Pela
primeira vez, uma equipa de investigadores da Faculdade de Ciências e
Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) desenvolveu floculantes naturais
a partir de resíduos da madeira de eucalipto para tratamento de águas
residuais.
A
floculação é uma etapa essencial no tratamento tradicional de efluentes, muito
utilizada nas estações de tratamento de águas residuais municipais ou
industriais (ETAR), e consiste na agregação de pequenas partículas, formando
flocos (aglomerados de partículas) que permitem depois a remoção de
contaminantes. No entanto, atualmente, os materiais utilizados para promover a
floculação, os designados floculantes, são de origem fóssil (petrolífera), os
mais comuns à base de poliacrilamidas.
Além
de não serem biodegradáveis, os floculantes tradicionais apresentam várias
desvantagens, tornando premente a procura de abordagens ecológicas para o
desenvolvimento de novos floculantes existentes na natureza, sobretudo com base
em subprodutos naturais.
Considerando
a quantidade de resíduos de eucalipto que é produzida anualmente, em resultado
da atividade da indústria da pasta do papel no nosso país, a equipa liderada
por Graça Rasteiro, do Departamento de Engenharia Química da FCTUC, decidiu
apostar neste subproduto.
A
investigação foi realizada no âmbito do projeto europeu ECOFLOC, na tipologia
de doutoramento em ambiente empresarial europeu (Marie Curie - People), e
envolveu também a Universidade de Leeds (Reino Unido) e uma empresa suíça
especializada em reciclagem e tratamento de águas residuais.
A
partir da transformação de materiais extraídos dos resíduos de eucalipto, os
investigadores desenvolveram um conjunto de “eco-floculantes” de base
celulósica com diferentes características que se ajustassem a diferentes aplicações.
«A
nossa abordagem ecofriendly consistiu em purificar e modificar estes
resíduos lenhocelulósicos para produzir polieletrólitos (polímeros com carga)
de base natural que promovessem a floculação. Foi um processo complexo, desde
logo porque a celulose não é solúvel, o que é um grande obstáculo, porque os
polieletrólitos têm de ser solúveis para atuarem como floculantes. Portanto,
tivemos de efetuar extrações da matéria-prima inicial que otimizámos para serem
o mais brandas possível e várias modificações para que o produto final fosse
solúvel», explica Graça Rasteiro.
Superado
este primeiro desafio, a equipa, que teve também como investigador José
Gamelas, do Centro de Investigação em Engenharia dos Processos Químicos e dos
Produtos da Floresta (CIEPQPF), desenvolveu uma gama alargada de floculantes
naturais, biodegradáveis, apropriados para diferentes aplicações para além do
tratamento de efluentes (o foco deste projeto), como, por exemplo, na indústria
de cosmética ou alimentar. Os produtos obtidos foram extensivamente
caracterizados quanto à sua composição química, estrutura e morfologia.
De
seguida, os “eco-floculantes” foram testados com sucesso, primeiro em efluentes
modelo e posteriormente em efluentes reais fornecidos por uma indústria têxtil (Rosários
4) de Mira de Aire. «Tal como pretendido, permitiram aumentar a remoção de cor
e da turbidez. Comparando com o uso de poliacrilamidas comerciais, os
desempenhos obtidos usando os floculantes de base natural foram tão bons ou
melhores que os tradicionais. Além disso, conseguimos diminuir até 80% a
carência química de oxigénio dos efluentes. Este resultado representa um grande
avanço em relação aos floculantes tradicionais (de origem fóssil). Realizámos
também testes em efluentes oleosos, provenientes de lagares de azeite, e os
primeiros resultados são promissores. De salientar que ambos os efluentes
(corantes e oleosos) são muito difíceis de tratar», descreve a coordenadora do
projecto.
A
carência química de oxigénio é um parâmetro que permite avaliar se o efluente
tratado reúne as condições necessárias para ser reutilizado ou escoado para
meios aquáticos.
Perante
os bons resultados obtidos com os resíduos da madeira do eucalipto, os
investigadores decidiram estender a investigação a madeira de espécies
invasoras, designadamente a madeira de acácia-mimosa, no âmbito de um outro
projeto, intitulado MATIS. Os floculantes desenvolvidos estão no momento a ser
testados.
Apesar
de ainda não ter realizado um estudo económico, a docente e investigadora da
FCTUC acredita que os resultados deste projeto «podem ter impactos muito
positivos, já que é uma abordagem ecológica não só para tratamento de
efluentes, como também para aplicação em diferentes setores de atividade. Estes
floculantes baseados em celulose mostraram ser alternativas muito promissoras
aos tradicionais agentes de base petrolífera». Se a indústria assim o desejar,
os “eco-floculantes” poderão entrar no mercado num período relativamente curto
depois de passarem por testes à escala piloto. Universidade de Coimbra “Faculdade
de Ciências e Tecnologia” - Portugal
Sem comentários:
Enviar um comentário