O
arquitecto João Palla está há dois anos a fotografar os rostos
luso-descendentes herdados pela Ásia ao longo dos séculos e vai, no próximo
mês, mostrar as caras dos macaenses na Universidade de Aveiro. A exposição
“Retratos de Luso-Asiáticos de Macau” acontece a propósito de um congresso
sobre as relações entre Portugal e a China. Para João Palla, os rostos dos
macaenses mostram bem “a mistura entre a cultura chinesa e a cultura
portuguesa”
Serão 19 os rostos dos
macaenses a ser expostos na Universidade de Aveiro entre os dias 13 e 15 de
Março. Além desses, haverá ainda lugar para outras 80 fotografias, em formato
reduzido. Esta exposição dos rostos macaenses é uma parte do trabalho
desenvolvido por João Palla ao longo de dois anos, em que vem fotografando as
feições deixadas pelos portugueses em toda a Ásia. “O que me interessou foi
constatar que embora passados 300, 400 ou 500 anos, os rostos nestas
comunidades luso-descendentes são ainda diferenciados, o que dá como resultado
rostos muito interessantes e muito bonitos”, explica o arquitecto ao Ponto
Final.
Esta é uma “mini-exposição”,
como descreve João Palla, que surge no contexto do 2.º Congresso Internacional
da Universidade de Aveiro e que tem por tema “Diálogos Interculturais
Portugal-China”. Para ilustrar as relações entre Portugal e a China, nada
melhor do que apresentar os rostos dos luso-descendentes de Macau: “Fazia
sentido mostrar os luso-asiáticos especificamente de Macau, é a mistura entre a
cultura chinesa e a cultura portuguesa”. Em Aveiro serão apresentadas 19
fotografias em formato grande e outras 80 em formato mais reduzido. “Os rostos
têm uma sequência, tenho pessoas da mesma família, tenho pais, filhos e netos.
Achei interessante colocar diferentes gerações na exposição. Por outro lado,
tenho pessoas mais idosas, a crianças, jovens e adultos, mulher e homens. Tenho
um bocadinho de tudo. Apesar de serem somente 19 fotografias, tentei que
tivessem o maior espectro possível”, explica o arquitecto, que desde 1982 tem
vivido entre Macau e Portugal.
As fotografias dos traços
macaenses inserem-se num projecto mais alargado de João Palla, que anda há dois
anos a fotografar as faces dos luso-descendentes na Ásia, desde o Myanmar à
Indonésia, passando pela Tailândia. No total, serão mais de 500 os retratos
feitos pelo arquitecto inseridos neste projecto. “Esta exposição centra-se só
nos luso-descendentes de Macau, apesar de já ter registos de outros sítios,
como o Myanmar, como Goa, na Tailândia também há comunidades de
luso-descendentes que são diferentes, Indonésia, Malaca”, exemplifica,
salvaguardando que “este projecto ainda não acabou”. “Ainda há sítios que eu
quero visitar, falta-me ir a Timor-Leste e falta-me ir às Flores”, ilha
indonésia a Leste de Java, onde os portugueses se estabeleceram no início do
séc. XVI.
João Palla explica que foi no
Myanmar que o projecto nasceu. “Este projecto começou no Myanmar, numa viagem
que fiz a umas aldeias que existem no Norte do Myanmar de luso-descendentes.
Nem levava em ideia fazer este projecto”, conta, lembrando: “Estive dois ou
três dias nessa aldeia e fotografei umas dezenas de pessoas quase
involuntariamente. É interessante ver a fisionomia do rosto das pessoas, essas
pessoas são identificadas não propriamente como birmaneses, eles já vêm com
estas misturas desde há muitos séculos e ainda se notam hoje em dia. Foi isso
que me interessou, essa diferença na fisionomia”.
“O que me inspira é a beleza
humana, é a constatação de que, independentemente das guerras e das
vicissitudes da história, passados 500 anos, estas comunidades mantêm uma coesão
e os seus traços identitários, neste caso, fisionómicos. Foi só mesmo isso que
me interessou captar”, conta o arquitecto, sublinhando: “O que me interessou
foi constatar que, embora passados 300, 400 ou 500 anos, os rostos nestas
comunidades luso-descendentes são ainda diferenciados, o que dá como resultado
rostos muito interessantes e muito bonitos. Fiquei apaixonado pela beleza
humana desta história”.
Apesar do projecto, João Palla
não se considera fotógrafo: “Não me considero fotógrafo e normalmente uso a fotografia
para apoio do meu trabalho enquanto arquitecto. Fotografar rostos é uma coisa
complicada, isto foi uma aventura no campo dessa especificidade na fotografia,
eu nunca o tinha feito”. “Vejo isto como uma experiência e como uma recolha,
não vejo como um trabalho artístico fotográfico, nesse sentido mais intelectual
da coisa”, acrescenta.
João Palla é neto de Victor
Palla, fotógrafo reconhecido internacionalmente pelo livro de fotografia
“Lisboa, Cidade Triste e Alegre”, em co-autoria com Costa Martins. Questionado
sobre se o interesse pela fotografia vem do avô, João Palla respondeu que
“talvez um bocadinho, sim”. “Mas não penso muito nisso, ele é uma referência
para mim, mas isso não impede de eu seguir o caminho que acho que tenho de
fazer, independentemente daquilo que ele fez”, diz, recordando que também
Victor Palla fez retrato: “Ele também fez retratos, tem piada, sobretudo de
pessoas do círculo de amigos dele, que nunca mostrou, nunca publicou. Eram
retratos mais intimistas, de amigos e família”. Questionado sobre se teve em
conta esses retratos neste seu projecto, João Palla diz que “não, são premissas
completamente diferentes”. André Vinagre
– Macau in “Ponto Final”
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