Por
incrível que pareça, não existia em terras helvéticas uma Câmara de Comércio
portuguesa. Até há pouco. Como sempre nestas coisas, tudo partiu da teimosia de
uma pessoa. Marina Prévost-Mürier viu uma lacuna a preencher, contagiou com
esta convicção outras pessoas e, da conjunção destes esforços, nasceu a obra
A Câmara de Comércio,
Indústria e Serviços Suíça-Portugal (CCISSP) foi fundada em março de
2017, após alguns meses apenas de preparações e contatos, e regista
já uns quantos sucessos notáveis. Em entrevista à swissinfo.ch em Genebra, a
empresária e jurista falou com entusiasmo de uma variedade impressionante de
projetos em preparação e dos êxitos já alcançados. Frisando sempre que é um
trabalho de equipa: "Sou a única portuguesa no comité fundador, todos os
restantes membros são suíços. Todos eles conheciam já Portugal muito bem, por
isso foi natural que tivessem embarcado nesta aventura."
O primeiro a bordo foi o
marido, Jean-François. "Ele admira tudo o que é português", diz a
presidente da CCISSP. "Já vivemos em Portugal e ele gostou muito.
Regressámos em 2012, porque os clientes do meu marido não conseguiam pagar, em
plena crise, e resolvemos voltar para a Suíça. Ele não tem origens portuguesas,
mas tem um enorme sentimento por Portugal e continua a dizer que é lá que quer
viver."
"Quando cheguei à Suíça
registei a minha empresa de consultoria e acontecia frequentemente os clientes
pedirem informações sobre como tratar de residência em Portugal ou instalar lá
uma empresa", explica Marina. Descobriu então, com grande surpresa, que
não existia uma câmara de comércio que pudesse dar resposta a este tipo de
questões. Existe a AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de
Portugal), um organismo do Estado Português criado para dar apoio à
internacionalização da economia portuguesa, mas a entidade tem na Suíça apenas
uma pessoa em funções. "A imigração portuguesa tem na Suíça uma história
de quase meio século e pareceu-me evidente a necessidade de criar aqui uma
câmara de comércio", lembra a jurista. "Comecei sozinha, depois com o
meu marido. Decidi ir bater à porta de Michel Rossetti, que foi presidente da
câmara de Genebra entre 1993 e 1994, de Peter Hofmann, o presidente da Caisse
de Pension Pro e da Swiss Entrepreneur Association, e de Ueli Eicher, um
ex-banqueiro, todos eles conhecedores de Portugal."
Sonhar
e semear
Em 2016 Marina apresentou o
projeto na primeira edição do Encontro de Investidores da Diáspora Portuguesa,
em Sintra. O ano da fundação, 2017, foi muito intenso. Em novembro a CCISSP foi
apresentada à Secretaria Federal da Economia (SECO) e já está registada no sítio
do governo federal. A organização marcou presença no Portugal Exportador, em
Lisboa, um dos principais eventos nacionais dedicados à internacionalização
empresarial. " Nessa ocasião tive a oportunidade de apresentar o projeto
ao presidente Marcelo Rebelo de Sousa", ressalva Marina. "E em janeiro
fomos recebidos em Berna pelo embaixador de Portugal na Suíça, António Ricoca
Freire, e pelo conselheiro económico da AICEP, Miguel Crespo."
Pelo caminho, foram
diligenciados vários encontros com autarcas portugueses, universidades,
empresários e representantes de entidades públicas do sector turístico:
"Avançámos com contatos que acreditamos permitirão estabelecer pontes para
o investimento, como por exemplo a Associação das Termas de Portugal."
"Muito esforço, mas
esforço que dá frutos", diz Marina, apontando alguns dos sucessos
conseguidos pela CCISSP em poucos meses. No dia 2 de maio, Portugal vai ser
representado por estudantes da Universidade da Beira Interior no St. Gallen
Symposium, na Universidade de São Galo, consagrado à inovação tecnológica na
era digital. Uma estreia.
A Câmara bateu-se igualmente
com êxito por voos mais baratos para Portugal: "Quando aconteceu em França
o acidente próximo da fronteira no qual morreram portugueses, pensei que este
tipo de tragédias poderia ser evitado se os portugueses pudessem viajar a
preços acessíveis de avião, no mês de agosto ou nos períodos de festas.
