Quatro longos meses do mais
longo cacimbo. Ontem foi finalmente anunciada a data do início do julgamento
dos activistas que têm estado no centro da vida política angolana. A notícia
foi como uma espécie de válvula de descompressão social, num momento em que o
país está na boca do mundo, e não pelas melhores razões.
Depois de um mês de greve de
fome, Luaty Beirão ocupou um espaço mediático correspondente à gravidade do seu
estado de saúde mas que acabou por remeter os demais presos políticos para um
perigoso segundo plano. O seu nome encheu praças e capas de jornal, hashtags e
cartazes, de Luanda a Lisboa, sem nunca conseguir com isso abrir uma brecha de
negociação com o governo, pelo menos até onde é sabido.
A inflexibilidade do Estado
angolano, perante uma exigência que merece ser ouvida, não só pelo atropelado
desenrolar do processo, mas também pelo risco de vida eminente do Luaty, deixa
Angola mal vista, dentro e fora de portas. Em nome da liberdade individual,
tantas vezes limitada por bem menos, assistimos a um “lavar de mãos” por parte
do Governo, obviando o facto dos activistas estarem detidos em instalações
penitenciárias, sob a responsabilidade de um Estado que tem o dever de proteger
a vida.
Mas é certo que a pressão
tem surtido algum efeito. Cada vez mais gente se posiciona publicamente sobre o
assunto dos 15+2. As críticas sobre como o Governo tem gerido este caso chegam
mesmo desde dentro do MPLA. No que diz respeito ao Luaty, também ele viu a sua
condição melhorada. Só que enquanto ele recebia assistência médica adequada à
sua condição, numa clinica privada providenciada pelo Estado, refira-se,
surgiam rumores de agressões aos outros presos, inclusive a Albano Bingobingo,
um dos que está em greve de fome. Aqui se vêem as consequências de uma
reivindicação demasiado focada num deles, em vez de em todos. Adivinha-se
também um certo aproveitamento, procurando dividir o grupo e até mesmo as
famílias.
Entretanto, é triste
observar o esforço para descredibilizar uma onda de solidariedade que se
levantou espontaneamente, fruto exclusivo do cacimbo angolano, tão distante das
primaveras que nos tentam impingir ao jantar.
De um lado, Luaty continua
em greve de fome. Tenho lido a palavra “herói” demasiadas vezes. É daquelas
palavras que a imprensa gosta, palavras que vendem jornais. Mas como disse Mia
Couto, muito bem lembrado na excelente carta de Luís Bernardino, “infeliz do
país que precisa de heróis”.
De outro, a Justiça está,
hoje mais do que nunca, entre a espada e a parede, entre a pressão da sociedade
civil e a pressão do poder político. O terceiro factor de pressão é, sem dúvida,
o tempo. Por mais que se tente adiar, a decisão mais sensata, capaz de acalmar
os ânimos e restituir algum norte para que as investigações prossigam, é que
eles aguardem pelo dia 16 em casa. Só assim se alivia o desgaste político e emocional
acumulados, a manipulação mediática e a indignação da sociedade. Habeas Corpus
já, para todos. E que já seja hoje. Aline
Frazão – Angola in”Rede Angola”
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