Algumas centenas dos entre 130 mil e 150 mil elefantes que vivem actualmente no Botsuana podem ter como destino Angola e a Zâmbia de forma a diluir os conflitos entre os agricultores locais e estes gigantes africanos que estão no topo da lista das espécies ameaçadas de extinção, mas, para isso, vai ser preciso recuperar as antigas rotas migratórias destes "bons gigantes" que a guerra afastou dos territórios angolanos do sul
Há
muito tempo que o excesso de população de elefantes no Botsuana deixou de ser
apenas uma mais-valia turística para ser um problema sério entre as autoridades
de Gaborone e os milhares de agricultores que, com as plantações a ocupar cada
vez mais áreas selvagens, vêem estes animais a alimentarem-se nos seus campos e
a destruir equipamentos, como vedações.
Para
ultrapassar este problema, o Governo do Botsuana admitiu a ideia de abater
alguns animais mas as organizações internacionais de defesa da vida selvagem
rapidamente se opuseram à medida.
A
alternativa, visto que a Namíbia vive actualmente o mesmo problema e também se
quer livrar de alguns dos seus paquidermes, é encontrar resposta nos países
vizinhos onde estas populações diminuíram de forma significativa nas últimas
décadas devido a conflitos armados, como foi o caso de Angola, onde, nos 27
anos de guerra civil lforam abatidos dezenas de milhares destes animais, para
consumo humano e para venda de marfim como forma de financiar a guerra, ou na
Zâmbia.
Durante
o conflito em Angola 1975 a 2002 - e visto que os elefantes recorrem à
transumância (deslocações extensas num determinado território que em África
quase sempre agrupa vários países) para sobreviverem, como é o caso do Delta do
Okavango/Zambezi - Angola, Namíbia, Botsuana, Zimbabué e Zâmbia -, os elefantes
que não foram mortos quase até à sua extinção, acabaram por não regressar ao
território, ficando muitos deles para sempre longe de Angola.
Apesar
de terem sido verificados alguns regressos nas migrações sazonais, as
mundialmente famosas manadas de elefantes em Angola nas décadas de 1960 e 1970,
que atraiam pessoas de todo o mundo, estão longe de serem repostas e Angola tem
hoje menos de 10 mil elefantes, que, embora estejam a crescer, estão longe dos
mínimos aceitáveis para uma população sustentável.
Fazer
com que os elefantes que já estiveram em Angola no passado regressem é uma
forma de arrastar outros com eles, repondo os ciclos da natureza e aliviar a
pressão sobre os agricultores no Botsuana, permitindo assim que estes animais, raros,
não sejam abatidos pelas autoridades locais ou pelos agricultores cansados da
sua presença apesar de terem sido eles a invadir os seus territórios
ancestrais.
Recorde-se
que os elefantes são das espécies em maior risco no mundo, sendo o Botsuana ou
o Zimbabué pequenos oásis de populações saudáveis em África mas longe de serem
minimamente suficientes para garantir que, ao ritmo de abates actual pela caça
furtiva, África não deixe de ter populações viáveis destes paquidermes em menos
de duas décadas.
Para
que os elefantes possam regressar a Angola oriundos do Botsuana, as
organizações de conservação da natureza, apontam para a criação de corredores
seguros entre os dois países, que passariam por uma estreita faixa namibiana
entre ambos, ou ainda via Zâmbia, sendo exigido para isso garantir que não
seria tolerada qualquer tipo de presença "inimiga", ou seja, de
caçadores furtivos que continuam a matar estes gigantes para venda de marfim,
na sua maior parte com destino à China.
O
sudoeste angolano é a área para onde os conservacionistas, como Mike Chase, da
ONG Elefantes sem Fronteiras, citado pelo Afrik21, apontam como provável
destino, até porque, garante este site, Luanda e Gaborone já têm um
entendimento formado sobre isso, tendo mesmo criado uma "iniciativa conjunta"
para promover o regresso das manadas a Angola, através das áreas de migrações
ancestrais que os animais mais velhos, sempre uma fêmea matriarca a liderar,
ainda se recordam devido à sua extraordinária memória e porque esta espécie
pode viver para lá dos 60 anos, alguns podem mesmo chegar aos 90 anos.
Para
que este plano seja viável, tanto Luanda, que vê nesta possibilidade uma forma
de garantir viabilidade para os seus planos de fomento do sector turístico,
como Gaborone, têm de investir na redução ou remoção de obstáculos entre os
dois territórios, incluindo a Zâmbia, porque as mandas que regressarem vão
querer, intuitiva e instintivamente, regressar aos hábitos antigos de
transumância.
Um
elemento fundamental é limpar estes corredores de vedações para gado, zonas
actualmente ocupadas por populações humanas que, nalguns locais, deverão ser realojadas,
ou ainda outro tipo de obstáculos mais móveis, como os caçadores furtivos que
podem despoletar nestes animais, extremamente inteligentes, as memórias antigas
da guerra.
Esta
solução vai permitir libertar os actuais mais de 130 mil elefantes do Botsuana
que, se tudo correr bem, poderão encetar de novo as suas migrações anuais
dentro da vasta área da bacia e do delta do Okavango-Zambezi, que junta vastas
áreas da África Austral, incluindo o projecto Kaza - zona de protecção
Okavango-Zambezi, que toca cinco fronteiras: Botsuana, Namíbia, Zâmbia, Angola
e Zimbabué.
Se
este projecto avançar, pode ser um dos mais ambiciosos no âmbito da protecção
das espécies mais ameaçadas em todo o mundo, colocando Angola no topo das zonas
de maior interesse conservacionista em todo o mundo, o que representa, ou pode
representar, um salto de gigante nos seus planos de longo prazo para impulsionar
o sector do turismo.
Recentemente,
o Botsuana e o Zimbabué foram palco de um conjunto alargado, cerca de 300, de
mortes destes bons gigantes, a maior parte devido a uma alegada alga venenosa
que é comum em charcos africanos em tempo de seca, embora existam rumores que
admitem envenenamento devido ao conflito com os fazendeiros. Ricardo Bordalo
– Angola in “Novo Jornal”
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