Em dezembro de 2017 a Universidade Sorbonne Nouvelle acolheu, na
sua sede de Paris, um grande congresso internacional sob o patrocínio da
Presidência da República Francesa, entre outras instâncias, subordinado ao
rótulo «Lusofonia e Francofonia: Duas potências mundiais». No encontro, com
presença de diversas personalidades académicas e políticas, anunciou-se a posta
e andamento do Instituto da Lusofonia, com sede na capital francesa. Alguns
galegos tivemos a oportunidade de participar como oradores: Elias Torres, Ramón
Villares e quem escreve. Tratanto-se de um evento sobre o português e o
francês, supõe-se que os três galegos presentes, incluíndo o ex-presidente do
Consello da Cultura Galega, apresentamos e explicamos nesse encontro o
galego como uma forma do português, e não como uma língua diferente. Caso
contrário seria difícil de entender e explicar.
O passado dia 6 de junho ficamos a saber, polo jornal lisboeta
Público, que a França é candidata a entrar como país observador na Comunidade
dos Países de Língua Portuguesa. A notícia incluiu também outros nomes:
Itália, Andorra, Luxemburgo, Sérvia e Argentina. Uns dias mais tarde o ministro
Boris Johson anunciava publicamente que a Grã-Bretanha tinha apresentado a
mesma solicitude, esforçando-se em valorizar positivamente a emigração
portuguesa no Reino Unido. Provavelmente serão admitidos na XII Conferência de
Chefes de Estado e de Governo, que terá lugar os dias 17 e 18 de julho na
cidade da Praia, Cabo Verde. Paris lidera a Francofonia, Londres a Commonwealth.
E solicitam a entrada nesse organismo internacional. O valor estratégico global
do português crescerá polo menos um grau com a entrada desses países. Tem isto
algo a ver com a Galiza? Alguém aqui se sente aludido?
Se olharmos para o nacionalismo galego, diverso, a que
se supõe interesse real nesse caminho de aproximação e integração no espaço
lusófono, na sequência do ideário do galeguismo do século XX, não parece ter
essa prioridade na sua agenda, salvo casos contados e meritórios. Os programas
de alguns partidos políticos incluem diversas fórmulas de reconhecimento da
unidade da língua de aquém e além Minho e detalham a obriga de fomentar o
relacionamento internacional com os países de língua portuguesa. Porém fica
quase tudo por fazer. Passam as oportunidades e sempre há outras
prioridades. A mais recente foi a ausência de representação da cidade de
Santiago de Compostela num importante encontro, que teve lugar em Cascais, ao
lado de Lisboa. Os parceiros eram as Câmaras Municiais de outras capitais de
países de língua portuguesa. Não há problema. O mundo sempre pode
aguardar.
Sejamos claros: em termos gerais o nacionalismo organizado
politicamente continua a dedicar muitos mais esforços ao relacionamento Galiza-Espanha,
do que a trabalhar por um relacionamento estável com países soberanos de língua
portuguesa que poderia ter como resultado, talvez, uma porta aberta a outros
espaços e solidariedades futuras. O apoio de um país influente, que possa
realmente ter um papel positivo, direto ou indireto em relação ao caso galego,
não é procurado a sério. Talvez nem tenha sido pensado.
Poderia dizer-se que continua a ser preferido uma espécie de terceiro-mundismo que,
diga-se honestamente, resultou ser escassa utilidade para a Galiza. Uma Galiza
que, mais do que estar em condições de apoiar outros, precisa de apoio externo.
Caracas ou Rabouni aparecem nas nas prioridades antes que Lisboa. Parece uma
extravagância pensar em tirar proveito político ou económico para a Galiza, ser
prático e buscar um lugar no concerto das nações, indo ao encontro da
normalidade, quando o prioritário é manter a pureza, a essência, a
autenticidade dos movimentos políticos. Reconheço que nesta posição há uma
vantagem discursiva implícita: se fracassarem, estarão livres do pecado das contradições.
Deixando a um lado as ironias, digamos que é preciso fazer algo
diferente, planificar para o longo prazo e criar estruturas de
relacionamento internacional estável em áreas de atuação específicas. Se todos
os partidos políticos parlamentares estão de acordo em avançar no mesmo
sentido, a pergunta a responder já não é por que, mas para que entrarmos
nesse espaço de relacionamento internacional que tem o português como língua
comum.
Quando se percebe a necessidade de uma posição galega
consensuada, reconhecível e identificável para o espaço lusófono, vem
à tona um problema interno do campo cultural galego que, por desídia ou falta
de coragem política, permanece sem resolver, polo menos, desde o Decreto
Filgueira de 1983, e que pode nesta altura tornar-se num fator
desestabilizador. É esse apartheid à galega que mantém no
ostracismo o Movimento Lusófono Galego, que merece uma solução à
altura da maturidade de uma sociedade democrática e plural, longe das
unanimidades anónimas e de um insustentável monopólio da verdade sobre a
língua. Ângelo Cristóvão – Galiza in “Portal Galego da Língua”
___________________________________
José
Ângelo Cristóvão Angueira (Santiago
de Compostela, 1965) - licenciado em Psicologia pela Universidade de Santiago,
especializou-se em Psicologia Social. Empresário. Vice-Presidente da Academia
Galega da Língua Portuguesa e membro da sua Comissão de Relações
Internacionais. Sócio Correspondente da Academia das Ciências de Lisboa; Sócio
da AGAL desde 1983 e Sócio fundador da Associação Internacional dos Colóquios
da Lusofonia.
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