O presidente da Generalitat da
Catalunha, exilado na Bélgica desde há cinco meses, foi preso domingo, 25 de Março, na Alemanha numa polémica operação que envolveu os serviços secretos espanhóis
e alemães, quando regressava da Finlândia, onde deslocou a convite do respetivo
Parlamento. Afastado das suas funções pelo governo espanhol, num país cuja
justiça mostra uma evidente politização e motivação ideológica, Carles
Puigdemont foi reeleito há três meses para o Parlamento da Catalunha, numas
eleições de que resultou reforçada, contra todas as expectativas do governo de
Madrid, uma maioria favorável à independência da Catalunha, ao direito da
região a decidir o seu futuro e à recondução no cargo do presidente da
Generalitat. Além de Puigdemont, estão presos preventivamente e sem direito a
fiança nove dirigentes independentistas catalães, oito dos quais deputados
reeleitos em dezembro, entre os quais se contam a anterior presidente do
Parlamento da Catalunha e o vice-presidente da Generalitat. Quatro destes
presos estão detidos preventivamente há já cinco meses. Boa mostra do desnorte
punitivo do Supremo Tribunal espanhol é a recusa de libertação de um destes
presos, Joaquim Forn, membro do governo catalão suspenso, cuja defesa solicitou
que pudesse esperar pelo julgamento em liberdade por forma a tratar-se da
tuberculose que contraiu na prisão. O juiz Pablo Llarena, autor de todas estas
ordens de detenção, recusou tal pedido a pretexto de que o detido podia ser
tratado na prisão... O mesmo juiz, que tem, por enquanto, processos abertos
contra um total de 22 dirigentes e ativistas políticos catalães, a que se
juntam mais de um milhar de autarcas e de diretores escolares que aguardam
decisões da justiça sobre a sua colaboração na organização do referendo de 1 de
outubro, impediu recentemente que outro dos presos, o dirigente associativo
Jordi Sánchez, pudesse defender a sua candidatura à presidência da Generalitat
perante o Parlamento catalão, sem que nenhuma sentença lhe tivesse retirado os
seus direitos políticos - ao contrário do que a mesma justiça espanhola fez em
1989 com um preso da ETA a que foi permitido sair da cadeia para defender a sua
candidatura à liderança do governo basco. Na sexta-feira passada, no mesmo dia
em que o Comité de Direitos Humanos da ONU instava "com urgência" o
Estado espanhol a "assegurar todos os direitos políticos de Jordi
Sánchez", o novo candidato independentista à presidência, Jordi Turull,
foi preso em Madrid na véspera de se submeter a uma segunda votação parlamentar.
Além de Puigdemont, quatro outros membros do seu governo e duas dirigentes
independentistas exilaram-se na Bélgica e na Suíça; contra todos eles o Governo
espanhol emitiu um mandato europeu de captura. A última, na passada
sexta-feira, foi a líder republicana Marta Rovira que deixou o país acompanhada
da sua filha para não se ver impedida de "lhe dar tudo quanto lhe posso
dar", deixando a Catalunha com uma "profunda tristeza" por
afastar-se "de tanta gente que amo" com quem "partilhei tantas
lutas durante tantos anos com um único objetivo: o de mudar a sociedade,
torná-la mais justa".
Só as ditaduras, as
«democraduras» ou as «dictablandas», têm presos políticos. Só elas prendem
dirigentes políticos e associativos legitimamente eleitos como representantes
do povo e que nunca usaram da violência política para defender os seus ideais,
acusando-os de crimes de "rebelião" e "sedição" para tal
interpretando como "violência" o exercício do direito fundamental de
manifestação ou de expressão. Podem repetir à saciedade os governantes
espanhóis o mantra de que a Espanha é uma "democracia consolidada",
mas os seus atos na questão da Catalunha apontam em sentido oposto. Podem
muitos governantes europeus virar a cara e fingir não perceber que,
independentemente do que pensarem do direito à autodeterminação do povo
catalão, é a democracia e os Direitos Humanos que estão em causa, na Catalunha
e no conjunto da Espanha! Nós, pelo contrário, não calamos a nossa indignação
perante semelhante sanha repressiva disfarçada de legalidade e juntamos a nossa
voz a todas e todos aqueles que, na Europa e no mundo, apelam à libertação
imediata de Carles Puigdemont e de todos os presos políticos catalães. Que
acabem de uma vez por todas práticas políticas e judiciais incompatíveis com o
respeito dos direitos cívicos e políticos dos cidadãos catalães e que, como se
tem apelado por todo o mundo, se dê lugar à negociação política de um problema
político.
27 de março de 2018
Manuel Loff, historiador,
professor, Faculdade de Letras da UP
Fernando Rosas, historiador,
Instituto de História Contemporânea/NOVA
André Freire, politólogo,
professor, ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa
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