A
duplicação das transações comerciais entre a China e os Países de Língua
Portuguesa, ou a entrada de capitais chineses em Portugal, em especial nos
últimos anos, são dados concretos que provam o “desenvolvimento real” de uma
estratégia particularmente relevante para as oportunidades que se abrem a
Macau, defende o presidente do Banco Nacional Ultramarino. Pedro Cardoso aposta
ainda no papel ímpar que um dos bancos emissores no território, com larga
experiência nos países lusófonos, pode desempenhar no cumprimento dos objetivos
da diversificação económica, integração regional e ligação ao mundo lusófono.
Em entrevista respondida por escrito, Pedro Cardoso deixa ainda algumas
sugestões, entre “várias possíveis”, para que Macau reforce esse papel de
plataforma.
PLATAFORMA
MACAU – Quinze anos depois da transição de soberania, o conceito de Macau
enquanto plataforma de negócios e de serviços entre a China e os países de
língua portuguesa parece ganhar nova força e cada vez mais adeptos. Sente que
essa é uma oportunidade real para as empresas e as marcas portuguesas?
PEDRO CARDOSO – A República
Popular da China tem um enorme poder económico e isso é, obviamente, um fator
importante de atracção para a entrada de empresas e marcas portuguesas naquele
país.
Macau pode ser utilizado por
estas empresas como uma plataforma experimental, com o objetivo de preparação e
adaptação de produtos e serviços e formas de negociação ao enorme mercado
chinês, através de parcerias, alianças estratégicas e contactos privilegiados com
as empresas estabelecidas no Delta do Rio das Pérolas.
O acordo CEPA entre a
República Popular da China e a RAEM, a competitividade fiscal do território e o
facto de o português ser uma língua oficial no território são elementos
igualmente relevantes.
P.M.
– Na sua opinião, este novo impulso já se faz sentir no mundo dos negócios e
das finanças? Ou estaremos apenas ainda ao nível de um discurso político mais
afinado e consistente?
P.C. – Nos últimos cinco
anos o volume de transações comerciais entre a China e os Países de Língua
Oficial Portuguesa (CPLP) duplicou.
Nos últimos três anos, a
China foi responsável por 40% das fusões e aquisições em Portugal, com especial
relevância em setores como a energia, seguros e, mais recentemente, a saúde.
Mais do que simples discurso
político, temos assistido ao desenvolvimento real das relações comerciais entre
a China e os países da CPLP.
P.M.
– Qual é a importância que atribui aos três centros lusófonos (agroalimentar;
indústrias MICE; apoio a pequenas e médias empresas) anunciados para Macau?
P.C. – Desde há longo tempo
que os responsáveis da República Popular da China e do Governo de Macau vêm
insistindo na necessidade de diversificação da economia de Macau, como forma de
reduzir a sua dependência da indústria do jogo. Por outro lado, as condições
sócio-geográficas de Macau apontam para a terciarização da sua economia.
As PME’s, nomeadamente
relacionadas com o comércio e serviços assumem aí um papel de relevo na
diversificação da economia e na criação de emprego.
A MICE é um complemento
importante dos setores do turismo e jogo e tem crescido a um ritmo assinalável,
mas ainda está longe do seu potencial máximo.
P.M.
– Dada a experiência da banca enquanto intermediária de negócios e fornecedora
de serviços, haverá estudos de mercado ou outros indicadores que apontem outros
setores que possam mais depressa desenvolver-se também no âmbito das relações
sino-lusófonas?
P.C. - Os setores que
referiu parecem-me os mais relevantes, mas acredito que em outras áreas como,
por exemplo, a consultadoria, restauração e hotelaria, poderão vir a existir
desenvolvimentos interessantes no futuro.
P.M.
– Qual é o papel específico que a banca pode desempenhar no desenvolvimento
dessa plataforma?
P.C. - A banca tem um papel
crucial no apoio à implementação de empresas dos Países de Expressão Portuguesa
no território. O BNU tem um papel muito ativo, através de uma vasta rede de
contactos, locais, e oferece condições especiais de financiamento e de
prestação de outros serviços financeiros.
P.M.
– No caso do BNU, há planos concretos para se posicionar como um banco de
referência no contexto do projeto lusófono?
P.C. - Apoiamos a entrada de
empresas dos Países de Expressão Portuguesa neste mercado e, com o apoio do
Grupo CGD, somos particularmente ativos no negócio de sentido inverso; ou seja,
no suporte às empresas chinesas e macaenses que querem investir nos Países de
Expressão Portuguesa. Estamos ainda muito focalizados no fluxo de comércio
internacional entre aqueles países.
P.M.
– Tendo a história muito particular que tem nos países lusófonos, pensa que o
BNU poderá apresentar-se nos mercados internacionais com vantagens competitivas
na ligação entre a China e os Países de Língua Portuguesa.
P.C. - O BNU está
estabelecido em Macau há mais de um século, é um banco emissor e um dos
principais bancos comerciais da região, sendo parte integrante da sua vida
financeira. Faz parte do Grupo CGD, presente em 23 países e em todos os Países
de Língua Oficial Portuguesa, à excepção de um deles. Tem estado extremamente
ativo no apoio ao comércio entre a China e os Países de Expressão Portuguesa,
quer em termos de fluxos de comércio como de investimento.
