A portuguesa Joana Pinto Couto Silva
saiu do Porto para brilhar na Suíça. Conquistando um lugar de destaque entre os
jovens talentos da ciência no país, a bióloga participou de uma pesquisa
pioneira da Universidade de Basileia, que revelou que hormônios de stress estão
diretamente relacionados a metástases do câncer de mama. Atualmente trabalhando
no Instituto Novartis para Pesquisa Bio-Médica, NIBR, a cientista conta à
swissinfo como é sua vida na Basileia
Ela
é uma filha única de pais professores, nascida, crescida e formada entre o
Porto e Vila Nova de Gaia. Curiosa e interessada, assim se apresenta ao
primeiro olhar a pesquisadora Joana Pinto Couto Silva. Tenho a oportunidade de
a encontrar em uma torre da empresa farmacêutica Novartis, no bairro de
Klybeck, às margens do Reno. É um dia ensolarado e a bióloga me recebe com um
sorriso jovial de generosa afetuosidade. Joana está grávida e o bebê
primogênito deverá nascer no final de maio.
A
PhD em bio-medicina se mostra radiante com o momento que vive aos 35 anos. Não
apenas a maternidade é um motivo de alegria, mas também o reconhecimento pelo
trabalho científico. Em março a renomada revista Nature publicou uma pesquisa
pioneira da qual ela participou. O estudo estabeleceu a relação entre
glicocorticóides e metástases de câncer de mama.
O
artigo foi elaborado pela equipe do professor Mohamed Bentires-Alj, do qual
Joana foi colaboradora de 2013 a 2018, enquanto pós-doutoranda da Universidade
de Basileia (Unibas), e do Instituto Friedrich Miescher de Pesquisa Bio-Médica
(FMI). O instituto é uma organização mista que engloba pesquisas
interdisciplinares da Unibas e do Instituto Novartis para Pesquisa Bio-médica
(NIBR).
Modesta,
Joana minimiza a importância da sua participação nessa descoberta e ressalta
que sua atuação foi mais significativa em outras pesquisas já publicadas e
ainda pendentes, como o estudo da enzima mutante PIK3CA ou a delimitação de
gatilhos para mudanças na identidade celular nas glândulas mamárias.
Independentemente
do debate sobre qual contribuição foi a mais significativa, é incontestável que
sua competência a conduziu à atual posição: chefe de laboratório no NIBR. Desde
2018 ela lidera uma equipe de três pessoas, cujo objetivo é desencadear
descobertas de novos alvos, que resultem em trilhas de pesquisa de medicamentos
contra o câncer.
Ser cientista
"É
um momento muito interessante para se fazer ciência e descobrir novos fármacos.
Começamos a compreender novas formas de atacar alvos que há até pouco tempo
atrás estavam fora de questão por serem muito difíceis de serem inibidos. Houve
uma mudança na forma de encarar novos alvos terapêuticos, em parte graças aos
recentes desenvolvimentos tecnológicos e científicos na area da manipulação
genética e novas modalidades para atacar proteínas oncogênicas. Estamos numa
era onde basicamente o céu é o limite", avalia.
Joana
não está apenas na hora certa, mas também no local certo: o coração da
indústria farmacêutica mundial. A Novartis é um gigante com capacidade de
custear investimento de impacto. Somente em 2018, a empresa aportou US$ 9,1
bilhões em pesquisa e desenvolvimento, contabilizando vendas líquidas na ordem
de US$51,9 bilhões. A unidade de oncologia respondeu por 38% disso (US$ 13,4
bilhões da receita).
"No
meio acadêmico é muito fácil se focar, entrar em uma bolha e esquecer qual é o
propósito de tudo. Na indústria nunca esquecemos o propósito. Há o objetivo
claro de desenvolver medicamentos que vão ajudar pacientes. A responsabilidade
é finalmente produzir algo", diz.
A
motivação vem também de uma tragédia familiar. O irmão da mãe faleceu
abruptamente em 2012. Entre o diagnóstico e o fim passaram-se apenas três
semanas. "Meu padrinho era muito próximo e teve um câncer catastrófico,
isso fortaleceu ainda mais meu propósito de persistir pesquisando", conta.
Diversidade
Sendo
portuguesa, jovem e mulher, Joana carrega consigo a emblemática da diversidade,
um valor também muito presente na empresa. "No começo é bastante
assustador perceber que sou apenas uma pequena peça em um grande
quebra-cabeças", conta, se referindo aos mais de 13 mil trabalhadores do
conglomerado na Suíça.
"Tenho
pessoas na minha equipe que são de diversas nacionalidades, idades e formações
educacionais", conta. "Estando ciente das diferenças, você aprende
que não pode ser controlador sobre a maneira como as pessoas trabalham.
Diversidade enriquece a equipe e quanto mais diversa ela for for, mais
rapidamente avançará" acredita.
Saber
lidar com a diversidade sem fronteiras foi algo que ela aprendeu em Nova Iorque
e no Porto, onde concluiu seu PhD. Joana estudou de 2008 a 2012 no renomado
núcleo de pesquisa oncológica Memorial Sloan-Kettering Cancer Center e no
Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade de Porto
(IPATIMUP).
Dos
Estados Unidos a pesquisadora recorda: "Todos os dias tínhamos grandes
investigadores visitando e palestrando, então havia muita exposição à
comunidade científica internacional".
Família bi-nacional
Aqui
na Suíça, Joana é uma dentre os mais de 266 mil portugueses que adotaram a
confederação como país de residência. Com a maternidade, questões de identidade
e pertencimento tem rondado os pensamentos dela.
"Ainda
não estou considerando ativamente me candidatar para a cidadania suíça, mas é
algo que poderei pensar quando me tornar apta. Quero que meus filhos sejam
educados como suíços e portugueses. Naturalmente será mais fácil para eles
serem suíços, porque estarão vivendo aqui, mas falarei com eles apenas em
português".
A
cientista é casada com o pesquisador suíço Adrian Britschgi, que também é
especializado em oncologia e pesquisador na indústria farmacêutica. Eles se conheceram no laboratório do FMI e
foi o acolhimento da família dele que a fez chamar a Suíça definitivamente de
"lar".
"Por
um tempo, é claro, eu sonhava em retornar ao Portugal. Mas agora me sinto
também um pouco suíça. Aconteceu uma transformação há cerca de dois anos atrás.
Eu já estava aqui há quatro anos e de repente comecei a perceber que esse era o
meu lar. Foi uma sensação ao mesmo tempo interessante e estranha, mas devo isso
ao meu marido, a sua família e aos amigos que ganhei aqui".
O
oposto também é verdadeiro."Agora o meu marido está considerando se
candidatar para cidadania portuguesa", diz. "Ele realmente gosta do
país, das pessoas e até fala em comprar uma casa lá".
Como
a jovem matriarca define sua família? "Somos bi-nacionais, permanecemos
tão conectados à cultura suíça quanto à portuguesa!". Marina Wentzel – Suíça in “Swissinfo”
Perfil
2018: Chefe de Laboratório no Instituto Novartis de Pesquisa
Biomédica, Basileia
Pesquisa:
2013-2018: pós-doutoranda no Instituto Friedrich Miescher de
Pesquisa Biomédica (FMI) e Departamento de Biomedicina da Universidade de
Basileia
Graduação:
2008-2012: PHD em Biomedicina Humana na Faculdade de Medicina da
Universidade do Porto, Porto, Portugal e Memorial Sloan-Kettering Cancer
Center, New York, EUA
2002-2006: licenciatura em Biologia na Faculdade de Ciências da
Universidade do Porto
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