Reforma Agrária: Sim ou Não? Entre 1975 e 2002, Angola
experimentou diversos modelos de produção agrícola, tais como os Agrupamentos
de Unidades de Produção Agrícola, os Complexos Agrários, as Unidades Económicas
Estatais, as Associações Coletivas de Produção e as Empresas Territoriais de
Café. Modelos esses que fracassaram por não terem atingido os seus objectivos
de rentabilidade agrícola e financeira. Por outro lado, desde essa data, o
Estado Angolano não deu o devido apoio à cadeia produtiva das "Empresas
Agrícolas Familiares" que em África são a base da produção agrícola
A
partir de 2002, o Estado adoptou uma política de desenvolvimento agrário,
assente principalmente na "agricultura intensiva", (criação dos
grandes complexos agroindustriais, que por falta de uma estratégia e de
políticas agrárias bem definidas, também não atingiram os objetivos
preconizados - diversificação e aumento da produção agropecuária, e
desenvolvimento socioeconómico das regiões - e onde foram inseridos esses
Projectos.
Há
pois a necessidade de se inverter a actual situação, que continua a caracterizar-se
pela fraca organização da cadeia produtiva, baixos rendimentos produtivos,
ausência de uma assistência técnica condigna, falta de experimentação e
pesquisas, pouca vulgarização e fomento, ausência de crédito agrícola simples
mas funcional e de um comércio rural mais consistente, de melhorias na rede
viária rural, da eletrificação do meio rural, na falta de meios relevantes, que
constituem pressupostos básicos e essenciais para o desenvolvimento sustentado
da agricultura.
Também
é certo que muito se tem feito no sentido de apoiar financeira e materialmente
os sectores produtivos agrícolas privados, contudo os resultados têm cado muito
aquém de todos os investimentos feitos até ao momento.
Talvez
a solução para dinamizar e alavancar o sector produtivo passe por estratégias
que visem aumentar exponencialmente o número de produtores, distribuindo
parcelas de terra e diversificando as medidas de organização de fomento da
produção, em vez de medidas pontuais e de projetos sem continuidade.
Seguindo
esta linha de pensamento, é necessário que se dê oportunidade a todos os
Angolanos que queiram trabalhar na agricultura, para que possa surgir uma nova
classe de micro, pequenos e médios produtores agrícolas.
No
entanto, para que esta reformulação estrutural aconteça, é necessário garantir
e assegurar os seguintes pressupostos:
Retorno Negociado
- Que se faça regressar ao meio rural este exército de jovens desempregados que "pululam" por todas as cidades do País e que dizem querer trabalhar, mas que não encontram emprego.
Para
os cidadãos que estiverem dispostos a regressar ao campo para desenvolverem a
actividade agropecuária, silvícola e outras, seria dado como incentivo pelo seu
regresso, o salário mínimo nacional mensal por um período de 6 meses, tempo
necessário para o seu enquadramento e para uma primeira colheita.
Estes
teriam primazia na escolha da zona de inserção.
Trabalho Produtivo Obrigatório
- Que se identifiquem os cidadãos que deliberadamente persistem em cometer actos pouco cívicos e ilícitos, e tenham capacidade para desenvolver actividade agrícola ou outra relacionada com o campo, reintegrando-os de forma obrigatória no Meio Rural.
Formação de um 4º Ramo das Forças Armadas
- Que se crie um 4º Ramo das Forças Armadas, (ao que julgo saber, era uma ideia do falecido General João de Matos), para todos os indivíduos em idade militar obrigatória que se encontram em situação de desemprego prolongado, que não foram enquadrados nas épocas militares
A
estes cidadãos seria dada a missão de construírem e reconstruirem
infraestruturas, recuperação de maquinaria, abertura de novos agrupamentos
agrícolas, tornando-se eles próprios novos agricultores e transformando a
antiga C.A.D.A. num polo de formação técnico profissional.
