O bispo nunca chegou a pôr os pés em Nanquim mas trouxe a laranja-da-China para o Alentejo, no século XVIII
O historiador José António Falcão é um dos três galardoados com o Prémio Fundação Calouste Gulbenkian, no valor de 2000 euros, anunciou a Academia Portuguesa da História.
Irene Flunser Pimentel, David Soares, Massimo Bergonzini, Luís Reis Torgal, José d’Encarnação, Assunção Melo, Susana Mourato Alves-Jesus, Ana Ávila de Melo e Cláudia Thomé Witte foram os outros investigadores distinguidos pela Academia Portuguesa da História (APH) que anualmente premeia trabalhos publicados nesta área do saber.
José António Falcão venceu o Prémio Gulbenkian/História da Presença de Portugal no Mundo, com a obra “Parecer e Ser: Excursus Vital de D. António Paes Godinho, Bispo de Nanquim”.
O livro, editado pela ORIK – Associação de Defesa do Património de Ourique e lançado em Maio passado na Biblioteca Municipal de Ourique, conta a história do Bispo que trouxe a laranja-da-China (como então se chamava) para o Alentejo, no século XVIII.
O autor – historiador de arte, museólogo e docente universitário – tem consagrado grande parte da sua atividade ao estudo e divulgação dos bens culturais do Alentejo, nomeadamente através do Festival Terras sem Sombra, que conta já com dezanove edições.
A obra resulta de um profundo trabalho de investigação que traz para a ribalta uma das mais influentes personalidades do Portugal do tempo de D. João V.
Recusando o aparato mundano dos prelados do seu tempo, o Bispo de Nanquim levou a cabo uma discreta, mas eficaz ação evangelizadora e influenciou também as relações com a China, entre muitos outros traços que contribuíram para lhe perpetuar a memória entre os contemporâneos.
Curiosamente, foi D. António Paes Godinho quem difundiu a laranja-da-china e trouxe os chineses para o Alentejo.
José António Falcão confessa que desde há muito a misteriosa figura de D. António Paes Godinho o intrigava, «um bispo de Nanquim que as circunstâncias da política internacional do tempo do imperador Kangxi impediram de chegar à China, mas que trouxe o Extremo-Oriente até ao Alentejo».
Sublinha que se trata «de uma personalidade quase mítica da história de terras como Santiago do Cacém, Viana do Alentejo ou Mafra, para não falar da aldeia onde nasceu, Santa Luzia, hoje no concelho de Ourique; no entanto, a sua existência foi bem palpável e deixou fortes marcas».
Grande parte dessa aura «deve-se ao facto de ter sido membro destacado de um movimento espiritual radical, profundamente reformador, a Jacobeia, que assumiu as rédeas do poder no tempo de D. João V e foi depois objeto de perseguição por parte do Marquês de Pombal». E acrescenta: «D. António Paes Godinho manteve, afinal, mesmo nas mais altas instâncias, a sua maneira de ser como alentejano de lei».
Na atmosfera de luzes e sombras da corte joanina, Paes Godinho foi alguém que se manteve à margem dos jogos políticos e conquistou a estima do rei, mas, como realça o autor, «nunca quis outra coisa senão poder estar, em recato, nesse Alentejo onde estavam as suas raízes».
Quanto a esta região, a memória do bispo de Nanquim está sobretudo associada à introdução da laranja-da-china e de outras espécies exóticas, que a tradição diz ter mandado vir da China continental, através de Macau, contribuindo, assim, para o desenvolvimento da hortifruticultura e do paisagismo em Portugal. É célebre o jardim que fez plantar na sua quinta dos Olhos Bolidos, em Santiago do Cacém.
Por outro lado, afirma também a tradição que, nunca tendo podido chegar a Nanquim – esteve quatro vezes a ponto de embarcar, mas jamais chegou a autorização para partir –, fez vir das distantes paragens chinesas algumas dezenas de seminaristas, que concluíram os estudos eclesiásticos no seu paço.
O livro foi lançado pela ORIK – Associação de Defesa do Património de Ourique.
Com um conjunto alargado de apoios institucionais – onde sobressai o Alto Patrocínio do Presidente da República – e empresariais, a obra, refere o editor, «traz para a luz do dia uma personalidade que nasceu na antiga freguesia de Santa Luzia, foi designado bispo de uma remota região da China, em 1716, e teve papel central na corte do rei D. João V e na sagração da basílica de Mafra».
Quem quiser adquirir a obra, deverá contactar através do blogue da ORIK: associacao-orik.blogspot.com, onde o livro está à venda. In “Sul Informação” - Portugal
Conheça todos os galardoados
A obra “Do 25 de Abril de 1974 ao 25 de Novembro de 1975 – Episódios menos conhecidos”, de Irene Flunser Pimentel venceu o Prémio Lusitânia, no valor de 2000 euros.
José António Falcão venceu o Prémio Gulbenkian/História da Presença de Portugal no Mundo, com a obra “Parecer e Ser: Excursus Vital de D. António Paes Godinho, Bispo de Nanquim”.
O Prémio Gulbenkian/História Moderna e Contemporânea foi para David Soares pela obra “O Bobo e o Alquimista: Deformidade Física e Moral na Corte de D. João III”.
O investigador da Universidade do Porto Massimo Bergonzini venceu o Prémio Gulbenkian/História da Europa pela obra “Agostinho Barbosa. L’attività spirituale del giurista e sacerdote portoghese nella Villa e Corte di Madrid”, sobre o escritor, bispo e canonista português que viveu entre a Península Ibérica e Itália de 1589 a 1639. A obra foi publicada na Cidade do Vaticano.
Luís Reis Torgal venceu o Prémio Joaquim Veríssimo Serrão/Fundação Engenheiro António de Almeida, no valor 2500 euros, pela obra “Vigias da Inquisição”.
O livro “Segredos da Beja Romana” valeu ao arqueólogo algarvio José d’Encarnação o Prémio Augusto Botelho da Costa Veiga, no valor de 750 euros.
O Prémio EMEL (Empresa Municipal de Estacionamento de Lisboa) que distingue investigações históricas sobre os caminhos, percursos e mobilidade, no valor de 2000 euros, foi para a historiadora Assunção Melo, pelo livro “Altares da Memória: o advento das micro-histórias na periferia das periferias”.
A investigadora da Universidade de Lisboa Susana Mourato Alves-Jesus venceu o Prémio CTT/D. Manuel I, no valor de 2000 euros, pela obra “Direitos Humanos em Portugal: História e Utopia – Das Origens à Época Contemporânea”.
A obra “A Metalurgia do Povoado de Pragança, Cadaval, no Contexto da Idade do Bronze – I Idade do Ferro na Estremadura”, de Ana Ávila de Melo, venceu o Prémio Câmara de Oeiras/Octávio da Veiga Ferreira, na área de arqueologia.
O Prémio Santa Casa da Misericórdia de Braga/Dr. João Lobo, no valor de 2000 euros, distinguiu a obra “Amélia de Leuchtenberg: Imperatriz do Brasil, Duquesa de Bragança”, da luso-brasileira Cláudia Thomé Witte.
A APH “aguarda a deliberação” do respetivo júri sobre o Prémio Pina Manique que distingue obras sobre o período do Iluminismo à Revolução Liberal, em 1820.
A entrega dos prémios será no próximo dia 4 de dezembro, às 15h00, no Palácio dos Lilases, em Lisboa, numa sessão que evocará Luís de Camões, onde a historiadora Isabel Almeida proferirá uma oração de sapiência intitulada “Camões e a Incerteza”.
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