I
Distinguir História da
Literatura de História Literária é tarefa das mais difíceis porque, muitas
vezes, ambos os termos podem parecer sinônimos, mas esse é um ledo engano em que
muitos historiadores costumam escorregar. Assim, História da Literatura seria a
sequência de narrativas, autores, estilos literários e teorizadores de poéticas
literárias, enquanto História Literária constituiria a disciplina que estuda a
Literatura de um ponto de vista histórico. Ou ainda a compreensão da Literatura
através dos seus contextos (políticos, econômicos, culturais).
Feitas estas distinções,
Maria Luísa Malato, professora de Metodologia dos Estudos Literários e de
Retórica Geral da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, mestre e
doutora em
Literatura Comparada , partiu para compor História da Literatura Europeia: uma introdução aos Estudos Literários
(Lisboa, Quid Júris, 2008), que desde o seu lançamento há sete anos tem
constituído livro de referência na área e presença obrigatória na bibliografia
dos cursos de Metodologia dos Estudos Literários e de Retórica nas
universidades portuguesas.
Aliás, alguma editora
brasileira deveria celeremente também publicar esta obra para que cumpra o
mesmo caminho nas faculdades de Letras das universidades brasileiras,
especialmente na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da
Universidade de São Paulo (USP), pois seria um complemento imprescindível ao
que se lê em Literatura Comparada
(São Paulo, Edusp/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2000), da professora
Sandra Nitrini.
Até porque os países de
língua espanhola e portuguesa tomaram como modelo outras literaturas europeias,
sobretudo a francesa, ainda que, a partir de certo momento no século XX, a
literatura norte-americana tenha se tornado para os literatos desta parte do
globo um novo polo de atração. Seja como for, é impossível estudar as
literaturas do Brasil e dos países da América hispânica sem levar em conta as
suas ligações com as diversas literaturas do continente europeu.
II
Por que História da Literatura
Europeia? A própria autora se encarrega de explicar, lembrando, porém, que
saber o que é Literatura Europeia, quando nem sequer é clara a fronteira
política ou econômica da Europa, é missão por demais complexa. Mesmo porque a
Europa, “entremeada de sonhos imperiais (os de Roma, de Alexandre, de Carlos Magno,
de Bizâncio, dos Francos ou dos Godos, da Liga dos Estados de Napoleão ou das
anexações de Hitler), tem feito a sua história à custa da fragmentação de
nações e estados”.
Ainda assim, Maria Luísa
Malato prevê que, a partir de algumas mudanças que devem se acentuar na atual
segunda década deste século XXI, o fortalecimento da União Europeia terá de ser
feito através do reforço da ideia cultural de Europa. E que, a partir disso, o
próprio poder político incentivará o que antes parecia menosprezar, ou seja, a ideia
segundo a qual existe uma Literatura Europeia, pois esta, quando
contextualizada pela Literatura Comparada, torna-se uma forma mais complexa e
rica de abordagens das próprias literaturas nacionais. Até porque a Literatura
Comparada incluiu-se na história literária, não sendo, portanto, uma disciplina
acadêmica específica ou autônoma, mas uma forma de atuar no campo da pesquisa.
Nesse sentido, diz a autora,
não só o curso de Letras mas também os cursos de Ciências da Informação,
Ciências Documentais e de Jornalismo só terão a ganhar com uma disciplina que
faça seus alunos lerem “diacrônica e sincronicamente não só as obras literárias
que marcaram a cultura ocidental, mas os textos que os impregnam de uma visão
mais alargada da cultura em que se moverão no futuro”.
