Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Timor-Leste – Familiares das vítimas da 2ª Guerra Mundial recordam o dia 01 de Outubro de 1942

Joel, 9 anos, tem na ‘t-shirt’ a mesma foto do bisavô, Evaristo Madeira, que está colocada numa das campas onde jazem, em Aileu, 12 portugueses e timorenses mortos na 2ª Guerra Mundial



De cabelo comprido ligeiramente encaracolado, mochila pelas costas, mostra o mesmo olhar intenso de Evaristo José Madeira, o bisavô que morreu aos 32 anos, às mãos das colunas negras das forças japonesas.

Evaristo Madeira, nasceu a 14 de agosto de 1910 e morreu a 01 de outubro de 1942, lê-se na placa simples, preta e cinzenta, a mesma cor da foto onde o primeiro cabo aparece de boné militar, com um bigode preto e fino a decorar-lhe o rosto sério.

As campas – são 10, mas têm 12 corpos, entre eles três timorenses não identificados – são o coração do monumento “Aos Massacrados de Aileu – 1942”, cuja obra de recuperação, trabalho de militares timorenses e portugueses, foi ontem apresentada.

Depois da parte oficiosa, a entrada no perímetro do monumento das famílias dos homens e mulheres ali enterrados, foi a mais solene.

Joel entrou no monumento em formato de tranqueira, de mãos dadas com a avó, Teresa Madeira, hoje com 84 anos, sogra do ex-primeiro-ministro timorense Rui Maria de Araújo.

“Estou muito agradecida por arranjarem tudo isto. Isto estava tudo muito sujo”, disse à Lusa.

Praticamente com a idade do neto, a 01 de outubro de 1942 testemunhou, sem compreender o massacre que aqui é ali recordado.

“Tinha seis ou sete anos. Era muito pequenina. Chamaram-nos para fora, numa dessas casas, que já nem sei bem onde é. Chamaram-nos todos fora, ficámos sentado num corredor e mataram o João Florindo e o Alves Meira à nossa frente”, recordou.

“Morreu muita gente. Aqui enterrado está o meu pai, Evaristo”, explicou.

Numa campa quase ao lado, cenas idênticas: Alice Florindo e o irmão mais velho, João Florindo, os dois octogenários evocaram a memória do pai junto ao seu túmulo.

Alice beijou a mão e levou o beijo na mão até à foto da campa. Depois ajudou a levar a mão do irmão, com dificuldades de visão, a cumprimentar do mesmo modo a memória do pai.

Com uma área total de quase 3000 metros quadrados, o monumento foi construído em 1947 aproveitando o amuralhado e pórtico da antiga tranqueira, residência do comandante.

Quem ali está enterrado morreu na madrugada de 01 de outubro de 1942 pelas Colunas Negras durante a invasão japonesa de Timor-Leste que ocorreu depois de soldados australianos e holandeses terem ocupado a ilha, violando a neutralidade de Timor-Leste.

Estão sepultados no local um capitão de infantaria, quatro cabos, três soldados timorenses e quatro civis.

Promotor da iniciativa de recuperação, a par do seu homólogo timorense, o chefe do Estado-maior General das Forças Armadas portuguesas, almirante António Silva Ribeiro disse que a obra representa “cumprir um dever fundamental (…) de honrar e respeitaram aqueles que fizeram o sacrifico supremo, dando a sua vida pelo ideal da liberdade do território onde viviam e da bandeira que juraram defender”.

Na cerimónia, recordou a “grande violência e o grande número de atacantes que não permitiram aos militares portugueses garantirem a defesa dos habitantes locais” e que apesar dos gestos heroicos não sobreviveram “aquela fatídica noite”.

Na sua primeira visita a Timor-Leste, Joaquim Chito Rodrigues, presidente da Liga dos Combatentes, recordou a ligação antiga a Timor-Leste, desde as menções ao Tata Mailau e ao Ramelau, nos seus livros da escola primária, à veneração à bandeira portuguesa, mensagens “recebidas e jamais esquecidas”.

“Vivi sempre os assuntos de Timor sem nunca cá ter estado”, disse, recordando o “sentimento nacional” dos portugueses, em apoio a Timor-Leste, durante a luta pela independência.

“Aqui se mistura o sangue português e o sangue timorense. Aqui homenageamos e aprofundamos a amizade entre dois povos”, afirmou, mostrando-se disponível para apoiar a recuperação de outros monumentos.

Um por um, leu o nome dos “massacrados de Aileu”, declarando a cada nome a palavra “presente”.

O comandante das Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL), Lera Anan Timur, aproveitou o momento para saudar “os laços de amizade e solidariedade construídos e consolidados em momentos difíceis da história recente de Timor” e que “vão para lá das simples relações institucionais”.

E depois deixou recados: há que recuperar os edifícios e locais históricos do país, homenageando o que representam, mas ao mesmo tempo ecoando como “memórias do passado”.

“Servem para mostra às gerações futuras o sacrifício de tantos que deram a sua própria vida na defesa da sua terra, da sua pátria, de valores que consideravam fundamentais”, disse. In “Sapo Timor-Leste” com “Lusa”

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