Por volta da difusão social do
galego são feitas cada ano uma miríade de campanhas institucionais e pessoais,
surgem debates intensos mais ou menos emocionais, mais ou menos racionais e
escrevem-se artigos que são comentados, em média, por mais pessoas que outros
textos com temáticas diferentes. A língua move, é claro. Ora, toda esta ação
empalidece perante uma pergunta: somos capazes de garantir a transmissão
linguística de pais para filhos?
Na Galiza, a percentagem de
pessoas que tem vontade manifesta de que os seus filhos falem o galego que elas
falam é pequeno. A percentagem de aquelas que o conseguem é ainda menor.
Possivelmente tu, que estás a ler este texto, tenhas vontade ou terás vontade
no futuro.
Por que as crianças falam a
língua que falam? Esta também é uma pergunta iniludível. Antes de eu ser pai
achava que os progenitores eram a chave do cofre. Agora que sou pai e converso
com pais, verifiquei que a chave são os iguais… os amigos e colegas. Por sua
vez, os desenhos animados também têm um peso importante, não apenas polo tempo
de exposição que implica como também polo valor que as crianças dão a umas
personagens que nem sempre falam a língua da casa.
Em termos gerais, a melhor
forma de facilitar que os miúdos conservem a língua com que foram educados
polos pais é existir uma envolvente em galego, por outros palavras, um ambiente
que, maioritariamente, se expresse na língua da Galiza. Um dos espaços
imprescindíveis são as escolas e os infantários. Em média, uma criança passa lá
5 horas diárias de segunda a sexta-feira. Se somarmos as atividades
extra-escolares ligadas ao centro ou os encontros com colegas da escola fora da
mesma, a cifra torna-se ainda mais crucial. Na atualidade, este serviço é
abordado polas escolas sementes nalgumas cidades e nas áreas rurais, nem todas,
por muitos centros onde o galego é hegemónico entre as turmas. Ora, resta muito
por fazer e a maioria das famílias estão desassistidas, escolarmente falando.
Outra área relevante, se
atendemos ao número de horas e a influência que têm nas vidas dos miúdos, são
os desenhos animados. Neste aspeto, há uma má e uma boa notícia. A notícia ruim
é que os galegas e as galegas somos educados em que a nossa língua é local
(enquanto o castelhano e internacional, não é?. Com esse esquema, os desenhos
animados tornam-se numa tarefa impossível. Na TV existem dous canais 24 horas
de programação infantil em castelhano, com as desenhos que todos querem ver e a
TVG não oferece nada que se lhe poda comparar. Ora, falava também de uma boa
notícia: podemos ser desobedientes e viver o galego como uma língua
internacional (como o castelhano, enfim). Então o mapa muda e aparecem mil
possibilidades trocando a TV polo computador/Internet de onde se podem obter as
mesmas sérias que oferece a TV espanhola. Se o uso do audiovisual é feito desde
o princípio em galego internacional, a Doutora Brinquedos ou Dora, a
aventureira falam galego.
De facto, falam. No capítulo Peixe fora d´água, da versão brasileira
de Dora, a aventureira, a nossa criança vai ouvir encher, buracos, balde, rocha vermelha, caranguejo, polvo, tartarugas,
golfinhos. Na versão que nos oferece o sistema cultural espanhol vai ouvir llenar, agujeros, cubo, roca roja, cangrejo,
pulpo, tortugas, delfines. Cada escolha implica uma forma diferente de
estar no mundo. Onde queremos estar? Onde queremos que estejam os nossos
filhos? Valentim Fagim – Galiza in “Portal
Galego da Língua”
Valentim
Fagim - Nasceu em Vigo (1971). Professor de Escola Oficial de
Idiomas, licenciado em Filologia Galego-portuguesa pola Universidade de
Santiago de Compostela e diplomado em História. Trabalhou e trabalha em
diversos âmbitos para a divulgaçom do ideário reintegracionista, nomeadamente
através de artigos em diversas publicações, livros como O Galego (im)possível,
Do Ñ para o NH (2009) ou O galego é uma oportunidade (2012). Realizou trabalho
associativo na AR Bonaval, Assembleia da Língua de Compostela, no local social
A Esmorga e na AGAL, onde foi presidente (2009-12) e vice-presidente (2012-15).
Co-diretor da Através Editora e coordenador da área de formação. Académico da
AGLP.
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