Como já vimos informando
nesta nossa secção, a guerra encoberta entre Emergentes e o Império Ocidental
pela hegemonia global do orbe virou já realidade palpável.
Dois são os modelos
económicos em concorrência: o Ocidental, nascido da teoria neoliberal,
representada nomeadamente pela escola de Chicago e virando a Neo-Feudalismo das
finanças (novo modelo de organização económica, baseado na dívida perpétua e no
usufruto da renda permanente) e o Capitalismo de Estado (nas suas diversas
formas e facetas), diferentemente ensaiado pela China e a Rússia (rivais
primordiais do Ocidente pelo controlo planetário). Três pela sua vez são as
visões geopolíticas destes principais atores: a Atlântica talassocrata típica
do Império Ocidental, a Euroasiática telurocrata própria do pensamento russo e
a ainda por vislumbrar visão de centralidade desde o Pacifico Oriental, que a
China parece representar e joga a insinuar (mas cujas intenções são, ainda, uma
incógnita).
Os últimos acontecimentos em
pleno desenvolvimento tanto no Oriente Médio como na América Latina e no Norte
e Centro da África devem ser analisados baixo este novo prisma. A batalha do
Império Ocidental pelo controlo unilateral do planeta choca com as forçadas
iniciativas BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) de compromisso
multilateral no exercício pleno da governança global.
Para manter a supremacia
unilateral, Ocidente precisa deslocar do primeiro posto do pódio económico a
China. Para isso é necessário controlar, domesticar ou dominar a Rússia (só é
preciso deitar uma olhada a um mapa do mundo, para compreender este argumento).
Rússia, única potencia militar com capacidade de se enfrentar ao poderio global
da OTAN. A sua vez para comandar cumpre assegurar a supremacia
cientifico-tecnológica, bem como energética (monopolizando as fontes, a rede de
distribuição e os corredores estratégicos por onde esta decorre). As guerras no
Oriente Médio têm muito a ver com isto. Exercer o policiamento completo do orbe
garante, à sua vez, o controlo do transito marítimo, aéreo e terrestre – tanto
das mercadorias como da própria energia.
Por outro lado, é fácil
compreender que iniciativas de emancipação regional, como a de Brasil, em
coordenação com seus vizinhos (e suas tentativas para criar uma independência
real, política e económica, do continente Sul Americano) ou de afirmação no
plano internacional, como a de alguns países do Sul da África (e mesmo
iniciativas de obter uma maior visibilidade, em zonas de grande dificuldade,
como no caso do Irão) só podem ou puderam materializar-se graças ao poder
económico da China e à capacidade de dissuasão militar da Rússia.
Até o de agora (e depois de
vencer a URSS na guerra fria), Ocidente podia mover os fios na sombra, criando
equilíbrios e desequilíbrios globais ou regionais quase sem contestação
equivalente. Mesmo depois da ascensão da China e a criação dos BRICS, a
possibilidade Ocidental de confrontar e inimizar os diferentes países do grupo,
graças a aproveitar habilidosamente as diferentes visões e interesses
divergentes dos mesmos, era relativamente fácil.
A Índia transformou-se num
dos grandes aliados do Ocidente em contraposição ao poder chinês. Mas, agora, a
confluência de necessidades motivou uma unidade mais estreita baseada em
complementos mútuos. Algo que se tornou uma ameaça direta ao domínio hegemónico
dos EUA, como por exemplo a criação dum Banco de Financiamento próprio que
libere o bloco emergente do anel de poder exercido pelo FMI e o Banco Mundial
(organismos internacionais que funcionam, na prática, em defesa das estruturas
de dominação e dos interesses económicos das elites ocidentais). Ocidente sabe
que precisa agora já quebrar essas confluências, ou tal como expressam todos os
estudos e previsões para um futuro próximo, num par de décadas será
ultrapassado económica e militarmente, até desafiado no nível
científico-tecnológico pelas novas potências. Isto relegaria a um segundo plano
o poder de um império construído em séculos, deitando ao esquecimento toda
narrativa da epopeia europeia iniciada as finais do século XV, princípios do
XVI.
Por outro lado não podemos
deixar de sublinhar que ainda que o Império Ocidental logre ultrapassar as
dificuldades em curso, a sua decadência torna-se inevitável e palpável, mesmo
desde faz já alguma década (como bem demostrou Erich Fromm no seu maravilhoso
livro “Ter ou Ser”). Ao optar pela continuidade e aprofundamento da
materialidade, em vez de optar pela realização do individuo (o Ser), Ocidente
escolheu o caminho da decadência. Culturalmente, já tocou teto e não pode
achegar à humanidade nada de inovador, com capacidade real para puxar do novo
paradigma que agora está agromar dentro do novo pensamento dissidente (e por causa
do domínio científico-tecnológico, curiosamente esse pensamento tomou corpo
também no Ocidente).
