado, foi o feedback do autor em concreto sobre adaptações das suas obras para cinema, e, por outro, as visões que outras comunidades tiveram ao pegarem nestas obras do autor macaense.

Concretamente, recordou Shee Va, sabe-se que Henrique de Senna Fernandes “dizia que não tinha gostado da adaptação feita por Luís Filipe Rocha” de “Amor e Dedinhos de Pé”, tendo preferido a outra adaptação para cinema de um livro seu, “A Trança Feiticeira”. Este será, aliás, um dos pontos de discussão durante a sessão. “Eu tenho a minha perspectiva”, e Miguel de Senna Fernandes terá outra. “Vamos pôr isso em discussão”. Shee Va quer também perguntar ao filho do autor se “todas as sessões culturais que foram feitas para comemorar o centenário do nascimento do pai foram suficientes ou não”.

O organizador da palestra admitiu ter a impressão que Henrique de Senna Fernandes é um grande autor de língua portuguesa em Macau, mas que a população chinesa de Macau desconhece. “A iniciativa da Associação em realizar aquela peça de teatro foi importante porque isto deu alguma visibilidade à obra de Henrique de Senna Fernandes na comunidade chinesa”. Fazer esta “extensão da língua portuguesa e da vivência portuguesa em Macau, para a comunidade chinesa” é importante, e interessante de analisar, referiu. “Os actores da peça de teatro vão partilhar a vivência deles e conhecimento que tinham em relação a Henrique de Senna Fernandes antes e depois da peça de teatro, e a maneira como viveram os personagens, e se a forma como Henrique de Senna Fernandes escreve pode ser vista de uma perspectiva chinesa”.

Para Shee Va, haver esta conversa com os actores é estimulante, já que, ao se acrescentar a perspectiva chinesa à discussão, está-se a “abrir um pouco esta janela, que está cingida à comunidade portuguesa e convivência com a comunidade chinesa e macaense”. Segundo o responsável falta neste diálogo um “reverso, isto é, como é que os chineses vêem esta descrição e este convívio”.

A Associação dos Amigos do Livro em Macau foi criada em 2005 “com o objectivo de unir as comunidades de Macau à volta do interesse pelo livro, fomentar o gosto pela leitura como forma de lazer e de desenvolvimento cultural, especialmente entre os jovens, contribuir para um maior conhecimento das literaturas da China, de Portugal e do Mundo, promover autores locais, da China Continental, de Portugal, e de outros países e criar incentivos à produção literária local”, referiu a Fundação Rui Cunha em nota.

Shee Va diz que está nos planos próximos da associação criar mais encontros de leitura, “comemorar outros centenários de autores portugueses, e também alargar o campo da leitura não só em língua portuguesa, mas também em inglesa e chinesa”.

“A Arte para Além da Escrita: Adaptar Henrique de Senna Fernandes”, sessão organizada no âmbito do ciclo Conversas sobre o Livro, irá decorrer em português e chinês, com tradução consecutiva. Rita Gonçalves – Macau in “Ponto Final”


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