Investimento diferenciado e sustentado na Mulher Rural
- Que se invista e se capacite a Mulher de forma diferenciada, uma vez que esta representa o principal e verdadeiro pilar da empresa agrícola familiar, fortalecendo-a como parceira rural.
Identificação
e Cadastramento de Agentes Rurais
- Que sejam identificados e devidamente cadastrados todos os agentes que vêm desempenhando actividade técnica específica nos vários domínios do sector agrário (para profissionais locais), que com formação e capacitação específica adequada, contínua, pragmática e funcional, poderão colmatar o vazio de técnicos ao nível das aldeias, comunas e municípios;
- Que sejam também reenquadrados e/ou reconvertidos outros quadros com alguma experiência e formação no sector agrícola ou em outros sectores, para exercerem actividades no meio rural, tais como: extensionistas, agentes sociais e culturais, viveiristas, melhoradores de sementes, operadores de máquinas, aquicultores, pecuaristas (ATP"s), agentes fitossanitários e outros especialistas.
Investimento em Cursos Técnicos e Estruturas de Apoio
Técnico
- Que sejam formados técnicos básicos com ligação ao campo, construindo ou reactivando-se escolas como a antiga CATOFE (1978/1982), uma vez que a experiência demonstrou ser extremamente difícil colocar um quadro médio ou superior a viver na comuna/município do interior;
- Que se revitalizem as Brigadas Técnicas e EDA`s, as estações experimentais agrícolas e zootécnicas, transformando-as em verdadeiros polos de experimentação e de pesquisa, mantendo um intercâmbio permanente com outras instituições congéneres, nacionais e estrangeiras.
Financiamento e Crédito
- Que se crie um Banco de Fomento Agrícola, com políticas de juros baixos, subsídios e subvenções, que possa gerir doações, financiamentos e empréstimos de instituições financeiras internacionais, e se extingam os Fundos de Desenvolvimento da Agricultura e do Café, por não terem alcançado os seus objectivos;
- Que se crie um Crédito Agrícola facilitado e bonificado, atribuído preferencialmente às associações e às cooperativas, por forma a evitar o crédito malparado, atraindo e potenciando a integração dos pequenos produtores nestas agremiações (estudar o crédito da antiga E.R.A.).
- Que se ponha em prática a bonificação dos combustíveis, de maneira simplificada, que para além do exposto no Decreto Presidencial 84/19 de 14/03/2019, poderá ser feita do seguinte modo:
a)
Para as P.M.E.A. numa proporção dos impostos pagos à A.G.T.;
b)
Para as associações, cooperativas, produtores agrícolas individuais empresas de
preparação de terras, subsídios feitos em função da área cultivada, como por
exemplo, 2.000.00 Kz por hectare trabalhado.
Todos
os beneficiários desta bonificação deverão estar inscritos no órgão de tutela e
no MINFIN locais.
Certamente
que não haverá agricultura rentável se o preço dos combustíveis subir como está
previsto.
