Os
tempos mudam. Houve uma época em que um ciclista passava diante das casas e
jogava o jornal do dia para os assinantes, enrolado com um elástico. Me lembro
de meu pai saindo para buscar o leite e o pão e voltando com o jornal do dia,
enquanto minha mãe preparava o café.
Isso
acabou. A quase totalidade dos que lêem jornal utilizam o celular ou o
computador. Uma enorme economia de papel com a desativação das enormes
impressoras, seguida de demissões no setor gráfico. Uma realidade mundial, cuja
consequência é o fechamento de jornais ou, numa fase inicial, a diminuição de
suas tiragens.
Essa
transição acaba de ocorrer aqui na Suíça com o grande grupo de imprensa
Tamedia. Iniciado em 1893, o grupo cresceu e se estendeu pelos cantões suíços,
criando e editando os jornais mais lidos do país. Para se entender sua
importância cultural e mesmo política, deve-se lembrar de ter a população suíça
uma excelente formação escolar e colegial proporcionada pelo país. O hábito da
leitura não só de jornais como de livros faz parte do cotidiano da população.
Dentro
desse quadro favorável à expansão, o grupo criou três grandes centros gráficos
abastecendo a Suíça em jornais, livros e impressos. Até chegar a transição
digital, implicando na redução para um só centro gráfico e diminuição de
tiragens dos jornais, mesmo porque muitos assinantes preferem ter acesso à
edição online. Para se ter uma ideia, estão ligados direta ou
indiretamente aos produtores impressos do grupo Tamedia cerca de 5.5 milhões de
pessoas, num total de cerca de quase 9 milhões de habitantes.
As
economias com essa transformação devem ser direcionadas para o futuro digital,
mas fazem vítimas entre os gráficos e entre os jornalistas e pessoal ligado à
imprensa tradicional. O primeiro corte é da ordem de 20% no pessoal. Os mais
jovens saberão encontrar se adaptar e encontrar variantes no mundo digital, os
outros sofrerão o choque. Esse choque será mais doloroso para os profissionais
da Suíça francesa, onde a transição do papel para o digital é mais lenta que na
Suíça alemã.
É
difícil de se imaginar, mas dois importantes centros de impressão serão
desativados e terão suas rotativas imobilizadas, enquanto cerca de 150 gráficos
perderão seu emprego, seguidos por mais 50 trabalhando nas redações dos jornais
com páginas e tiragens diminuídas. Felizmente essa transição não será imediata
e está prevista para ser concluída durante 2026.
Com
a existência de um único centro de impressão em Berna, os jornais da região de
Zurique e Genebra terão de editar suas edições diárias, fechar mais cedo, no
jargão jornalístico, para assegurar o transporte e distribuição dos jornais
para os assinantes e centros de venda de jornais, revistas e impressos em
geral. Como já ocorre, os assinantes dos jornais online já têm acesso à
edição atualizada depois do fechamento da edição destinada à impressão.
A
direção de Tamedia, junto com seu plano de transição, assegurou seu objetivo de
seguir as inovações da mídia no mundo digital sem perder em termos de
jornalismo de qualidade. Depois de vinte anos de adaptações aos modelos de
informação, a direção de Tamedia considera ter chegado o momento de mudanças
radicais.
Em
todo mundo, os grandes grupos de mídia vão se adaptando à transformação digital
de seus veículos de informação. Isso também inclui a edição de livros em
versões digitais. As salas de cinema sofrem igualmente o impacto da
individualização da visão dos filmes por streaming, com consequências num
redimensionamento e na importância dos festivais. Rui Martins – Suíça
______________
Rui Martins é
jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador
do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas,
que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos
emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu Dinheiro sujo da
corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto
Carlos, A rebelião romântica da Jovem Guarda, em 1966. Foi colaborador do
Pasquim. Estudou no IRFED, l’Institut International de Recherche et de
Formation Éducation et Développement, fez mestrado no Institut Français de
Presse, em Paris, e Direito na USP. Vive na Suíça, correspondente do Expresso
de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.
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