Em tempos de pandemia, um novo livro lançado na Índia propõe um estilo de vida inspirado em Goa, onde a felicidade tem um nome, 'Susegad' ("sossegado"), e deve muito à cultura indo-portuguesa, disse o autor à Lusa
‘Susegad'
vem da palavra portuguesa 'sossegado', e tem sido projetado como ser relaxado
ou preguiçoso por muitos turistas. Mas para mim, e para muitos goeses, o
conceito original de 'susegad' é estar satisfeito consigo mesmo, com a
natureza, com o ritmo das estações do ano, e é este sentimento que eu tento
descrever e partilhar no livro", explicou à Lusa o escritor indiano Clyde
D'Souza.
Publicado
em inglês pela editora Penguin Random House, "Susegad: A arte goesa do
contentamento" defende a singularidade da cultura goesa, passando em
revista a influência de quatro séculos de colonização portuguesa, em busca da
receita para a felicidade.
"Já
havia livros sobre o 'Hygge', que é a forma de viver dinamarquesa, 'Lagom', o
modo de vida sueco, ou o 'Ikigai', o estilo japonês de vida sustentável, e
agora acrescenta-se o 'Susegad'", disse Clyde D'Souza, que vive em Mumbai,
a capital financeira da Índia, mas descende de goeses.
Diretor
de programas do popular canal de televisão 9XM, com dois livros anteriores
publicados, o escritor, de 44 anos, recorda as longas férias de verão passadas
em Goa, de onde vem a família, e onde ainda conserva uma casa.
"Eu
costumava ir de férias para Goa, em criança, para as belas casas
indo-portuguesas, com o tradicional balcão. A minha avó - em Goa muitas
crianças continuam a usar a palavra "avó", em português - chamava-me
o tempo todo 'maalkiryaat' ["malcriado", em concani]", ri-se.
Viver
'susegad' é, segundo o escritor, o maior anseio dos goeses, que usam
frequentemente a palavra de origem portuguesa na língua mais falada naquele
estado indiano.
"Quando
irritados, os goeses dizem com frequência, em concani: 'Maka suseg di' (Dá-me
paz e sossego)", recorda o escritor, no livro.
Para
o escrever, Clyde D'Souza entrevistou vários goeses de destaque, como a cantora
de fado Sónia Shirsat, o proprietário do restaurante luso-goês Horseshoe, Vasco
Sequeira, no bairro das Fontainhas, em Pangim, ou o músico goês Remo Fernandes,
a viver no Porto, em Portugal, retido na Índia pela pandemia na altura em que o
livro foi escrito.
O
objetivo do escritor, que sublinha que não se trata de um livro de auto-ajuda,
é resgatar um termo omnipresente no quotidiano daquela antiga colónia
portuguesa, onde a influência dos portugueses continua visível: do tradicional
"vindalho" (vinha de alhos) ao hábito de comprar 'pao' (pão) pela
manhã, passando pelas festas católicas ou o apego à sesta, que um político de
Goa já propôs tornar obrigatória, defendendo que é necessária para preservar o
estilo de vida 'susegad'.
"A
fusão entre a cultura portuguesa e indiana, o casamento destas duas culturas
tão diferentes, resultou em algo único. Uma das pessoas que entrevistei disse
uma coisa muito interessante: muitas antigas colónias de Portugal, como Macau,
Brasil ou Goa, parecem ter um modo de vida próprio", conta.
"É
difícil dizer o que conduziu às qualidades mágicas desses lugares, mas penso
que [no caso de Goa] está relacionado com a mistura entre a sensibilidade
europeia e a sensibilidade indiana", defende.
O
escritor analisou "a poção mágica", dos hábitos à cultura e ao clima,
cobrindo tópicos como comida, música, história e tradições, com capítulos com
títulos em concani ou português, como 'Kaantar' (Cantar), 'Casa' ou 'Viva re
viva', sobre a festa de São João e outras celebrações tradicionais.
"Quando
se vai a Goa, o humor muda completamente. Claro que há problemas, mas há alguma
coisa de especial", defende.
"A
ideia foi trazer essa magia, e mostrar que a forma como os goeses vivem, a sua
música, a sua comida, um simples banho de mar, podem trazer satisfação",
afirma.
E
se em Goa, sê goês, o escritor acredita que o estilo de vida 'susegad' pode ser
adotado por pessoas em todo o mundo, numa altura em que a pandemia condicionou
o quotidiano.
"A
pandemia trouxe um grau de consciência sobre a saúde mental e sobre a importância
de estar consciente e de tentar encontrar alguma paz, uma coisa com que todos
lutámos no último ano, e acho que o 'susegad' pode ajudar", defende.
"A
ideia não é que toda a gente se mude para Goa, o que não é possível, mas trazer
'susegad' para a vida das pessoas, independentemente de onde vivam",
afirma. In “Notícias ao Minuto” – Portugal com “Lusa”
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