Contatei a EasyJet, a Swiss e a TAP, mas não mostraram interesse em aumentar o
número de voos ou descer os preços dos bilhetes. Fui então falar com
responsáveis de aeroportos pequenos." Marina sugeriu à diretora do
aeroporto de Sion, Aline Bovier Gantzer, a criação de uma linha regular para o
Porto. Gantzer propôs-lhe levar a ideia a Philippe Varone, o presidente de
Sion. Este manifestou algum interesse, mas a batalha não estava ganha. Varone
queria saber se há escolas de pilotagem em Portugal, estava convencido de que
não. A CCISSP não vacilou: "Enviei-lhe toda a documentação, ficou a saber
que há oito no país, frequentadas por nacionais e estrangeiros. Começaram então
a pensar mais seriamente no assunto e no dia 23 de dezembro uma operadora low
cost da Swiss inaugurou uma linha Sion-Porto. Os preços são próximos dos
praticados pela EasyJet." Uma primeira linha que é um ensaio para outras e
para outros aeroportos do país.
Favorecer a descentralização
A CCISSP colocou em marcha
vários projetos. Um leque variado que inclui a introdução no mercado suíço de
produtos de excelência e artigos "gourmet", a criação em Portugal de
estruturas habitacionais para reformados suíços e postos de trabalho em
empresas suíças para técnicos informáticos residentes em Portugal – uma fórmula
que permite a esses empregados qualificados continuar a viver lá e ao
empregador não ter de lhes pagar salários "suíços". A responsável da
CCISSP sublinha que estes são resultados conseguidos passo a passo, que exigem
primeiro a construção de relações de confiança.
A Câmara organiza missões
económicas, leva empresários suíços a Portugal, para reuniões sobre áreas
específicas, como por exemplo a nano tecnologia. "Consideramos que é
importante favorecer a descentralização, e por isso mediamos contatos com as
mais diversas regiões do país, não nos limitamos a Lisboa e Porto, porque há
numerosas oportunidades de excelente qualidade de norte a sul, sem esquecer a Madeira
e os Açores – onde o investimento empresarial pode concorrer a incentivos da
União Europeia. Os suíços não dispõem destas informações, somos nós que os
ajudamos a descobrir todo um leque de possibilidades que desconhecem."
A CCISSP também já ajudou
empresas portuguesas a entrar no mercado suíço com produtos de excelência. Uma
empresa dos Açores está já a vender chá aqui, uma jovem empresária da Covilhã
lançou no mercado suíço o queijo da Serra e há empresas do ramo do calçado
interessadas. Começa a ser explorado o comércio de produtos "gourmet"
e há interesse em trazer para cá as chamadas "trufas alentejanas", as
túberas.
Desfazer
preconceitos
A responsável da CCISSP diz
que não faltam ideias e que a entidade tem sido muito contatada, mas que a par do
interesse existem também obstáculos a vencer. "Existem entre os suíços
convicções muito erradas sobre Portugal, preconceitos enraizados, fruto de
desconhecimento. Encontrei pessoas que receavam instalar-se lá porque pensavam
que não encontrariam serviços de saúde, que não há médicos." O trabalho da
CCISSP tem sido também fornecer a informação que permite ter uma imagem real do
país. Marina Prévost-Mürier conta que um empresário suíço que participou numa
missão empresarial recente no norte de Portugal estava convencido que não ia
conseguir acesso à internet. "As pessoas aqui desconhecem que, em certas
áreas, Portugal está até mais avançado: nalguns pontos do país já havia fibra
óptica muitos anos antes de existir em Genebra. Também nem todos sabem que temos
especialistas de grande qualidade cujos serviços estão a preços várias vezes
inferiores aos praticados aqui, por exemplo na área da cirurgia estética ou
estomatologia." Nelson Pereira –
Suíça in “Swissinfo”
Câmara
de Comércio, Indústria e Serviços Suíça-Portugal (CCISSP)
A CCISSP foi
fundada em 9 de março de 2017, com o objetivo de dar apoio às pequenas, médias
e grandes empresas e promover intercâmbios económicos e comerciais entre os
dois países. Faz parte da Rede de Câmaras de Comércio Portuguesas (www.rccp.pt)
e é oficialmente reconhecida pela Confederação Helvética. Tem como Presidente
Honorário um antigo presidente da Câmara de Genebra, Michel Rossetti, membro do
executivo genebrino entre 1987 e 1999.
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