SÃO PAULO – Nascida para superar os
traumas de uma guerra colonial que durou de 1961 a 1974 e reaproximar os
povos irmanados pelo mesmo idioma, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
(CPLP), criada em 17 de julho de 1996, foi viabilizada mesmo por empenho do
governo brasileiro, especialmente pelo poder aglutinador do embaixador do
Brasil em Lisboa ao tempo do governo Itamar Franco, José Aparecido de Oliveira
(1929-2007), que fora ministro da Cultura do governo José Sarney.
Embora seja definida como instrumento
de defesa da língua portuguesa e “uma comunhão de afetos” pelo ex-embaixador
português Adriano Moreira, 91 anos, especialista em relações internacionais e
outro grande batalhador pela criação da entidade, a CPLP começou a se
transformar em bloco econômico – aliás, o único que partiu da identidade
linguística entre os seus aderentes –, trilhando um caminho natural no mundo de
hoje, ainda que tivesse de ferir alguns de seus princípios.
Foi o caso da inclusão da Guiné
Equatorial no bloco, formalizada em julho de 2014, depois de um processo de
amadurecimento que levou dez anos e culminou com a adoção do Português pela
nação africana como uma de suas línguas oficiais e a abolição da pena de morte
no país. É de se lembrar que a Guiné Equatorial foi colônia portuguesa entre os
séculos XV e XVIII, mas a presença hoje da língua portuguesa em seu território
é restrita. E que o seu atual presidente
está no poder desde 1979. Há, porém, um argumento “mais prático” que
justificaria essa inclusão: depois de Angola, Portugal e Moçambique, a Guiné
Equatorial, dentro da CPLP, é o quarto maior comprador de produtos brasileiros
(US$ 56 milhões em 2014, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento,
Indústria, Comércio Exterior – MDIC).
Apesar das queixas de puristas como o
professor Adriano Moreira, ao que parece, a CPLP hoje irá para onde o Brasil
for – afinal, se a comunidade reúne a
grosso modo 250 milhões de lusofalantes, 201 milhões estão em território
brasileiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Sem contar que o Brasil é o único país emergente da CPLP, condição que levou o
economista Jim O´Neill, do grupo Goldman Sachs, a incluí-lo ao lado de Rússia,
Índia e China para formar o acrônimo Bric, hoje conhecido como Brics, depois da
inclusão da África do Sul.
Não é de se admirar, portanto, que se
desenvolvam negociações para que Japão, Índia, a Região Administrativa Especial
de Macau (China) e mais alguns países africanos passem a integrar a CPLP, a
partir do pressuposto de que nessas nações existem comunidades de língua
portuguesa. Na União Indiana, por exemplo, estão Goa, Damão e Diu, antigas
possessões portuguesas anexadas à força em 1961, depois de mais de 450 anos de
domínio luso, assim como no Senegal, que já está na CPLP como observador
associado, fica a província da Casamansa, que luta há mais de 30 anos por sua
independência e adesão ao mundo lusófono.
Se haverá futuro para a união e
compatibilização de interesses e países tão díspares, é que não se sabe. Mas,
desde já, não se deve descartar duas ideias do professor Adriano Moreira: a da
criação de uma frota comercial pela iniciativa privada no âmbito da CPLP –
afinal, todos os seus membros são marítimos – para o incremento das relações
econômicas entre seus membros, além do estabelecimento de um pacto de defesa e
segurança no Atlântico Sul. São ideias que estão no recém-lançado livro Este é o Tempo (Lisboa, Clube do Autor,
2014), do jornalista Vitor Gonçalves, da Rádio e Televisão de Portugal (RTP),
que reúne conversas com o professor Adriano Moreira. Milton Lourenço - Brasil
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Milton Lourenço é presidente da Fiorde
Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos,
Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da
Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística
(ACTC). E-mail: fiorde@fiorde.com.br. Site: www.fiorde.com.br.
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