Filho de artesão, aos 14 anos aprendeu a arte do pai:
resgatar histórias em folhas amareladas e trazer nova vida aos livros velhos,
de tanto lidos, desgastados ou maltratados pelo uso e pelo tempo
Com
toda a paciência e a minúcia que o ofício exige, Marcelo Rodrigues senta-se ao
pé de uma pilha de livros, pega num e o começa a desmontar. Primeiro retira a
capa e, de seguida, cuidadosamente, separa, folha a folha, até não se
reconhecer livro no amontoado de papel. Com perícia, para não se perder nenhum
elemento importante da identificação da obra e para preservar a sua
originalidade, Marcelo dá início a um novo processo.
Sempre
com a mesma calma, primeiro limpa, depois estica as arestas e organiza, tudo
bem alinhado, antes de ser colado e costurado. Da capa aproveita-se tudo o que
de informação possa conter. Recorta-se e junta-se a um novo material que vai
ser o cartão de visita para a história no seu interior. E, neste quesito,
Marcelo capricha para que a aparência seja a mais convidativa possível. Afinal,
um livro não é apenas o seu conteúdo, mas também um objecto de atracção.
Durante
a sua carreira, este mestre da arte de encadernar já passou por várias instituições
do país. Desde o Arquivo Histórico Nacional (na cidade da Praia) a câmaras
municipais, escolas e bibliotecas. Não possuindo uma oficina própria,
desloca-se aonde o seu engenho e arte forem solicitados. É também uma forma,
mais prática, de realizar a tarefa e poupar os livros, já desgastados, dos
estragos de uma eventual viagem.
Actualmente,
Marcelo Rodrigues é o único que faz este tipo de trabalho em São Vicente e dos
poucos que ainda restam em Cabo Verde inteiro. Além de São Vicente, já prestou
os seus serviços nas ilhas de Santiago, Fogo e Brava e, garante, trabalho não
lhe falta.
“Só
para dar um exemplo, houve uma altura e que fui chamado para trabalhar durante
três meses na ilha Brava e acabei por ficar lá durante quatro anos. Havia muito
trabalho a ser feito”, recorda. Neste momento, por coincidência, prepara-se
para mais uma maratona na ilha das flores, terra de Eugénio Tavares, nome
incontornável da cultura cabo-verdiana.
Arte em extinção
Marcelo
Rodrigues lamenta, entretanto, que esta seja uma caminhada solitária. Não há
interesse dos jovens em aprender este ofício que ele aprendeu com o pai, que
morreu em 2002.
Pensando
precisamente no futuro da encadernação artesanal, Marcelo convidou um grupo de
dez jovens para receberem dele uma formação gratuita. Do grupo, resta apenas um
dos elementos, no caso uma jovem estudante, Vanusa Delgado, chegou ao fim da
formação e que agora continua ao seu lado, a trabalhar. In “A Nação”
– Cabo Verde
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