III
Para escrever este livro,
Maria Luísa Malato tomou como modelo Jorge Luís Borges (1899-1986) e seu Curso de Literatura Inglesa, as “Notes
de Cours” (notas de curso), de Roland Barthes (1915-1980), no Collège de
France, entre 1977 e 1980, e Porquê ler
os clássicos? (Lisboa, Teorema, 1994), de Ítalo Calvino (1923-1985), obra
que oferece uma breve história da literatura em 35 ensaios sobre 35 autores
europeus, de Homero (séculos VIII e IX a.C.) a Cesare Pavese (1908-1950),
classificados pelo autor como “clássicos”. Os apontamentos (notas de curso) de
Barthes podem ser encontrados em Como
viver junto (2003), O Neutro (2003)
e A preparação do romance (2005),
todos publicados pela Editora Martins Fontes, de São Paulo, em tradução de
Leyla Perrone-Moisés.
Como diz Maria Luísa Malato,
se neste livro não se encontram os cem escritores “que você precisa ler” nem
são enumeradas as “mil obras que (você) deve ler antes de morrer”, o leitor vai
descobrir um roteiro seguro dos autores que deve ler para ter uma ideia do que
é a Literatura Europeia, uma história , aliás, sempre inacabada porque em
construção.
IV
Maria Luísa Malato é
professora desde 1988 na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, com área
de investigação em
Literatura Comparada , nomeadamente nos séculos XVIII e XIX
(teatro, narrativas utópicas), Retórica Literária, Retórica da Sensibilidade e
Crítica Textual.
Além de artigos dispersos em
obras coletivas, é autora também dos seguintes livros: Le XVIIIe Siècle, une Epoque d’Ombres et Lumières (Mons/Bélgica,
2009); Manual Anti-Tiranos (Porto Alegre, 2009); “Por acazo hum viajante…”. A vida e obra de Catarina de Lencastre, 1.ª
Viscondessa de Balsemão (Lisboa, 2008);
José Daniel Rodrigues da Costa: O Balão aos Habitantes da Lua. Uma Utopia
Portuguesa (Porto, 2006); Manuel de
Figueiredo, uma perspectiva do neoclassicismo português (Lisboa, Imprensa
Nacional-Casada Moeda, 1996); e Camus
(Porto, Rés Editora, 1984).
É autora com Paulo Ferreira
da Cunha de Manual de Retórica &
Direito (Lisboa, Editora Quid Júris, 2007) e responsável pela introdução e
edição crítica das Obras Completas de
José Anastácio da Cunha (Lisboa, Campo das Letras, 2 vols., 2001-2006).
Colaborou na História e Antologia da
Literatura Portuguesa. Século XVIII, volume IV (Lisboa, Fundação Calouste
Gulbenkian, 2013); na Biblos:
Enciclopédia das Literaturas de Língua Portuguesa (Lisboa, Verbo,
1995-2005), na História da Literatura
Portuguesa (Lisboa, Publicações Alfa, 2002), e na História de la
Literatura Portuguesa (Madri, Cátedra, 2000).
Foi editora também de Leituras de Bocage (Porto, Núcleo de
Estudos Literários da Universidade do Porto, 2006), que reúne os textos
apresentados durante o Colóquio sobre os 200 anos da morte do poeta
(1805-2005). Figura no International
Directory of Eighteenth-Century Studies/Répertoire International des
dix-huitièmistes. Adelto Gonçalves -
Brasil
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História da Literatura
Europeia - uma introdução aos Estudos Literários, de Maria Luísa
Malato. Lisboa: Editora Quid Júris. Coleção Erasmus –
Manuais Universitários, 318 págs., 2008, 21,20 euros. E-mail:
geral@quidjuris.pt. Site: www.quidjuris.pt
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Adelto Gonçalves é doutor
em Literatura
Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de Os vira-latas da madrugada (Rio de
Janeiro, José Olympio Editora, 1981), Gonzaga,
um poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona brasileira (Lisboa, Nova
Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002), Bocage – o perfil perdido (Lisboa, Caminho, 2003) e Tomás Antônio Gonzaga (Academia Brasileira
de Letras/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2012), entre outros. E-mail:
marilizadelto@uol.com.br
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