99%
da produção nacional já é exportada e o país não tira partido do potencial que
poderia ser acrescentado com a sua transformação
Apesar de ser ancestral o
conhecimento dos benefícios do sabugueiro para a saúde, e de ter um lugar
cativo na medicina tradicional, a Universidade de Aveiro (UA) concluiu uma
investigação que comprova o seu efeito positivo no controlo dos diabetes. A
investigação vai agora orientar-se para a produção de novos alimentos à base
desta planta.
A conclusão alcançada serviu
de ponto de partida para um projeto mais ambicioso dedicado ao sabugueiro, cujo
arranque aconteceu este mês, envolvendo, além da UA, a InovTerra – Associação
para Desenvolvimento Local, o INIAV-Instituto Nacional de Investigação Agrária
e Veterinária e a InovFood, entre outros.
Daqui para a frente, a ideia é
desenvolver produtos, a partir das bagas e das flores, destinados à
alimentação. “A prioridade é criar produtos alimentares onde o sabugueiro seja
o protagonista, que possam ser usados não apenas no combate à diabetes, mas na
promoção da saúde e na prevenção de doenças”, diz a investigadora Sílvia Rocha,
do Departamento de Química da UA, que orientou a investigação conduzida por Ângelo
Salvador.
Ainda se desconhecem os
produtos que poderão chegar ao mercado ao longo dos próximos quatro anos – o
tempo de duração do projeto. A UA está a desenvolver formulações e fazer as
avaliações nutritivas, para que as empresas interessadas possam assumir a
produção futura.
Estamos a falar, por exemplo,
de possíveis compotas, concentrados, xaropes e fibras.
“Só assim será possível
valorizar o sabugueiro nacional” – o foco do projeto designado por
“SambucusValor”, acentua Bruno Cardoso, presidente da InovTerra, que apresentou
a candidatura à obtenção de um financiamento de 260 mil euros.
A produção está confinada a
cinco concelhos, sendo o mais forte o de Tarouca, seguido do de Tabuaço.
Moimenta da Beira, Lamego e Armamar partilham o terceiro lugar em temos de
quantidades produzidas. O problema é que os 600 produtores que asseguram as
1500 toneladas por ano de baga fresca exportam 99,9% da baga de sabugueiro,
sobretudo para a Holanda e a Alemanha, apenas sujeita a um processo de
prensagem antes da expedição, na Regiefrutas, uma cooperativa em Tarouca.
Ou seja, o país não tira
partido de um valor que poderia ser acrescentado por cá, através da sua
transformação, tal como fazem os países de destino, pelo uso desta matéria
prima na indústria alimentar e farmacêutica, como assinala Bruno Cardoso.
A ideia inicial era conhecer
as moléculas existentes nas flores e nas bagas do sabugueiro que pudessem ter
interesse para a saúde. Criou-se, depois, uma metodologia que permitisse
conservar esses produtos ao longo do tempo, sem se degradarem. O final da
pesquisa, feito numa universidade polaca, envolveu o uso de animais nos quais
foi controlada a dieta com extratos da baga, permitindo concluir que estes
podiam ter um efeito importante contra os diabetes, explicou Sílvia Rocha.
Entre os vários efeitos que a
planta possa ter na saúde, o impacto no metabolismo da glicose foi visto como
relevante porque, como sublinhou a investigadora, “os diabetes representam uma
preocupação devido ao número de pessoas afetadas em todo o mundo, e que tenderá
a crescer nos próximos anos”.
A ideia é criar um centro
piloto, que deverá representar um núcleo de inovação em toda a cadeia de valor
do sabugueiro: da planta à criação de novos produtos alimentares de valor
acrescentado, lê-se na folha de divulgação do projeto.
Daí que a diversidade da
equipa constituída vise aliar “sinergismos e complementaridade, estimulando os
canais adequados de comunicação e transferência de conhecimentos e tecnologias,
aproximando as entidades de I&D com os produtores e empresas do setor
agroalimentar”.
A planta que sobreviveu à ira
do Marquês
Bruno Cardoso é, também ele,
um produtor, fixado em Tarouca, por via da herança familiar, desde os tempos
dos avós. Apesar do peso geracional, tem um gosto pessoal pela produção da
planta por motivos que enumera com satisfação: “Primeiro, é uma cultura limpa,
sem químicos; segundo, porque é rentável e importante para a região; terceiro,
porque o seu teor de doçura é alto, por comparação com produções de outros
países europeus; por último, não há problemas com a venda e é paga”.
Os seus terrenos ocupam uma
parte dos 350 hectares dedicados ao sabugueiro na totalidade dos cinco
concelhos acima mencionados. Mas não é um número rigoroso, devido à dificuldade
em apurar a área. Estima-se que metade da produção exista em pomar, mas outra
metade das árvores seja usada como bordadura de terrenos com outros cultivos,
tirando partido de outras qualidades da planta, quer em termos de robustez
contra o vento, quer como repelente de pragas. Eis a sua versatilidade.
Tais vantagens não demoveram
Marquês do Pombal de quase o extinguir da flora portuguesa, ordenando o
arranque dos sabugueiros, ainda por cima, autóctones do país, para que as suas
bagas não fossem usadas indevidamente na adulteração do vinho. Mal sabia ele
que a planta viria a ser revitalizada, na expectativa da sua valorização
económica. Teresa Costa – Portugal in “Dinheiro
Vivo”
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