As aulas de capoeira do brasileiro Eddy Murphy estão a
dar medalhas e a formar campeões em Macau, mas também estão a servir para
ensinar português a crianças de mais de uma dúzia de países
À
tarde, num ginásio num centro comercial na ilha da Taipa, há tradições, línguas
e costumes que são convocados à reunião, para tocar, jogar e dançar, bem como
cantar, nomear dos pés à cabeça partes do corpo e contar números, sempre em
português.
“A
capoeira é o maior veículo de divulgação da língua portuguesa”, sentencia Eddy
Murphy, até porque está presente em centenas de países, salienta, enquanto os
mais pequenos praticam ‘capoeiragem’, a expressão brasileira que o mestre quer
que em Macau signifique que há mais vida para além da competição que a arte
marcial arrasta.
Em
Macau, são muitos os países que habitam as aulas de capoeira do brasileiro –
que se fixou há cerca de duas décadas na Ásia -, e do Grupo Axé Capoeira, do
mestre Barrão. Nas ‘t-shirts’ dos alunos está estampada a expansão, escrita a
várias cores: Brasil-China-Macau-Hong-Kong.
Tarzan,
Formigão, Amarela, Tangerina, Amazonas, Eddy Murphy, Pensador, Luz e Açaí são
alcunhas de algumas das crianças e jovens que representam também diferentes
geografias, da Malásia ao Canadá e Japão, dos Estados Unidos a Singapura, da
Tailândia e Indonésia até aos países lusófonos como Brasil e Portugal, e que se
cruzam no antigo e multicultural território administrado pelos portugueses,
agora região administrativa especial chinesa. Caleb, que por ali, na
‘capoeiragem’ de Macau, é conhecido pela alcunha de Pensador, nasceu em
Singapura, filho de pai canadiano e mãe norte-americana.
Mais
expansivo que a irmã, descreve-se, atirando a idade e nome, bem como a alcunha
de Katie (Luz). E explica o peso das aulas de capoeira na segurança e fluência
no português que evidencia, orgulhoso: “Também [aprendemos] numa escola
portuguesa, também aprendemos ali”.
Ao
lado, Eddy Murphy, de 53 anos, acrescenta o ‘pormenor’: os mais pequenos
chegaram primeiro, depois vieram os pais, e, com a necessidade de os filhos
entenderem melhor as aulas de capoeira, acabaram por os fazer entrar na Escola
Portuguesa de Macau. Eddy Murphy garante que a arte de ‘cozinhar’ esta fusão é
simples de se entender pela integração social e construção de pontes,
asseguradas pela arte marcial que vive da dança, da música e da cultura
popular.
“A
gente trabalha com ela [capoeira] em todos os sentidos. A capoeira tem várias
vertentes: a arte marcial, [e] a integração, que é o mais importante”, diz
Ednilson Almeida, conhecido pelo título de mestre na ‘tribo’ da arte marcial,
que o batizou de Eddy Murphy por causa “dos disparates” juvenis “que faziam
todos rir”, lembrando o comediante e actor norte-americano Eddie Murphy. “Macau
é a base da federação asiática”, diz. Foi na cidade que decorreu no ano passado
um campeonato mundial de capoeira, no qual os ‘capoeiristas’ treinados por Eddy
Murphy arrebataram “a maioria das medalhas”, uma delas a de ouro, frisa.
Haverá
uma meia dúzia de campeões em Macau, entre asiáticos e mundiais, mas o que
realmente importa na capoeira sobrevive à ausência de títulos, depreende-se das
palavras de Mariana, ali batizada de Amarela, e que aceita sem pruridos a
apresentação do mestre, como se pecasse por defeito: “a melhor ‘capoeirista’ de
Macau”. Tem 13 anos, é portuguesa nascida em Macau, e gosta de “conviver com
pessoas (..) dentro do grupo, (…) ensinar as crianças a jogar capoeira” e de
ser um modelo, para “mostrar às crianças que é possível fazer coisas em que
podem não acreditar [que são capazes]”.
Desde
os dois anos e meio a ser treinada por Eddy Murphy, começa a dizer que “é giro
ver como todos evoluem à sua maneira”, porque todos são diferentes, para logo
depois ser completada pelo mestre: a capoeira “é uma coisa tribal, para que
todos nos sintamos em casa, incluídos”.
Mais
do que em casa está a filha, Khiari, que treina na mesma ‘tribo’ que o pai fez
nascer. Açaí, como é conhecida pelos membros da capoeira, começou desde cedo a
perceber a importância de fazer amigos e de conhecer outras culturas. Entre
sorrisos cúmplices, aquela que é uma das campeãs da ‘tribo’ da capoeira de
Macau, a jovem de nove anos é ‘incentivada’ pelo punho de Eddy Murphy a
corrigir a resposta à pergunta “É duro ter o pai como mestre?”, substituindo um
“é bom” por um “é muito bom”. João Carreira – Agência Lusa in “Ponto
Final”
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