Adelto Gonçalves |
O governo federal anunciou a
compra do navio Siroco, de fabricação francesa, a pretexto de recompor uma
lacuna na Marinha do Brasil. Embarcação usada, o Siroco, que deverá ser
rebatizado como NAM (Navio Anfíbio Multipropósito) Bahia, terá de passar por um
período de manutenção antes de entrar em serviço. Com grande capacidade anfíbia
e de transporte, o navio pode ser utilizado em situação de apoio à comunidade
nacional e internacional, em casos de ajuda humanitária, como o fez durante o
terremoto que devastou o Haiti em 2010.
Siroco |
Para garantir a compra do
navio, o Brasil participou de uma concorrência que contou com a presença de
Portugal, que desistiu de sua compra, provavelmente em razão dos altos valores
em jogo. Nada contra que a Marinha do Brasil aumente sua capacidade operacional
e anfíbia, mas é preciso ver que se trata de um navio usado, que foi
incorporado em 1998 pela Marinha francesa.
Diante disso, parece que está
mais do que na hora de Brasil, Portugal e seus parceiros na Comunidade de
Países de Língua Portuguesa (CPLP) – Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo
Verde, São Tomé e Príncipe, Guiné Equatorial e Timor Leste – começarem a pensar
na criação de uma indústria naval que os sirva, produzindo primeiro navios de
guerra e, depois, os de carga.
Provavelmente, os recursos que
o Brasil aplicou na compra do navio usado e os que Portugal pretendia investir
com o mesmo fim seriam suficientes para viabilizar o negócio ou estimular a
iniciativa privada das nove nações da CPLP a participar desse empreendimento,
com cada país-membro encarregando-se da produção de diversos componentes. Além
disso, como sétima maior economia do mundo, o Brasil já deveria ter deixado
para trás esse papel de receptáculo da sucata dos países do Primeiro Mundo.
É de se ressaltar também que a
defesa do Atlântico Sul é um problema que afeta todos os membros da CPLP.
Portanto, esses países, se tiverem uma indústria naval comum, em vez de
comprarem navios de guerra usados, poderão fabricá-los de acordo com suas
necessidades e com tecnologia mais moderna. É de se acrescentar ainda que
primeiro a Guiné Equatorial e, ultimamente, Angola vêm procurando preparar suas
marinhas para o combate à pirataria marítima na região do Golfo da Guiné.
Aliás, esta não é uma ideia
que tenha saído agora da disputa comercial entre Brasil e Portugal por um navio
usado, mas uma sugestão antiga do professor e ex-embaixador português Adriano
Moreira, que propôs não só a criação de um organismo de segurança da CPLP à
semelhança da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) para o combate à
pirataria e tráfico de drogas no Atlântico-Sul como uma frota comercial comum,
já que todos são países marítimos.
É verdade que, de antemão, há
dificuldades jurídicas, sem contar a instabilidade política que, de vez em quando,
afeta um dos países-membros da CPLP, como é o caso da Guiné-Bissau neste
momento. Mas parece claro que a criação de uma indústria naval e de uma frota
comercial no âmbito da CPLP só trará benefícios para os seus países-membros. Adelto Gonçalves – Brasil
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Adelto Gonçalves, jornalista
especializado em comércio exterior, é doutor em Letras pela Universidade de São
Paulo (USP) e autor de Direito e Justiça em Terras d´El-Rei na São Paulo
Colonial (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2015), entre outros. E-mail:
marilizadelto@uol.com.br
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