Programas Agrícolas
- Que sejam elaborados Programas de verdadeiro incentivo e fomento para as culturas industriais tradicionais, tais como: algodão, oleaginosas, arroz, cereais, café robusta e arábica, cacau, palmar, algodão, fruteiras, enfim um sem número de espécies agrícolas que encontram excelentes condições na imensidão de Angola;
- Que se fomente o Projecto Cajú para as regiões litorais mais áridas, estudando a experiência de Moçambique e do Brasil;
- Que seja dada uma atenção especial ao sector silvícola (oresta), fomentando o plantio do eucalipto e da gravíllea, do nhime, moringa e de outras espécies nativas para a criação de polígonos florestais, quer para a obtenção de madeira para carvão, quer para o melhoramento ambiental;
- Que a experiência de Cabinda com as culturas do café, cacau e palmar, seja replicada noutras províncias, com os devidos ajustes na metodologia e filosofia de trabalho;
- Que se dedique uma especial atenção ao sector pecuário, principalmente a pecuária do Sul e Sudeste de Angola, que deve ser repensada, uma vez que o sector, dito tradicional, representa cerca de mais de 80 % do efectivo pecuário de Angola. O quadrinómio: Homem - Animal - Pasto - Água deve ser levado em linha de conta;
- As pequenas espécies animais devem fazer parte do cardápio a fomentar pelo sector familiar;
- Que se aposte num modelo consistente de comercialização que estude o mercado e o preço e que aproveite a rede de comerciantes privados locais e produtores de média e de grande dimensão, que dispõem de infraestruturas e estejam interligados aos centros de logística, para facilitar e melhorar a cadeia de comercialização e distribuição, sendo esta a melhor forma para consolidar o processo produtivo agrícola no meio rural;
- Que as grandes empresas agrícolas, parceiras fundamentais desta reestruturação do sector agrícola, pela sua capacidade técnica e de produção, possam funcionar como pivot, no apoio às E.A.F.;
O
Estado deve desenhar políticas arrojadas de retorno paulatino destas populações
ao meio rural, assim como investir fortemente na formação básica e sólida de
técnicos, capacitando e habilitando-os devidamente para apoiarem o
desenvolvimento do sector agrícola, sem esquecer os apoios estruturais e financeiros
que tais iniciativas requerem.
Com
estas medidas e iniciativas, e com a adequada supervisão, poderemos certamente
verificar nos próximos anos um aumento significativo da produção e
enquadramento de novos produtos na cadeia de produção agrícola, com o benefício
social e económico que o País num todo poderá beneficiar.
Esperemos
que numa década, nos tornemos numa potência agrícola regional, tendo em conta o
nosso potencial agro-ecológico.
A
história diz-nos que nenhum país travou com êxito o "Êxodo Rural".
Se
nos anais da nossa História obtivemos Vitórias quando a derrota era anunciada,
se tivemos sucessos na harmonização pacífica da nossa sociedade quando ninguém
acreditava, porque não tentar uma fórmula nossa, "sui generis" de
retorno dessas populações...
Para
a implementação desta Reestruturação Agrícola deveríamos ter a Humildade de
estudar, para discussão, os fundamentos da filosofia e da metodologia de
trabalho da antiga Junta Provincial de Povoamento (J.P.P) e da Extensão Rural
(E.R.A.) e ouvir antigos quadros, quer angolanos, quer portugueses, para melhor
compreensão do funcionamento destas instituições, que contribuíram grandemente
para o desenvolvimento de algumas regiões rurais, apesar do contexto em que
funcionaram, como também as políticas e estratégias que outros países usaram na
implementação das suas reformas agrárias.
Propomos
assim, uma ampla participação da sociedade onde todos, principalmente os
antigos quadros do sector agrícola, agricultores, assistentes sociais,
sociólogos, psicólogos, militares, dirigentes de partidos políticos, ONG,
organizações da sociedade civil, deveriam ser chamados a opinar sobre a
necessidade ou não de uma "Reforma Agrária".
Estas
são apenas algumas ideias, que visam contribuir para revitalização do sector agrícola,
ainda que para muitos algumas delas possam ferir direitos fundamentais. O
importante deve ser discutir os problemas e arranjar as melhores soluções.
Nota:
Os 50 anos de experiência e vivências no sector, dão-me com certeza alguma
autoridade moral, por pequena que seja, para poder falar sobre o assunto,
acrescido ao facto de eu ter sido também um produtor agrícola (cafeicultor). O
confinamento domiciliar provocado pelo Covid-19, alertou-me que as mudanças
podem acontecer. Por isso resolvi dar este contributo, com as limitações
próprias dos "HUMANOS". Francisco
Santos – Angola in “Novo Jornal”
Francisco Cohen dos Santos - Regente Agrícola (Eng. Técnico Agrário) do
Tchivinguiro
Mt bom o post, parabéns! Depois dá uma conferida no nosso Comprar Mudas de Banana EMBRAPA. Vlw!
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