Sete artistas locais e internacionais vão ter as suas obras expostas na Galeria Lisboa na Doca dos Pescadores, convidando o público a reflectir sobre o conteúdo virtual e digital, e a forma como este interage com a existência humana contemporânea. Com a curadoria da MyLand Culture, a exposição “Revelation To_” é um dos quatro projectos locais apoiados pela Bienal de Arte deste ano. No dia 6 de Outubro, a exposição arranca com um concerto de música experimental de “thetiredandar”, e no dia 14 de Outubro, o artista de Nova Iorque Clement Valla vem a Macau para uma palestra sobre arte digital. Também figura no programa de actividades complementares um workshop de ‘Ink Rubbing’ com a artista Fan In Kuan
A
partir do dia 6 de Outubro vai ser possível visitar uma mostra colectiva de
sete artistas locais e internacionais que procura explorar a crescente
importância das relações virtuais, do conteúdo digital, do algoritmo e dos
dados. Através de várias reflexões artísticas, as dez obras expostas na Galeria
Lisboa na Doca dos Pescadores vão debruçar-se sobre temas como a geografia e o
mundo, os jogos e os brinquedos, a linguagem e a escrita, o amor e o “yuanfen”
(coincidência fatídica), a moeda e o comércio, a criação e a apropriação, a
memória e a comemoração, e a numerologia e destino. “Numa era em que a
potencial substituição dos humanos pela Inteligência Artificial (IA) é um tema
de debate frequente, esta exposição pretende catalisar uma reflexão profunda
sobre uma geração que vive imersa em dados e encontros virtuais”, referiram aos
responsáveis Lam Sio Man e Pal Lok Chok da organização MyLand Culture, que
promove a mostra.
“Relevation
To_” é uma exposição local com curadoria da Bienal de Arte de Macau. Na página
da bienal pode-se ler que a mostra “reflecte sobre o profundo impacto que a
inteligência artificial tem nas novas gerações, e questiona a intersecção entre
crenças religiosas tradicionais e desenvolvimentos tecnológicos mais recentes”.
Os artistas convidados Fan In Kuan, Leong Chi Mou, Leong Chon, Ani Liu, Marta
Stanisława Sala and Cheong Kin Man, Clement Valla e Lu Zhang exploram a
“essência da tecnologia, da fé e do destino humano sob o prisma de brinquedos,
textos, imagens, coincidência fatídica, geografia, numerologia e documentário”.
Os visitantes, explica ainda a organização, são convidados a entrar na vida de
“_”, uma identidade virtual que é nomeada através de um sistema de adivinhação
electrónica.
Clement
Valle, artista baseado em Nova Iorque, vai trazer a Macau as suas cartas
postais do Google Earth, um trabalho reconhecido mundialmente pela forma como
esta ferramenta de realidade virtual de uso corrente é revelada. “Postcards
from Google Earth” (2010-presente) foi feita a partir de ‘screenshots’
de paisagens em que as estradas e outros elementos aparentam ter erros, e estar
distorcidas. “Descobri momentos estranhos em que a ilusão de uma representação
perfeita da superfície da Terra parece desfazer-se”, explica o artista. “No
início, pensei que eram falhas ou erros no algoritmo, mas, olhando mais de
perto, percebi que a situação era mais interessante – estas imagens não são
falhas. São o resultado lógico absoluto do sistema. São uma condição limite –
uma anomalia dentro do sistema, um não-padrão, um outlier até, mas não
um erro”.
Estes
momentos de choque, destaca Clement Valle, expõem a forma como o Google Earth
funciona, centrando a nossa atenção no software, e “revelam um novo modelo de
representação, não através de fotografias indexadas, mas através da recolha
automática de dados de uma miríade de fontes diferentes, constantemente
actualizadas e infinitamente combinadas para criar uma ilusão perfeita”. O
Google Earth é uma base de dados disfarçada de representação fotográfica, frisa
o artista, e “estas imagens estranhas centram a nossa atenção no próprio
processo e na rede de algoritmos, computadores, sistemas de armazenamento,
câmaras automatizadas, mapas, pilotos, engenheiros, fotógrafos, topógrafos e
cartógrafos que as geram”. Clement Valle estará no dia 14 de Outubro na galeria
Lisboa para falar sobre o seu trabalho, com uma palestra sobre arte digital às
15h.
Outros
trabalhos destacados pela MyLand Culture são “A.I. Toys (unboxing mania)”, de Ani
Liu, em que vários módulos de IA conseguem criar nomes de brinquedos inéditos
através de um programa de aprendizagem automática, recorrendo a dados reais de
brinquedos comercializados como brinquedos para “rapazes” e “raparigas”, num
questionamento sobre o condicionamento dos géneros, e a forma como a
programação digital interfere no processo de criação e comercialização de
brinquedos.
Leong
Chi Mou, artista de Macau, vai apresentar na mostra duas obras, ambas de 2023:
“NeOracle”, que funde os métodos tradicionais de adivinhação chineses com
algoritmos para criar um novo oráculo, e a obra encomendada “Divine Drawing”,
uma máquina com contornos humanos que produz arte 24 horas por dia, e que nos
faz ponderar sobre a noção tradicional de criação artística, agora que se
começou a atribuir significado à arte gerada por máquinas. Outra peça
encomendada especialmente para a exposição, “Apocalypses”, da dupla Marta
Stanisława Sala e Cheong Kin Man, mostra uma “heterotopia, entrelaçando
narrativas auto-etnográficas e têxteis dentro de um clássico bíblico”,
esclarece a organização, e as obras “Pataca” e “Twelve Records” de Fan In Kuan,
“misturam recordações históricas com imaginação criativa, apresentando
relíquias culturais feitas à mão que resistem à replicação digital”. Fan In
Kuan vai orientar um workshop para famílias dedicado ao “Ink Rubbing” no dia 28
de Outubro, das 10 às 11h30.
Na
exposição também se questiona a forma como a tecnologia condiciona o amor e o
desejo. “It Takes Hundreds of Years to Sleep on the Same Pillow”, de Lu Zhang,
reinterpreta uma cena nostálgica de “O Romance dos Heróis Condor”, uma série
televisiva clássica de artes marciais de Hong Kong. Esta obra pretende
reflectir sobre a natureza simplificada e baseada em dados das relações românticas
que se formam a partir de plataformas de encontros virtuais, e outras
ferramentas que se usam nos tempos correntes. A obra de Leong Chon “Diego
Velázquez Retrato de Inocencio X”, e a peça encomendada “The Statistics of
Fortune Art Macao: The Best Painting of Macao International Art Biennale 2023”
replicam intencionalmente imagens digitais através de técnicas de desenho à
mão, recriando meticulosamente cada pixel individual, ao mesmo tempo que
invocam a rica história da pintura ao longo de milénios, explicou ainda a
organização.
No
dia da abertura de “Revelation to_”, às 18h do dia 6 de Outubro, vai
haver uma actuação de música experimental de “thetiredandar”, e haverá também
visitas guiadas gratuitas todos os domingos às 15h.
A
exposição, organizada pela Myland Culture e pelo Instituto Cultural de Macau,
estará até dia 30 de Novembro na galeria da Doca dos Pescadores. Rita
Gonçalves – Macau in “Jornal Tribuna de Macau”
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