Já dizia o célebre escritor e pensador
francês, Camus que “não existe a verdade. Só existem verdades” Comungo por
inteiro desta forma de pensar e de raciocinar, pois tudo é relativo, e sujeito
a diversas e variadas leituras, diferentes ângulos de abordagem e de
interpretações.
Tomás Medeiros |
Ora bem, tudo isto vem a propósito de ter
ouvido aqui há dias numa estação de rádio, a entrevista dada pelo médico e
poeta santomense, Tomás Medeiros, a pretexto e à volta das comemorações dos 70
anos da antiga e já há muito extinta, Casa dos Estudantes do Império em
Portugal, CEI. (1944-2014).
O que se segue deverá ser lido como uma
espécie de transcrição por outras palavras, daquilo que disse sobre o assunto,
Tomás Medeiros, no alto dos seus experientes e sabedores anos de vida. Conhecido
pensador, escritor e antigo poeta militante. Ele fez parte do núcleo inicial
dos fundadores do MPLA, do MLSTP. Dirigente estudantil, e activista político,
Medeiros participou, colaborou com os outros movimentos e grupos que surgiram
em Portugal, após a II Grande Guerra Mundial, com aspirações independentistas
das então Colónias e Províncias Ultramarinas portuguesas de África.
Esclareceu que a CEI foi fundada em 1944.
Salazar tinha então como ministro da Educação, Vieira Machado e como Comissário
da Mocidade Portuguesa Marcelo Caetano, estes dois últimos foram o executivo e
o legislador da recém-institucionalizada CEI. Esta albergaria os estudantes
universitários africanos em Portugal que deviam estar juntos e não, em reuniões
separadas e assim melhor controlados, o que, ao fim e ao resto, era o
pretendido pelo regime.
Tomás Medeiros foi um dos dirigentes da CEI.
Existiam na altura, e muito antes do
aparecimento da CEI, várias e importantes Associações de jovens estudantes
vindos de Angola, da Guiné, de Cabo Verde, de Moçambique, de São Tomé e da
Índia.
As palavras conhecedoras de Tomás Medeiros,
cujo conteúdo foi por ele vivido em directo, afirmaram que no que respeitava
aos estudantes africanos, não todos, é certo, muitos andavam à procura, a indagar
sobre quem eram? De onde provinham? E porque se sentiam diferentes? Estas
questões existenciais sobre a procura da verdadeira identidade haviam sido
começadas a debater, nas diferentes associações já referidas e em actividade,
antes da CEI e continuariam nela a ser discutidas.
Daí que o entrevistado, considerou ser a Casa
de Estudantes do Império, o verdadeiro aglutinador e um importante germinador
de ideias e de estratégias para as lutas futuras pelas independências das
Colónias portuguesas africanas. Por outro lado, a CEI foi também uma casa
acolhedora, de convívio, de solidariedade, de tertúlias literárias que
revelaram e descobriram poetas e escritores, os quais mais tarde, entre nós,
consagrados.
O interessante, é que a determinada altura, a
conversa radiofónica de Tomás Medeiros, foi muito esclarecedora quando afirmou
que de entre os estudantes que – logo de início – frequentaram a CEI,
exceptuaram-se os estudantes cabo-verdianos pois estes últimos – continuou
Tomás Medeiros – viviam já e possuíam já plena consciência da sua
caboverdianidade. Logo, da sua identidade e celebravam-na na Estrela (Bairro
lisboeta) entre palestras, análises, “mornas e cachupa”…
Agora, volto a um dos últimos livros sobre A.
Cabral. Este não havia ainda arribado a Lisboa. Tal só viria a acontecer em
1949. E por mão de Marcelino dos Santos, (moçambicano) ele entrou na Casa de
Estudantes do Império. Nessa altura já faziam parte da direcção da CEI, dois
outros ilustres estudantes universitários cabo-verdianos: Aguinaldo Veiga e
Humberto Duarte Fonseca.
Retomando a entrevista escutada do poeta
santomense, devo dizer que o que atraiu mais a minha atenção, foi a afirmação
de que nos anos 30 e 40 do século XX – décadas de significativo número e de boa
frequência de estudantes universitários cabo-verdianos, em Portugal – era já
sólida e bem expressada e revelada, a consciência da caboverdianidade, entre
esses mesmos estudantes oriundos destas ilhas, na antiga Metrópole. Embora se
trate de matéria bem conhecida e de tese já há muito demonstrada, tornou-se-me
em contexto, mais iluminadora por ter sido proferida por uma testemunha
intelectualmente válida a todos os títulos, e coeva desses tempos. A pessoa e a
voz do poeta Tomás Medeiros. Ondina
Ferreira – Cabo Verde in “Coral Vermelho”
Sem comentários:
Enviar um comentário