O Grupo CGD, do qual o BNU é
parte integrante, está diretamente presente em seis países de expressão
portuguesa, tendo uma posição de liderança em cinco destes, está presente em
Macau, Zhuhai e Xangai, constituindo assim uma plataforma muito forte na
ligação dos Países Lusófonos à China e a Macau.
P.M.
- Como descreveria esse posicionamento?
P.C. – O BNU posiciona-se
como uma instituição de referência a nível local, totalmente empenhado em
apoiar o futuro desenvolvimento de Macau e igualmente apostado no mundo
lusófono.
Está particularmente bem
capitalizado, com um rácio de solvabilidade de mais de 24%, é um banco
extremamente líquido, uma vez que tem um rácio de transformação de apenas cerca
de 50%, enquanto a média do mercado de Macau é superior a 80%.
Destaco ainda vantagens
competitivas como a presença secular, o seu estatuto de banco emissor; a sua
liderança no mercado; a ampla presença do Grupo CGD nos grupos de Língua
Oficial Portuguesa. O BNU afirma-se ainda pela qualidade de serviço e inovação.
P.M.
– O facto de ser banco emissor em Macau representa alguma vantagem – ou
responsabilidade – acrescida nessa área?
P.C. - Para o BNU é uma
grande honra e responsabilidade continuar a ser mandatado pelas autoridades da
Região Administrativa Especial de Macau como banco emissor da Pataca. A
confiança depositada pelo Governo traduz-se por si só numa vantagem,
transmitindo a solidez financeira e reforçando a posição de banco de referência
para os seus clientes.
Para além de banco emissor e
de Caixa do Tesouro do Território, é um dos principais bancos comerciais de
Macau. Tem presentemente mais de 200.000 clientes, aproximadamente um terço da
população de Macau.
P.M.
- Será que o projeto lusófono, da forma como a China o concebe, permitirá ao BNU
criar novas centralidades no contexto do Grupo Caixa?
P.C. – Tem sido reafirmado
pelas autoridades quer da China, quer de Portugal, a importância de Macau como
plataforma para o comércio entre a China e os Países de Língua Oficial
Portuguesa.
Neste contexto, o BNU
encontra-se especialmente bem posicionado, quer pela sua presença secular em
Macau, quer pela ligação ao Grupo CGD, do qual faz parte, e que tem uma
presença efetiva e extensa nos mercados lusófonos.
P.M.
- Prevê que o projeto lusófono possa seduzir outros bancos chineses e lusófonos
para apostarem no mercado de Macau? Ou seja, o BNU prevê que possa aumentar a
sua concorrência?
P.C. - Nos últimos anos o
volume de negócio do mercado bancário de Macau tem vindo a crescer a um ritmo
muito rápido. No entanto, é um mercado muito competitivo. A Região
Administrativa Especial de Macau conta com apenas 600.000 habitantes e existem
já 29 bancos a operar no território.
A média da margem financeira
líquida anda à volta de um ponto percentual. Ou seja, a diferença entre o que
os bancos recebem de juros dos empréstimos e o que pagam nos depósitos, é das
mais baixas do mundo.
Acredito que a concorrência
é positiva para a sociedade em geral, para incentivar os bancos a prestarem
melhores e mais eficientes serviços. Mas também é importante manter uma margem
de rendibilidade adequada que permita constituir reservas para tempos mais
difíceis.
P.M.
- Como cruzaria a plataforma lusófona com outro desígnio de Macau, que é o da
integração regional?
P.C. – Uma maior integração
com a grande região da foz do Rio da Pérolas, com a qual Macau interage
fortemente, pode ser um bom ponto de partida para o alargamento do papel de
Macau como plataforma para os negócios entre a China e os países lusófonos. É
sempre mais fácil fazer negócio com quem está perto do que com quem está longe.
P.M.
- No mesmo contexto, qual é o impulso que o projeto lusófono pode dar à
diversificação económica?
P.C. – Existe uma grande
complementaridade entre as economias de matriz portuguesa e a do território de
Macau. O intercâmbio com os agentes económicos desses países pode e deve trazer
novas dimensões de negócio à RAEM.
P.M.
- Há muitos sinais na China – e em Macau – de uma nova atitude no campo da
transparência das operações financeiras. Será também esse um instrumento útil
para a internacionalização da economia de Macau?
P.C. – A Banca em Macau
cumpre com os mais altos standards internacionais, em termos prudenciais, de
risco, de transparência, nomeadamente do princípio “Know Your Customer” (KYC),
o que é sempre um sinal positivo do sector financeiro perante os agentes
económicos e a sociedade em geral, tanto local como a nível internacional.
P.M.
- Peço-lhe duas ou três sugestões que queira deixar para que Macau possa melhor
desempenhar o seu papel de plataforma entre a China e a Lusofonia.
P.C. – De entre outras
possíveis, salientaria as seguintes:
1.Maior liberalização da
oferta de produtos e serviços em CNY para empresas.
Principalmente para as
empresas envolvidas no comércio entre a China e os países lusófonos seria um
desenvolvimento importante.
2. “Business Lounge”
Muitas empresas que
pretendem estabelecer-se em Macau deparam-se com a escassez de espaços ou com
custos elevados de aluguer dos mesmos.
Para contornar tal problema,
“Business Lounges”, com infraestructuras básicas (luz, Internet, fax,
telefone), poderiam ser uma solução prática.
3.Incentivos específicos,
nomeadamente linhas de crédito ou bonificação de juros para empresas dos países
lusófonos que queiram investir em Macau. Paulo
Rego – Macau in “Plataforma Macau”
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