A notícia de que Angola lidera a lista de vistos concedidos pelos consulados portugueses espalhados pelo mundo gerou um amplo debate sobre aquilo que todos já sabem, mas que fingem que não está a acontecer. Os angolanos não são a maior comunidade de estrangeiros em Portugal, esta honra cabe à comunidade brasileira, mas os angolanos lideram a lista de cidadãos que mais imigram para Portugal. Todos os dias, partem do País jovens sem previsão de regresso, e mais outros partiriam se pudessem. A crise financeira, o desemprego, a falta de estabilidade política, económica e social, a falta de perspectivas e as incertezas quanto ao futuro têm provocado a fuga de muitos quadros qualificados do País
Entre
Janeiro e Agosto de 2024, o Consulado-Geral de Portugal em Luanda concedeu 6026
vistos a cidadãos angolanos, um aumento considerável se comparado ao mesmo
período do ano de 2023, em que foram concedidos apenas 734 vistos. Isto,
segundo informação divulgada pelo Jornal Público de 05 de Setembro último, teve
como fonte dados do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal. Se, no
ano passado, a missão consular portuguesa em Luanda era o sexto maior centro
emissor de vistos para Portugal (superado pelos consulados na Cidade da Praia,
São Paulo, São Tomé, Rio de Janeiro e Salvador da Baia), neste, estamos no topo
da lista, e, pelo andar da carruagem, ainda vamos liderar durante um bom
período. E os números só não são mais expressivos porque ainda existem muitas
barreiras e outros condicionalismos que limitam a concessão de vistos. É que se
mudam os tempos e unem-se as vontades. E a vontade de muitos angolanos é a de
voar daqui para fora. As autoridades fazem disto um tabu, o assunto não entra
nas agendas dos debates mediáticos, finge-se que não se vê, que não se ouve e
que não se lê. Até mesmo governantes e pessoas bem posicionadas no aparelho do
Estado, da Cidade Alta e do Partido (entenda-se MPLA) criaram condições e têm
"despachado" os seus familiares para Portugal. É tudo e todos a voar
daqui para fora.
Tenho
dito que o Presidente João Lourenço tem de olhar para estes cenários com
atenção e preocupação, e o seu Executivo deve criar condições para atrair os
angolanos que estão lá fora e manter os que cá estão. Ter hoje um visto para
Portugal, Espanha, França, Bélgica, Brasil, Reino Unido ou Países Baixos
representa para muitos cidadãos a realização de um sonho. O sonho de uma vida
melhor e de novas oportunidades. É uma fuga ao sofrimento, à fome, à miséria e
à falta de oportunidades que muitos enfrentam. É procura por melhor
estabilidade social e económica, de melhor educação e saúde para os seus filhos.
Ter uma casa em Portugal, ter filhos lá a estudar e um bom seguro de saúde faz
parte das prioridades de muitos altos quadros e funcionários da Cidade Alta, de
membros do Executivo de João Lourenço e outros. Esta semana, o NJ traz os dados
e números dos nossos cidadãos que estão a voar daqui para fora, trazendo o
testemunho de uma mulher que se mudou para Portugal com a família, em 2017, e
na busca de estabilidade social. As pessoas cujas vidas dependem da decisão de
sair do seu País irão cruzando fronteiras em busca de novas oportunidades. Tudo
isso é reflexo de falta de respostas aos anseios dos jovens, à falta de
credibilidade nas lideranças e à fragilidade das instituições. Ninguém deixa o
seu País, a sua família e os seus amigos por capricho. A vida de imigrante não
é fácil. Os processos de inclusão e de adaptação ao país acolhedor nem sempre
são fáceis. As pessoas estão a partir em busca de qualidade de vida, em busca
de saúde e educação para si e os seus filhos. Faz-nos falta uma estratégia para
a diáspora. Precisamos de um programa nacional de acompanhamento e apoio ao
desenvolvimento da nossa diáspora. Uma estratégia que valorize o seu potencial,
a sua qualidade, a sua dimensão cultural, humana, técnica, científica e
académica. Não se pode deixar prolongar este sentimento que a solução está em
voar daqui para fora. Temos de criar condições para que os nossos cidadãos não
tenham de sair do País para ir atrás de condições de emprego, saúde e educação
lá fora. Temos de ter estratégias para atrair para a terra aqueles que estão lá
fora. Não podem estar todos a querer voar daqui para fora. Temos de encarar o
assunto com verdade e frontalidade. Armindo Laureano – Angola in “Novo
Jornal”
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