O responsável do museu do Bairro
Português em Malaca, Malásia, está desapontado com Portugal por não ajudar na
remodelação do espaço, visivelmente degradado, que conta uma história do legado
português com mais de 500 anos
Em
entrevista à Lusa no museu situado no coração do Bairro Português em Malaca
onde se estima viverem ainda mil a dois mil luso-descendentes em cerca de 180
casas, Jerry Alcantra afirma estar desapontado com os portugueses que “dizem
querer ajudar”, sem que esta chegue. “Não quero ofender ninguém, só digo o que
deve ser dito”, sublinha o lusodescendente.
Carpetes
velhas, molduras partidas e danificadas, quadros rasgados, pratos do séc XVI
partidos, entre algumas outras relíquias em relativo bom estado, é o cenário
que se vê ao entrar neste espaço, no qual se procura preservar uma história que
remonta a 1509 quando Diogo Lopes Sequeira, enviado do Rei D. Manuel, aportou
em Malaca para estabelecer relações e dois anos mais tarde Afonso de
Albuquerque desembarcou, demoliu a Grande Mesquita, e levantou no local uma
fortaleza que seria um importante entreposto comercial.
“Um
museu precisa de ter boas molduras, boas luzes (…) isto assim não pode ser
considerado um museu”, diz, visivelmente triste e revoltado, Jerry Alcantra,
que toma conta do museu há sete anos.
O
lusodescendente explica que antigamente o museu era em parte subsidiado pelo
estado de Malaca, mas que “agora eles não têm dinheiro” e por isso toma conta
do local de forma gratuita, pedindo apenas a quem entra algum donativo.
Para
Jerry Alcantra, o facto de as autoridades malaias não ajudarem resulta de os
luso-descendentes serem praticamente todos católicos romanos, num país onde o
islamismo é a religião oficial, praticado por mais de 50 por cento da população
malaia (31 milhões de habitantes). O budismo (17 por cento) e o taoismo (12 por
cento) estão à frente do catolicismo, que é praticado por cerca de 8 por cento
da população do país. “O Governo [da Malásia] não nos ajuda porque nós não
somos malaios, isto é um país muçulmano, eles não nos vão ajudar, nós somos
católicos romanos”, afirma.
Este
cenário, juntamente com o facto de os portugueses os “terem deixado para trás”,
põe em risco a própria manutenção deste legado. “Os portugueses deixaram-nos
para trás”, acusa, garantindo que, apesar de tudo, aqui neste pequeno recanto
de Malaca o bailado, a música, o português ‘antigo’, o Natal e as festas de São
Pedro são rituais respeitados e praticados religiosamente por esta população.
“A
cultura é o que nos resta para nós termos a noção que somos portugueses, mais
nada. Nós não parecemos portugueses, nós somos a quinta geração”, diz,
sublinhando que o cruzamento de culturas tem sido feito ao longo de 500 anos,
até através do casamento.
“Se
eu falar devagarinho vocês [os portugueses de Portugal] entendem”, dando depois
alguns exemplos como “comer, beber, branco, janela”, em crioulo de matriz
portuguesa kristang, uma língua agora ameaçada de extinção, que emprega a maior
parte do seu vocabulário do português, mas a sua estrutura gramatical é
semelhante ao malaio e extrai as suas influências dos dialectos chinês e
indiano.
“O
meu pai é português e a minha mãe é chinesa, o que é que isso faz de mim? Como
é que querem que eu me pareça convosco?”, aponta. Miguel Mâncio – Portugal in “Hoje Macau” com “Agência Lusa”
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