“Vicente Risco e a nossa língua
No dia 30 de abril de 1963 falecia em Ourense
Vicente Risco, faz agora 50 anos. Nos últimos tempos a sua figura está a ser
muito controvertida. Com um grande debate em artigos de imprensa, entre
estudiosos e investigadores. Na maioria dos casos, os comentários não têm em
conta o contexto vital de Risco, a sua formação e leituras, a sua poliédrica
personalidade, as muitas etapas pelas que passou o seu pensamento e o ter sido
um vulto importantíssimo para a cultura da Galiza. Recomendo ler o opúsculo
escrito por Jesús de Juana, sobre ele, que me parece o mais acertado de todos.
E a tese de doutoramento a ele dedicada pelo inspetor de ensino e meu ex-aluno
José Fernández, quando se editar. Aproveitando a data, e o estar às portas do
mês de maio, o mais relacionado com as nossas letras, quero comentar o que
Risco pensava sobre a língua da Galiza. Na revista Nós, números 6 e 7 do ano
1921, editada em Ourense, Vicente Risco publica um estupendo projeto, que
intitula “Plano pedagógico para a galeguização das escolas”. Este plano, além
de ser muito revelador de que Risco estava totalmente ao corrente das
tendências educativas do momento e dos princípios da Escola Nova europeia, não
tem um mínimo desperdício. Para publicar em revistas especializadas estou a
preparar um amplo artigo sobre o seu pensamento educativo. Esta vez quero
comentar o que pensava sobre o nosso idioma. Destacando que durante bastante
tempo assumia a escrita lusófona para a língua galega, tal como a que uso desde
sempre eu nos meus artigos. Na sexta secção do projeto antes citado, sob a
epígrafe de “O Galego na Escola”, entre outras cousas, Risco escreve: “O ideal
seria que o ensino se desse em língua galega”. Esclarece que sobretudo para que
o mestre seja compreendido, ali onde a língua materna dos rapazes for o galego,
como é o caso do meio rural. Por isso assinala que não se pode deitar para fora
das aulas o nosso idioma, e se o fizermos estamos a promover o auto-ódio e o
desprezo pela nossa Terra, além de matar o nosso pensamento e a nossa literatura,
e favorecer a nossa baixa autoestima secular.
Para Risco usar nas aulas o nosso idioma tem
muitas vantagens pedagógicas. Entre elas destaca que desenvolve melhor a
inteligência dos estudantes, favorecendo a compreensão dos conhecimentos.
Empregando-o alternando com o castelhano, facilita a memória complicativa,
favorece comparar ambos os idiomas para chegar a falá-los, e influi muito na
formação de sentimentos positivos. Como são o de amar mais a Galiza e formar o
caráter dum jeito especial, pela musicalidade, doçura e suavidade que tem a
fala galega. Neste tema Risco está-se a adiantar em muitas décadas à ideia
atual da importância que tem a inteligência emocional, e que é preciso
desenvolver nos rapazes aprendizagens apreciativas. O que mais adiante escreve
é muito significativo, mesmo para hoje: “Ninguém pode pôr em dúvida a grande
vantagem de possuir dous idiomas, no lugar de só um. Não imos os galegos perder
estupidamente esta vantagem, esquecendo a nossa língua materna. Pois as nossas
duas línguas que temos são muito importantes: a castelhana é uma das que se
falam por maior número de almas no mundo. Ela abre-nos todos os países de fala
castelhana. A nossa, a galega, na sua forma portuguesa (galego e português são
dous dialetos de uma mesma língua) é uma das mais estendidas pelo mundo, mais
ainda que o castelhano. Ela abre-nos todos os países de fala portuguesa ou
lusófona. Seríamos parvos se perdêssemos uma destas potentes armas de luta pela
vida e de formação de cultura. O galego pode, com elas, abranger duas
civilizações”. A seguir Risco, depois do que assevera, assinala que não se pode
proibir que os rapazes se exprimam em galego, em todos os âmbitos e lugares e
nas suas perguntas aos docentes. Que, usando o método comparativo, nas aulas os
rapazes vejam as diferenças gramaticais e linguísticas entre ambos os idiomas.
Que se lhe outorgue importância à leitura de poemas, contos e relatos, bem
escolheitos, da nossa língua, de forma graduada. Que as leituras sejam bem
comentadas e explicadas e a literatura galega, e as suas figuras mais
importantes, sejam estudadas convenientemente e com estratégias adequadas. Que
também, em especial os estudantes melhores, elaborem poemas, inventem e redijam
contos e relatos em galego. No ponto sete do projeto acima citado, Risco
escreve sobre o ensino das cousas da Terra: a geografia e história da Galiza, a
vida de galegos e galegas ilustres, a arte galega, a literatura galega e as
ciências e disciplinas práticas: agricultura, indústrias, labores e trabalhos
manuais. Com aplicação à Nossa Terra. Mas, deste tema teremos que escrever
outro dia. Fica, de momento, dito o anterior, depois de se terem publicado
tantos e absurdos decretos nefastos para o nosso idioma na Nossa Terra. Que
Risco nunca aceitaria.” Paz Rodrigues –
Galiza in “Portal Galego da Língua”
Para um melhor conhecimento de Vicente
Martinez Risco y Agüero, intelectual galego do séc. XX (Ourense, 1 de Outubro
de 1884 - 30 de Abril de 1963), principalmente a sua biografia e obra literária,
aceda aqui. Baía da Lusofonia
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