“A subida de ranking internacional”
“Pela boca dos nossos mais elevados
dirigentes, Angola vai afirmando já uma firme determinação em sairmos da
presente incómoda posição de País de Baixo Nível de Desenvolvimento e passarmos
a ser tidos como um País de Desenvolvimento Médio. Para tal, o nosso governo
prometeu engajar-se numa redefinição das políticas públicas até então seguidas,
assim como dos objectivos estratégicos traçados nos sucessivos planos de
desenvolvimento. Fala-se, também, em maior atenção e melhoria da nossa
capacidade de execução e acompanhamento dos projectos, sobretudo, dos com maior
impacto social.
Essa importância atribuída ao sector social
deve-se muito ao facto de o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), calculado
anualmente pelo PNUD, ter um forte contributo de indicadores de carácter
social. Não basta, pois, termos um grande crescimento do Produto Interno Bruto,
pois ele terá que ser sustentável, devendo igualmente ser sustentáveis as
conquistas alcançadas no domínio social.
Recordo, por exemplo que, para o cálculo do
IDH concorrem 3 variáveis: o rendimento bruto per capita – exprimindo, de algum
modo, o nível de vida; a esperança de vida à nascença – que dá a ideia de quão
longo e saudável é a vida; e a média de anos de escolarização, conjugados com
os anos de escolaridade esperada.
Desses indicadores, somente um tem acento
meramente económico: o rendimento bruto per capita. Os restantes são
estritamente sociais, embora possam ser, indirectamente, influenciados pela
pujança económica dos países, se bem que numa relação não linear. Por exemplo,
há países, como o nosso, com um Produto Interno Bruto relativamente robusto,
mas sem boa qualidade de vida generalizada. Mas, o Desenvolvimento Humano pode
ainda ser visto na perspectiva do género ou até mesmo na sua distribuição por
grupos etários. De há uns anos a esta parte, as Nações Unidas criaram um
segundo Índice Global mais virado para a análise dos níveis de pobreza – o
chamado Índice de Pobreza Multidimensional (IPM).
Ainda assim, se considerarmos, em especial, a
vertente económica do desenvolvimento, o rendimento médio per capita torna-se
bastante insuficiente, pois não tem em linha de conta o grau de concentração do
rendimento nacional. Quer dizer que o rendimento per capita pode mascarar o
modo como o rendimento nacional está distribuído. Assim, faz todo sentido
socorremo-nos do chamado Coeficiente de Gini, que analisa se há maior ou menor
concentração do rendimento nacional em determinados grupos sociais. Mas,
voltemos, então, ao desejo de Angola passar a ser considerado País de
Desenvolvimento Médio.
Por norma, para haver uma alteração na tabela
classificativa dos países, em termos de desenvolvimento, tomam-se em conta os
seguintes indicadores: Produto Nacional Bruto (PNB) – que indica a capacidade
de geração de rendimentos; Índice de Capital Humano – como indicador das
reservas de capital humano; Índice de Vulnerabilidade Económica – como
indicador de resistência às crises externas.
De facto, desde o fim da guerra, a nossa
economia cresceu em níveis bastante apreciáveis – mas, convenhamos, muito por
causa das elevadas receitas geradas pelo petróleo. É demasiado visível o nosso
grau de dependência desse produto, não obstante se assista à retoma de outros
sectores económicos mas que, de modo algum, põem em causa a hegemonia do
petróleo.
O nosso crescimento económico ainda não se
traduziu numa melhoria acentuada das condições de vida das populações. São, por
exemplo, muito reduzidos os seus impactos no acesso e na qualidade da saúde, no
acesso e na qualidade do ensino e, muito em particular, na igualdade de
oportunidades. Há uma má distribuição da riqueza e do rendimento nacional que
tende a aprofundar-se.
No conjunto dos 8 países integrantes da CPLP
(Comunidade dos País de Língua Portuguesa), e em termos de IDH, estamos numa
incómoda sexta posição. No quadro dos 14 países da SADC (Comunidade de
Desenvolvimento da África Austral), somos também o sexto classificado.
Desde o ano 2000 até 2012, o Índice de
Desenvolvimento Humano de Angola passou de 0,375 para 0,508 pontos, uma subida
significativa mas que se encontra, ainda assim, abaixo da média mundial que é
de 0,680 pontos. Contudo, o crescimento dos nossos pontos deveu-se, sobretudo,
ao crescimento do nosso PIB. Foi esse crescimento do PIB que permitiu o aumento
significativo no nível do rendimento per capita, que, por sua vez, provocou um
forte impacto no cálculo do IDH.
Vou ouvindo já frequentes referências a
subidas e melhorias (algo súbitas e de desconfiar) em indicadores de carácter
económico e social. Fala-se mesmo numa redução muito acentuada nos níveis de
pobreza, em melhoria significativa nos níveis de escolaridade, na saúde, no
ambiente, inclusive, no gozo das liberdades democráticas. Muitas dessas
declarações soam claramente a mera propaganda. Do meu ponto de vista, pretende
passar-se para o exterior a mensagem de que estamos perante um sério
engajamento na via do cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.
Desconfio, pois, de “tanta fruta”, que se
nota ter sido amadurecida à pressa. Para mim, mais uma vez, há aqui um
indisfarçável exercício de ilusionismo que até nos pode custar caro, pois, uma
subida de patamar no ranking do desenvolvimento não tem apenas benefícios de
imagem pública e internacional. Passar para o patamar dos Países de
Desenvolvimento Médio acarreta, também outros ónus, por exemplo, o de perdermos
alguns benefícios e apoios internacionais, os créditos financeiros
internacionais serem mais onerosos e até mesmo as nossas contribuições
financeiras internacionais passarem a ser mais elevados, fruto do nosso
estatuto.
Quer então dizer que, afinal, à pompa da nova
imagem pública, dever-se-ão juntar dificuldades de vária ordem. Cabo Verde, por
exemplo, tem feito tudo para se prevenir contra essas eventuais desvantagens
advenientes. E nós, será que também estamos a levar isso em linha de conta?” Pinto de Andrade – Angola
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