Resulta inevitável, pois, um
deslocamento hegemónico que provavelmente se produzirá ao longo de todo este
iniciado século. A visão russa e chinesa também se torna obsoleta de não mudar
radicalmente a cosmovisão de Estado omnipresente devorador das energias
humanas. Para levar para a frente este novo paradigma (que se está a consolidar
através de um curioso reencontro entre ciência e espiritualidade, e que muito
bem poderíamos denominar de “paradigma da confraternização”), será preciso um
novo polo dinamizador em que cristalize e tome forma este novo paradigma,
dentro do qual o caminho da guerra e a visão de errada (de confronto e
concorrência), dela nascida, parece não ter já um bom acomodo.
Outros apontamentos (dada a
crise surgida no Oriente Próximo e, calculando que este desarranjo talvez não
possa ser solucionado em decénios, isso se não evolui a uma guerra regional
mais ampla e com perigo de implicações perigosas para toda a humanidade),
levam-nos a sugerir que os países membros da CPLP irão aos poucos, nos próximos
anos, ocupar certo lugar de destaque devido às suas reservas energéticas, à sua
posição geográfica estratégica e à sua capacidade de criar riqueza. Isso está a
acrescentar os chamados de muitas nações para serem novos membros desta
organização (na qual à Galiza corresponder-lhe-á um lugar de observador
importante por motivos óbvios, cuja analise está fora deste artigo).
Olhando este panorama, fica
muito às claras que um deslocamento hegemónico em face do Pacifico, muito
favorável para a China, seria um desastre para Europa (ficaria como periferia)
e pelo tanto para a Galiza. Uma translação do centro para Euro-Ásia, com
benefícios centrais para a Rússia, poderia ter mesmo um bom acomodo para a
Alemanha, mas para a Europa atlântica significaria como mínimo um retrocesso
lamentável: a Galiza sofreria extremamente com esse cenário. Uma deslocação
lenta, harmoniosa e bem estruturada do Atlântico Norte ao Atlântico Sul parece
ser a melhor das soluções para a Europa no seu conjunto e, em particular, para
a Península Ibérica, a qual mais apropriadamente deveríamos chamar a partir de
agora Península Celtibérica.
A Galiza pode fazer um
excelente trabalho nessa direção, começando pela criação de redes e alianças
diversas em todos os campos do conhecimento, a economia, a cultura e os
desportos com o universo que lhe é próprio: a Lusofonia.
O reintegracionismo foi o
grande iniciador, promotor e projetor desta rota, que se outros não trilharem,
em breve arriscaram sua própria sobrevivência. A língua galega terá de passar
por um reconhecimento privado e institucional de ser uma variante mais do
tronco comum lusófono, em pé de igualdade com as outras variantes dialetais, as
suas irmãs de fala. Para isso cumpre, com o tempo, mudar a errada aposta
ortográfica que atrapalha a evolução linguística ao colocar no galego a grafia
alheia castelhana.
Reste lembrar que dentre os
países em emergência, os países lusófonos ocupam 50% do bolo dos novos
descobrimentos energéticos em hidrocarbonetos (que em breve representarão 30%
do total de reservas do planeta, cifra muito similar à que hoje possuem os
países do Golfo Pérsico, em óbvio declínio). Tem este espaço cultural inúmeras
possibilidades e potencialidades além do mercado das matérias primas, e a
Galiza pode fornecer parcerias de muito interesse no referente ao mundo
inovador das novas tecnologias, ciência e empreendimentos culturais.
O reintegracionismo deve,
pois, virar os seus esforços para facilitar possíveis ligações tanto do âmbito
privado como público (na medida das suas possibilidades), assim como no fomento
e promoção da opção linguística que lhe é própria. E achamos está a fazer muito
bem as suas tarefas, com forças cativas, mas cada vez maiores e melhor
organizadas. O futuro da Galiza passa por aí, só resta que a sociedade no seu
completo rume aos poucos para aceitar e propagar no seu seio esta visão
pacífica. Mas isso é algo que já ultrapassa o nosso esforço: só poderemos
continuar a trabalhar e aguardar o bom sucesso: a recolha do trabalho bem
realizado, sem perder os ânimos e fôlego. Artur
Novelhe – Galiza in “CARTAS MEXICAS – Portal Galego da
Língua”
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Artur
Alonso Novelhe - Galego, mas nascido no México, é diplomado
pela Escola Pericial de Comércio de Ourense. Exerce como funcionário do Serviço
Galego de Saúde do Governo da Galiza. Publicou várias obras de poesia e
colabora habitualmente com diferentes publicações, entre as quais o PGL. É
sócio da Associaçom Galega da Língua (AGAL) desde os meados dos anos 80 e
académico da AGLP.
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