Cada vez mais portugueses regressam ao seu país,
principalmente na idade da aposentação
Ana
e Rui Faria decidiram deixar a Suíça e regressar para Portugal, o seu país de
origem. O casal, de trinta e poucos anos, passou menos de sete anos na região
de Marly, no cantão de Friburgo. Como eles, muitos portugueses dão esse passo a
cada ano e voltam para casa.
De
acordo com dados do Departamento Federal de Estatística da Suíça, cerca de 11
mil portugueses deixaram a Suíça em 2018, contra cerca de 7600 dois anos antes
e 6700 em 2015. A tendência continua no cantão de Friburgo. No final de 2019,
havia pouco mais de 25 280 portugueses no cantão, 100 a menos do que no mesmo
período em 2018, segundo a Secretaria de Estado das Migrações (SEM).
"Eu
estava farta", diz Ana, que, depois de se juntar aos pais que moram em
Friburgo há vários anos, passou dois anos desempregada. "Em Portugal, eu
era professora de educação física. Vim para a Suíça para encontrar um
emprego", diz a mãe de dois filhos.
“Tapa-buracos”
Enquanto
o seu marido, Rui, pôde encontrar facilmente trabalho na construção civil, Ana
acaba ficando à toa. "Eu comecei nalgumas formações. Também trabalhei num
centro de fitness, mas servia mais como tapa-buracos". Ana acaba de
conseguir dar algumas horas por semana de aulas de educação física num centro
de formação. "Três quartos do meu salário eram gastos para guardar os
nossos dois filhos", lamenta ela.
Diante
desta constatação, o casal está a considerar um retorno a Portugal. "Era
importante para nós poder sair antes de ficarmos endividados. Além disso, a
economia está a melhorar em Portugal. Eu também estou feliz por ter novamente
uma vida social, estava com saudade!"
A
situação económica em Portugal, que tem mais de 10 milhões de habitantes e uma
das taxas de crescimento mais fortes da Europa nos últimos cinco anos, melhorou
consideravelmente. Após passar por anos de grande emigração, desde os anos 60 e
entre 2010 e 2015, o governo português criou programas para incentivar o
regresso dos seus cidadãos.
O Programa Regressar, que entrou em
vigor no verão passado, pretende reduzir para metade o imposto de rendimento
(IRS) durante cinco anos para quem tenha passado pelo menos três anos no
estrangeiro e opte por regressar entre 2019 e 2020.
Uma
medida que não seria a principal explicação para os numerosos retornos, segundo
António da Cunha, presidente da Federação das Associações Portuguesas na Suíça.
"Durante os anos de austeridade imposta, dezenas de milhares de jovens licenciados
saíram para procurar o seu primeiro emprego noutro lugar", explica o
português que também é professor honorário da Faculdade de Geociências e Meio
Ambiente da Universidade de Lausanne. Depois de deixarem o país, os emigrantes regressam
principalmente quando chega a hora de se aposentarem. A taxa de envelhecimento
da população é, portanto, significativa.
Mas
essa ânsia de voltar à pátria também seria financeira. No sentido de melhorar a
transparência, um acordo entre a Suíça e Portugal obriga os cidadãos portugueses
a declarar os seus bens. Pois o mito da casa em Portugal não está tão distante
da realidade. "Uma grande parte dos meus compatriotas possui bens
imobiliários no país que não declararam por diversas razões", acrescenta
António da Cunha.
Reintegração
E
os montantes exigidos pela Suíça podem ser substanciais. Em todo o caso, o
suficiente para precipitar as partidas. "Em 2019, elas aceleraram. Em La
Chaux-de-Fonds, por exemplo, 400 portugueses saíram num ano", diz da Cunha,
que vive na Suíça há 40 anos e não tem planos de deixar o seu país anfitrião
por enquanto.
Abílio
Rodrigues encontrou uma solução. Após 44 anos na Suíça, o presidente do Centro
Português de Gruyère passa metade do ano no seu país natal e a outra metade no
cantão de Friburgo. "É difícil viver na Suíça com 1400 ou 1600 francos por
mês. Muitos não têm escolha, eles têm que sair", explica.
É
o caso de Cecília e Messias Sabino. Com 64 e 68 anos, eles voltaram há cinco
anos, depois de passar mais de 30 anos no cantão de Friburgo. Foi uma decisão
difícil, já que a filha, família e amigos ficaram na Suíça, mas que teve de ser
tomada por razões financeiras. "Fomos felizes na Suíça porque fomos bem
acolhidos e integrados", diz Cecília, que agora está feliz e integrada
novamente, mas desta vez no seu país de origem.
Insegurança financeira
Liliana
Azevedo está dedicando o seu doutoramento em sociologia à imigração dos
portugueses para a Suíça e a transição para a aposentação.
Uma
tese que a pesquisadora portuguesa está a preparar actualmente entre o ISCTE
(Instituto Universitário de Lisboa) e Neuchâtel. Ela espelha a história pessoal
desta mulher de quarenta anos que vive agora em Portugal, cujos pais eram
imigrantes e que cresceu em Lausanne.
"Ainda
há poucos estudos dedicados aos portugueses na Suíça", observa, lembrando
que se trata de uma imigração recente, já que que data principalmente do início
dos anos 80. "Antes disso, os portugueses escolhiam a França e a Alemanha
como os seus destinos.”
Enquanto
a emigração para a Suíça diminuiu no final dos anos 90, ela foi retomada assim
que o Acordo sobre a Livre Circulação de Pessoas entrou em vigor em 2002, com
um pico em 2013, e desde 2014 vem declinando. "A Suíça era então o segundo
destino mais popular, depois do Reino Unido. No entanto, desde 2017, o saldo da
migração de cidadãos portugueses para a Suíça tem sido negativo. Agora há mais
saindo do que chegando", observa a pesquisadora. “O regresso sempre fez
parte do projecto migratório desta geração". Estes portugueses prepararam-se
para a volta, comprando, construindo ou renovando uma propriedade que herdaram
no seu país de origem.
Outra
razão para as muitas partidas da Suíça é a insegurança financeira associada à
aposentação. A maioria dos imigrantes de primeira geração são trabalhadores
pouco qualificados cujos rendimentos estavam abaixo da média suíça quando
trabalhavam. Como resultado, as pensões que eles recebem são baixas. "Uma
vez aposentados, eles fazem os seus cálculos e escolhem voltar porque ficar é o
mesmo que apertar o cinto para pagar as contas. Não devemos esquecer que se
trata de pessoas que nasceram nos anos 50 e que viveram uma ditadura e, para
muitos, situações de pobreza".
Os
imigrantes com mais de 60 anos estão em grande número entre os que voltam para
casa, mas a faixa etária de 30-40 anos também é afectada. "Ou seja,
aqueles que passaram menos de dez anos na Suíça e, portanto, têm menos laços
com o país. Mas se eles não tiverem nenhuma perspectiva de encontrar um emprego
estável, não vão voltar", conclui Liliana Azevedo. Stéphanie Schroeter –
Suíça in “La Liberté” com “Swissinfo”
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