Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

Myanmar - História lusa na antiga Birmânia traduzida para Português

James Swe quer que a comunidade de descendentes de portugueses no Myanmar conheça essa herança cultural. O seu livro sobre os portugueses que por lá passaram durante a primeira dinastia birmanesa vai ter lançamento em língua portuguesa no próximo ano. “Se formos até estas vilas [na zona de Ye U, em Myanmar] falar com as pessoas e perguntar qual a sua nacionalidade, dizem que são portugueses. Não sabem onde fica Portugal nem falar português, mas sentem-se portugueses. Mesmo o Governo, até cerca de 1970 não os reconhecia como birmaneses, chamava-lhes estrangeiros”



Myanmar, à época Birmânia, foi um dos países por onde os portugueses se chegaram a fixar enquanto exploravam a Ásia. “Cannon Soldiers of Burma”, um livro de James Swe que retrata os portugueses que passaram pela antiga Birmânia e assumiram a posição de mercenários entre lutas pelo poder de reis, vai ser traduzido para a língua de Camões. Espera-se que seja lançado em meados do próximo ano.

James Swe, autor da obra, é ele próprio descendente de portugueses que se radicaram na Birmânia no século 16, embora viva no Canadá. O livro vai sair numa publicação conjunta entre a Gradiva e a Macaulink, com o apoio do Instituto Internacional de Macau. No território vai contar com o lançamento de 200 exemplares, enquanto em Portugal planeiam lançar 500.

Foi em 1510 que os portugueses chegaram à Birmânia. Realizavam trocas comerciais com a comunidade local e actuavam como mercenários a favor dos reis, outras vezes como inimigos. O autor explicou que os mercenários portugueses em 1613 perderam uma guerra contra o rei Anaukpetlun, tornando-se prisioneiros e se deslocaram para o centro da Birmânia.

Os portugueses que aí ficaram, dados pelo nome de “Bayingyi”, concordaram em servir como soldados por várias gerações. Anos mais tarde, foi-lhes concedida uma terra, Ye U, onde construíram a primeira aldeia portuguesa. Foi neste local que também nasceu James Swe. É descendente de portugueses na 14ª ou 15ª geração, conseguindo traçar a árvore genealógica até ao século 17.

Um dos motivos que o inspirou a escrever o livro foram as histórias que ouvia durante os Verões passados na terra natal. “A maior história que todos os católicos conhecem é que quando os portugueses foram presos e tomados como prisioneiros de guerra, todos os jovens soldados tiveram o tendão de Aquiles cortado, porque assim não conseguiam controlar o pé. Então não podiam fugir nem lutar”, recordou James Swe. Histórias passadas de geração em geração que agora partilha com a sua família.

O autor tem três filhos e quatro netos. “A minha neta Maya, tem muito interesse nestas coisas. Quando era mais nova disse à professora que os avós ajudavam refugiados na fronteira da Birmânia. E depois de dois ou três dias havia pessoas a deixarem-nos coisas à porta”, disse, referindo-se o episódio ao facto de tanto James como a sua mulher terem trabalhado numa clínica na fronteira com a Tailândia que dava apoio a campos de refugiados.

Para além disso, quer que a actual população de Myanmar saiba a história dos portugueses. “A população só conhece uma versão, de que [os portugueses] foram destruir os pagodes budistas. Tenho de lhes dizer que não foi isso que fizeram, até construíram um pagode para o casamento budista de uma princesa. E ainda está lá”, sublinhou, acrescentando que “os portugueses foram os principais actores na construção de uma Birmânia contemporânea”.

A ligação não morreu. “Se formos até estas vilas falar com as pessoas e perguntar qual a sua nacionalidade, dizem que são portugueses. Não sabem onde fica Portugal nem falar português, mas sentem-se portugueses. Mesmo o Governo, até cerca de 1970 não os reconhecia como birmaneses, chamava-lhes estrangeiros. Só agora é que os aceitam como cidadãos”, disse. James Swe apontou também para outras características de ligação: “Ainda mantemos alguma comida ou nomes parecidos. Cozinhamos salsichas de forma muito parecida, o meu pai adorava fazer esses pratos”.

James Swe é agora mais canadiano do que birmanês, dado que durante quase 40 anos não pôde pisar o chão da sua terra natal. Quando lhe foi autorizado o regresso, em 2012, já levava oito anos de investigação feitos. Com grande parte da biblioteca dos reis birmaneses no Reino Unido, o autor explicou que passou muito tempo a voar entre Inglaterra, Portugal e o Canadá.

Em Myanmar, a informação era escassa e pouco acessível. “Quando o governo militar tomou o poder em 1962 fecharam a universidade. Há livros na universidade mas não nos é permitido ter-lhes acesso”, comentou. Salomé Fernandes – Macau in “Jornal Tribuna de Macau”

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