Álvaro
Roura: "Queremos criar polvo de aquicultura imitando a sua vida em
liberdade"
Menos de dois meses depois de
se conhecer o IEO e Pescanova terem conseguido completar o ciclo do polvo comum
(Octopus vulgaris) em cativeiro, uma nova linha de investigação une-se à
corrida do que seria um marco histórico na aquicultura na Galiza. O Instituto de
Pesquisas Marítimas de Vigo e a Armadora Pereira anunciaram na passada
segunda-feira que têm resultados "muito esperançosos" neste sentido.
A tese de doutoramento de Álvaro Roura, dirigida por Ángel Guerra, Ángel
González e Gabriel Rosón, serviu de estímulo a uma nova abordagem para acertar
com a dieta da paralarva, um muro quase intransponível até agora para os
cientistas. O artigo publicado no “Progress
in Oceanography” junta-se, desta
maneira, à corrida comercial para produzir o polvo da piscicultura e levá-lo ao
mercado. Álvaro Roura responde a várias questões sobre esta investigação.
Como
foi a pergunta que deu início a tudo isto?
Gosto muito de ecologia e
respondo a perguntas básicas da vida destes animais. E pensar também como
podemos abrir os nossos olhos para futuras aplicações. O da alimentação era uma
das fases do conhecimento da vida do polvo em cativeiro que nos faltava
aprofundar. Sabíamos como e quando os jovens iam para os estuários, mas não como
viviam e comiam. E foi isso que estudámos e continuamos estudando.
O
que foi feito na investigação?
Completei o meu período de
pós-doutoramento na Austrália, e estudei as larvas do polvo e outros
cefalópodes que se movem pelo oceano, como eles podem ir de um lugar para outro
e o que comem. Fizemos uma série de campanhas oceanográficas e, pela primeira
vez, capturámos larvas fora da plataforma continental. Isto nunca se conseguira
até aquele momento. É um processo muito lento e muito difícil. Perto da costa
há uma larva entre cada 200.000 animais, mas se sais para o oceano, há uma para
cada quatro milhões de animais. Há que ver e procurar muitos animais para
encontrar um. E foi um enorme esforço.
Com essas larvas, pudemos
estudar a sua dieta. Realizámos técnicas de sequenciamento em massa com as
quais obtivemos muitas informações sobre essa alimentação, identificando mais
de 90 presas diferentes.
E com essa informação, ao
terminar a estadia na Austrália, começámos a elaborar projectos para aplicar
esse conhecimento à aquicultura, para ver se poderíamos resolver este grande
problema. Tivemos a sorte de que a Armadora Pereira estivesse interessada no
projecto e confiasse em mim. Fizemos um acordo de colaboração e fomos capazes
de desenvolver esta hipótese, para ver se poderíamos usar a ecologia para criar
polvos em cativeiro.
Conseguiu
então superar o problema?
Passámos 18 meses com o projecto,
desde abril do ano passado, e temos resultados muito promissores. Conseguimos
reduzir a mortalidade, com sobrevivências, aos 60 dias, entre 20 e 30%. Isto é
apenas o começo, porque não tínhamos experiência anterior em cultivo. Venho de
investigar as larvas no oceano, não na aquicultura.
Como
foi com a comida?
Já sabíamos que eles comem
muitos crustáceos: caranguejos, camarões, gastrópodes, quetognatas, etc. Há uma
parte que não podemos contar porque faz parte do acordo com a armadora. Mas podemos
dizer que é feito de artemia, um alimento que é usado na aquicultura, com
produtos como o sargo ou o robalo.
Aqui, a artemia é o veículo
que pode ser enriquecido com muitas coisas, embora em si tenha pouco valor
nutricional. Se fizermos isso rapidamente, antes que a digestão seja feita e expulse
esses nutrientes, podemos ter a chave para alimentar as larvas de polvo.
Os
resultados do IEO e Pescanova foram conhecidos recentemente. Tem este projecto
algo em comum?
Colaboramos com o IEO, e temos
artigos em comum, mas não tem nada a ver com isto. Mas esta linha de pesquisa concentra-se
na vida das larvas em liberdade. Até agora, a aquicultura do polvo fez-se um
pouco às cegas, mas a linha que desenvolvemos no Ecobiomar leva mais em conta a
perspectiva ecológica. Queremos criar polvo de aquacultura, mas imitando e
recriando a sua vida em liberdade.
O
que falta agora?
Muito, porque o projecto apenas
agora começou. As larvas são animais muito inteligentes, mas muito delicados. E
em cada cultura aprendemos algo mais. O que falta é continuar melhorando e
pensando em novas hipóteses baseadas na sua ecologia, e melhorando outros
aspectos da sua ecologia. Falta bastante para ter dados suficientes para ver se
é viável ou não começar a produzir, que é o objectivo final da armadora, porque
vêem que isso pode levar à produção. Não precisa ser uma única chave. Podem ser
muitas ao mesmo tempo, com afinações muito subtis, e em cada cultura estamos afinando
e conhecendo mais pormenores. Manuel Rey
– Galiza in “GCiencia”
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