“Hoje esta lógica de
acumulação de capital está profundamente alterada, porque vivemos numa espécie
de aldeia global onde todos os dados parecem disponíveis, mas sobre eles actua
um mecanismo de escolha que nos ilude e nos inutiliza as opções mais racionais.
Vivemos num Zollverein europeu
(Martins adverte na pág. 56 de Política e Economia, 1959, que um «Zollverein é um prólogo de um império»),
em breve teremos a mesma moeda, porque se não for o Ecu será forçosamente o
Marco, mas o nosso fiel amigo de há perto quatro séculos, o bacalhau, foi-nos
quase retirado ilegalmente com o consenso dos europeus-unidos, e a Renault
escapa-se-nos do território, --- o que nos deixa a pior impressão possível
sobre as novas solidariedades que nos estavam prometidas. Em que condições
disporemos das águas dos rios internacionais? Não sabemos nem o sabe o nosso
parlamento. Porque a diplomacia das grandes decisões negoceia-se cada vez mais
secretamente.
A guerra do Vietnam
foi um erro colossal, --- diz-nos MacNamara um dos seus grandes responsáveis,
--- e quem restitui as vidas que esse erro custou e explica o apoio que toda a
grande imprensa lhe deu? Que se dirá daqui a uns anos sobre Saddan Hussein, e
sobre as guerras na Jugoslávia, que todavia sabemos condizerem com aqueles
interesses pangermanistas, e portanto anti-paneslavitas, que originaram a
primeira guerra mundial.
Nós temos todos uma
imagem de vida em cuja base, e sumariamente, os eucariotas comem os
procariotas, o zooplancton come o fitoplancton, o crick come o zooplancton, o
peixe grande come o peixe pequeno, e o homem come regularmente o peixe grande
--- para seguir, apenas, uma das séries da cadeia alimentar. Isto é cruel, mas
é. E estou a deixar de lado a série da domesticação, que não tem mais de dez
milénios, assim como estou a esquecer a próxima autodomesticação dos homens,
com recursos espectaculares, como toda a gama de escravidão, da servidão e da
proletarização, directas --- ou como formas inconscientes. Há formas mais ou
menos simbólicas de abstenção; há os vegetarianos, os jejuns, os tabos
alimentares, os períodos religiosos de privação alimentar determinada, --- mas
nada nos impede de matar para comer, com especiais formas de sadismo, ou de
remorso, que cada qual situa num dado grau da escada.” Óscar Lopes – Portugal
Em
memória de Óscar Luso de Freitas Lopes
Leça da Palmeira 02.10.1917 - Porto 22.03.2013
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Óscar
Luso de Freitas Lopes
licenciou-se em Filologia Clássica, na Faculdade de Letras da Universidade de
Lisboa, e em Ciências Histórico-Filosóficas, na Faculdade de Letras da
Universidade de Coimbra. Recebeu a Grã-Cruz da Ordem da Instrução Pública, em
1989, e a Ordem da Liberdade, em 2006.
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