Adelto
Gonçalves faz palestra em Quito
Centro Cultural Benjamin Carrion |
QUITO - O jornalista e
escritor Adelto Gonçalves participou, na passada segunda-feira à noite, de uma
conversa no Centro Cultural Benjamin Carrion, em Quito, com o escritor Rogério
Pereira, ex-diretor da Biblioteca Publica do Paraná e editor do jornal mensal literário
Rascunho, que contou com a moderação do poeta Santiago Estrella, jornalista do
diário El Mercurio. O encontro foi promovido pela Embaixada do Brasil em Quito
e contou também com a presença do embaixador João Almino, escritor e membro da
Academia Brasileira de Letras. Gonçalves fez uma leitura brasileira da obra e
da vida dos poetas Fernando Pessoa, Bocage e Tomás Antônio Gonzaga. Já Rogério
Pereira abordou a relação entre literatura e jornalismo como espaços
confluentes.
De Fernando Pessoa, destacou
que o ensaio "O ideal politico de Fernando Pessoa", que consta de seu
livro "Fernando Pessoa: a Voz de Deus" (Santos, Editora da Unisanta,
1997) e foi publicado originalmente em "Estudos sobre Fernando Pessoa (Rio
de Janeiro, Fundação Cultural Brasil Portugal, 1986), teve uma trajetória
interessante, pois seria lido na Biblioteca Nacional de Lisboa pelo ensaísta
Brunelo Natale De Cusatis, professor de Literatura Portuguesa na Universidade
de Perugia, e citado no livro "Fernando Pessoa: Politica i Profezia:
Apuntes y Frammenti 1910-1935" (Roma, Antonio Pelicanti Editore, 1996), do
qual em 2018 saiu uma segunda edição.
Na introdução que escreveu
para esta segunda edição, De Cusatis lembra que o fato de o ensaísta ter
mostrado que o pensamento de Pessoa passava longe das hostes esquerdistas
desagradou ao escritor italiano Antonio Tabucchi (1943-2012), tradutor da obra
de Pessoa para o italiano. Em artigo publicado no diário Corriere dela Sera, de
Milão, em 31 de maio de 2001, Tabucchi acusou De Cusatis de se basear num
ignoto brasiliano (brasileiro desconhecido), como se lê a pagina 24 da edição
atual de Politica i Profezia.
De Cusatis lembrou que
"Adelto Gonçalves é um ensaísta de prestígio e crítico, autor de uma
biografia critica do poeta português Tomás Antonio Gonzaga publicada em 1999
pela editora Nova Fronteira, do Rio de Janeiro".
Durante a apresentação, Gonçalves
lembrou que Fernando Pessoa se definiu como "um conservador ao estilo
inglês, isto é, liberal dentro do conservantismo, e absolutamente
antirreacionario". Mais: Pessoa era contra o comunismo, o socialismo, o
catolicismo e o revolucionarismo. Mas nunca fez a defesa explícita da
escravidão. "Seria um anarquista utópico, mas de direita, tal como se
autodefiniu certa vez Gilberto Freyre. Defendia, porém, que havia um
imperialismo da cultura, ou seja, certos povos exerciam influência sobre outros.
Como exemplo, citava a França", disse, lembrando que esta posição politica
do poeta tem despertado protestos de intelectuais africanos para a decisão da
Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) de dar o nome de Fernando
Pessoa a um programa de bolsas para estudantes. E que seria melhor optar por um
nome mais consensual, como o poeta moçambicano José Craveirinha (1922-2003),
Prémio Camões de 1991, filho de pai algarvio e de mãe ronga.
Depois de fazer referência a
escritores equatorianos como Jorge Icaza e Jorge Enrique Adoum, Gonçalves
destacou principalmente a vida de Tomas Gonzaga, lembrando que, em Gonzaga, um
Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), corrigiu a
informação do professor português Rodrigues Lapa segundo o qual o poeta, no
exilio na Ilha de Moçambique, casara com a "herdeira da casa mais opulenta
de Moçambique em negócios da escravatura" e dedicara "as horas vagas
ao rendoso comércio de escravos".
"De fato, Gonzaga casou
em 1793 com Juliana de França Mascarenhas, de 18 anos de idade, filha de Alexandre
Mascarenhas, que era escrivão e subordinado do poeta na estrutura judiciária da
comarca local. Mais: Mascarenhas morreria em 1793 e, portanto, Gonzaga não
teria tempo de ajudar o sogro a aumentar a fortuna", disse. “Além disso,
Mascarenhas era pessoa de poucas posses: tinha uma casa na ilha e outra no
continente fronteiro que obtivera pelo casamento. Ressaltei também que nas
edições da Gazeta de Lisboa, de 1792 a 1810, Gonzaga, autor de Marília de
Dirceu, só seria superado em número de citações por Bocage, que sempre viveu em
Lisboa, com exceção dos quatro anos (1786-1790) que passou entre Rio de
Janeiro, Goa, Damão e Macau", acrescentou.
De Bocage, Gonçalves destacou
que, em Bocage: o Perfil Perdido (Lisboa, Editorial Caminho, 2003), provou com
documentos que o poeta não nasceu na rua de São Domingos, atual Edmond
Bartissol, em Setúbal, mas sim numa casa localizada a rua das Canas Verdes,
atual Antonio Joaquim Granjo.
"Essa casa a mãe de
Bocage herdara do pai, o corsário francês l`Hedois du Bocage. Em 1771, o pai de
Bocage, José Luis de Barbosa, ouvidor em Beja, seria acusado de desviar a
arrecadação da décima, sendo preso na cadeia do Limoeiro ate 1777. A casa,
sequestrada, iria a leilão em 1800. Da documentação referente a rua de São
Domingos, no Arquivo da Torre do Tombo, não há registro de que alguma família
Bocage ou Barbosa tenha residido naquela casa. Até hoje, porém, a Câmara
Municipal de Setúbal não se resolveu a adquirir o imóvel da verdadeira casa
onde nasceu Bocage e corrigir uma informação falsa de quase século e
meio", concluiu.
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