Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

domingo, 6 de dezembro de 2020

Internacional - Investigadoras portuguesas na fronteira da exploração do mar profundo

Depois de Marte é, provavelmente, o mais enigmático local que a Humanidade não pisou: o mar profundo. Batizado de Challenger 150, em alusão ao Challenger Deep, o ponto mais profundo do planeta, um novo programa com cientistas de todo o mundo propõe trazer à superfície o conhecimento escondido no fundo dos oceanos. Ao leme, a bióloga Ana Hilário, da Universidade de Aveiro (UA), quer tornar o Challenger 150 numa referência da Década da ONU da Ciência do Oceano para o Desenvolvimento Sustentável


“O mar profundo [vastas extensões de água e fundos marinhos entre os 200 e os 11000 metros abaixo da superfície do oceano] é reconhecido globalmente como uma importante fronteira da ciência e da descoberta”, aponta a bióloga marinha Ana Hilário, coordenadora do Challenger 150 a par com Kerry Howell, investigadora na Universidade de Plymouth (Reino Unido) e especialista em Ecologia do Mar Profundo.

Apesar de o mar profundo representar cerca de 60 por cento da superfície da Terra, sublinha a investigadora do Centro de Estudo do Ambiente e do Mar (CESAM) da UA, “uma grande parte permanece completamente inexplorada e a Humanidade conhece muito pouco sobre os seus habitats e como estes contribuem para a saúde de todo o planeta”.

Para colmatar esta lacuna, Ana Hilário e Kerry Howell juntaram à sua volta uma equipa de cientistas de 45 instituições de 17 países que propõe um programa de investigação, com a duração de 10 anos, dedicado ao estudo do mar profundo. De Portugal, para além da equipa da UA, também contribuíram para o desenho do programa também cientistas do CIIMAR (Universidade do Porto), do Okeanos (Universidade dos Açores) e do CIMA (Universidade do Algarve).


O Challenger 150 - o ano 2022 marca o 150º aniversário da expedição do navio HMS Challenger que circum-navegou o globo, mapeando o fundo do mar, registando a temperatura global do oceano, e proporcionando a primeira perspetiva da vida no mar profundo - irá coincidir com a Década das Nações Unidas da Ciência do Oceano para o Desenvolvimento Sustentável, que decorre de 2021 a 2030.

“Um dos grandes objetivos do Challenger 150 é a capacitação e aumento da diversidade no seio da comunidade científica, uma vez que atualmente a investigação no oceano profundo é conduzida principalmente por nações desenvolvidas com recursos financeiros suficientes e acesso a infra-estruturas oceanográficas”, explica a bióloga portuguesa.

Este programa, esperam os cientistas, irá também gerar mais dados geológicos, físicos, biogeoquímicos e biológicos através da inovação e da aplicação de novas tecnologias, e utilizar estes dados para compreender como as mudanças no mar profundo afetam todo o meio marinho e a vida no planeta. Este novo conhecimento será usado para apoiar a tomada de decisões a nível regional, nacional e internacional sobre questões como a exploração mineira nos fundos oceânicos, a pesca e a conservação da biodiversidade, bem como a política climática.

Mais e melhor colaboração e conhecimento

Mas o mergulho no mar profundo do Challenger 150 só será possível através da cooperação internacional. Por isso, os investigadores do programa publicam hoje um apelo na revista Nature Ecology and Evolution enquanto, simultaneamente, publicam um esquema detalhado do Challenger 150 na revista Frontiers in Marine Science.


Liderada por membros das redes internacionais Deep-Ocean Stewardship Initiative (DOSI) e Scientific Committee on Oceanic Research (SCOR), a lista de autores dos dois artigos inclui cientistas de países desenvolvidos, emergentes e em desenvolvimento de seis dos sete continentes. Os cientistas alegam que a Década anunciada pela ONU proporciona uma oportunidade ímpar de unir a comunidade científica internacional para dar um salto gigantesco no nosso conhecimento das profundezas do oceano.

“A nossa visão é a de que, dentro de 10 anos, qualquer decisão que possa ter impacto no mar profundo, seja de que forma for, será tomada com base num conhecimento científico sólido dos oceanos”, aponta Kerry Howell. Para que isso seja alcançado, sublinha a investigadora britânica, “é necessário que haja consenso e colaboração internacional”.

Ana Hilário antevê que “a Década proporciona a oportunidade de construir um programa a longo prazo de formação e capacitação de recursos humanos em ciências do oceano”. Com o Challenger 150, “pretendemos formar a próxima geração de biólogos do mar profundo. Vamos concentrar-nos na formação de cientistas de países em desenvolvimento, mas também de jovens cientistas de todas as nações, incluindo Portugal”.

Tal formação, acredita, “irá criar uma rede reforçada que permitirá aos países exercer plenamente o seu papel nos debates internacionais sobre a utilização dos recursos marinhos dentro e fora das suas fronteiras nacionais”. Universidade de Aveiro - Portugal







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