Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

sexta-feira, 15 de setembro de 2023

Macau - Exposição sobre a condição humana na era do digital na Doca dos Pescadores

Sete artistas locais e internacionais vão ter as suas obras expostas na Galeria Lisboa na Doca dos Pescadores, convidando o público a reflectir sobre o conteúdo virtual e digital, e a forma como este interage com a existência humana contemporânea.  Com a curadoria da MyLand Culture, a exposição “Revelation To_” é um dos quatro projectos locais apoiados pela Bienal de Arte deste ano. No dia 6 de Outubro, a exposição arranca com um concerto de música experimental de “thetiredandar”, e no dia 14 de Outubro, o artista de Nova Iorque Clement Valla vem a Macau para uma palestra sobre arte digital. Também figura no programa de actividades complementares um workshop de ‘Ink Rubbing’ com a artista Fan In Kuan


A partir do dia 6 de Outubro vai ser possível visitar uma mostra colectiva de sete artistas locais e internacionais que procura explorar a crescente importância das relações virtuais, do conteúdo digital, do algoritmo e dos dados. Através de várias reflexões artísticas, as dez obras expostas na Galeria Lisboa na Doca dos Pescadores vão debruçar-se sobre temas como a geografia e o mundo, os jogos e os brinquedos, a linguagem e a escrita, o amor e o “yuanfen” (coincidência fatídica), a moeda e o comércio, a criação e a apropriação, a memória e a comemoração, e a numerologia e destino. “Numa era em que a potencial substituição dos humanos pela Inteligência Artificial (IA) é um tema de debate frequente, esta exposição pretende catalisar uma reflexão profunda sobre uma geração que vive imersa em dados e encontros virtuais”, referiram aos responsáveis Lam Sio Man e Pal Lok Chok da organização MyLand Culture, que promove a mostra.

“Relevation To_” é uma exposição local com curadoria da Bienal de Arte de Macau. Na página da bienal pode-se ler que a mostra “reflecte sobre o profundo impacto que a inteligência artificial tem nas novas gerações, e questiona a intersecção entre crenças religiosas tradicionais e desenvolvimentos tecnológicos mais recentes”. Os artistas convidados Fan In Kuan, Leong Chi Mou, Leong Chon, Ani Liu, Marta Stanisława Sala and Cheong Kin Man, Clement Valla e Lu Zhang exploram a “essência da tecnologia, da fé e do destino humano sob o prisma de brinquedos, textos, imagens, coincidência fatídica, geografia, numerologia e documentário”. Os visitantes, explica ainda a organização, são convidados a entrar na vida de “_”, uma identidade virtual que é nomeada através de um sistema de adivinhação electrónica.

Clement Valle, artista baseado em Nova Iorque, vai trazer a Macau as suas cartas postais do Google Earth, um trabalho reconhecido mundialmente pela forma como esta ferramenta de realidade virtual de uso corrente é revelada. “Postcards from Google Earth” (2010-presente) foi feita a partir de ‘screenshots’ de paisagens em que as estradas e outros elementos aparentam ter erros, e estar distorcidas. “Descobri momentos estranhos em que a ilusão de uma representação perfeita da superfície da Terra parece desfazer-se”, explica o artista. “No início, pensei que eram falhas ou erros no algoritmo, mas, olhando mais de perto, percebi que a situação era mais interessante – estas imagens não são falhas. São o resultado lógico absoluto do sistema. São uma condição limite – uma anomalia dentro do sistema, um não-padrão, um outlier até, mas não um erro”.

Estes momentos de choque, destaca Clement Valle, expõem a forma como o Google Earth funciona, centrando a nossa atenção no software, e “revelam um novo modelo de representação, não através de fotografias indexadas, mas através da recolha automática de dados de uma miríade de fontes diferentes, constantemente actualizadas e infinitamente combinadas para criar uma ilusão perfeita”. O Google Earth é uma base de dados disfarçada de representação fotográfica, frisa o artista, e “estas imagens estranhas centram a nossa atenção no próprio processo e na rede de algoritmos, computadores, sistemas de armazenamento, câmaras automatizadas, mapas, pilotos, engenheiros, fotógrafos, topógrafos e cartógrafos que as geram”. Clement Valle estará no dia 14 de Outubro na galeria Lisboa para falar sobre o seu trabalho, com uma palestra sobre arte digital às 15h.

Outros trabalhos destacados pela MyLand Culture são “A.I. Toys (unboxing mania)”, de Ani Liu, em que vários módulos de IA conseguem criar nomes de brinquedos inéditos através de um programa de aprendizagem automática, recorrendo a dados reais de brinquedos comercializados como brinquedos para “rapazes” e “raparigas”, num questionamento sobre o condicionamento dos géneros, e a forma como a programação digital interfere no processo de criação e comercialização de brinquedos.

Leong Chi Mou, artista de Macau, vai apresentar na mostra duas obras, ambas de 2023: “NeOracle”, que funde os métodos tradicionais de adivinhação chineses com algoritmos para criar um novo oráculo, e a obra encomendada “Divine Drawing”, uma máquina com contornos humanos que produz arte 24 horas por dia, e que nos faz ponderar sobre a noção tradicional de criação artística, agora que se começou a atribuir significado à arte gerada por máquinas. Outra peça encomendada especialmente para a exposição, “Apocalypses”, da dupla Marta Stanisława Sala e Cheong Kin Man, mostra uma “heterotopia, entrelaçando narrativas auto-etnográficas e têxteis dentro de um clássico bíblico”, esclarece a organização, e as obras “Pataca” e “Twelve Records” de Fan In Kuan, “misturam recordações históricas com imaginação criativa, apresentando relíquias culturais feitas à mão que resistem à replicação digital”. Fan In Kuan vai orientar um workshop para famílias dedicado ao “Ink Rubbing” no dia 28 de Outubro, das 10 às 11h30.

Na exposição também se questiona a forma como a tecnologia condiciona o amor e o desejo. “It Takes Hundreds of Years to Sleep on the Same Pillow”, de Lu Zhang, reinterpreta uma cena nostálgica de “O Romance dos Heróis Condor”, uma série televisiva clássica de artes marciais de Hong Kong. Esta obra pretende reflectir sobre a natureza simplificada e baseada em dados das relações românticas que se formam a partir de plataformas de encontros virtuais, e outras ferramentas que se usam nos tempos correntes. A obra de Leong Chon “Diego Velázquez Retrato de Inocencio X”, e a peça encomendada “The Statistics of Fortune Art Macao: The Best Painting of Macao International Art Biennale 2023” replicam intencionalmente imagens digitais através de técnicas de desenho à mão, recriando meticulosamente cada pixel individual, ao mesmo tempo que invocam a rica história da pintura ao longo de milénios, explicou ainda a organização.

No dia da abertura de “Revelation to_”, às 18h do dia 6 de Outubro, vai haver uma actuação de música experimental de “thetiredandar”, e haverá também visitas guiadas gratuitas todos os domingos às 15h.

A exposição, organizada pela Myland Culture e pelo Instituto Cultural de Macau, estará até dia 30 de Novembro na galeria da Doca dos Pescadores. Rita Gonçalves – Macau in “Jornal Tribuna de Macau”


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