Numha sucessom sem fim de
polémicas sobrepostas entre defensores do espanhol, do galego e todo um
espectro entre ambas as posiçons, o passar do tempo tem vindo a assentar nos
últimos anos um novo senso comum em volta da questom lingüística galega,
determinado sobretodo pola própria materialidade histórica do processo.
Há três décadas, quando
principiava a minha militáncia pola língua, existia umha crença que, já na
altura, tinha escassa correspondência com a realidade. Muitas pessoas
costumavam afirmar que o galego “estava na moda” e mesmo que cada vez se falava
mais.
Lembro também que, naqueles
anos, o nacionalismo galego parecia acreditar no caráter eterno ou atemporal da
condiçom maioritária do galego na nossa sociedade. Eram séculos a certificar
aquela crença e faltava só, dizia-se, contarmos com um governo nacionalista que
reconhecesse ao galego o papel que lhe correspondia, ultrapassando assi o que
em tom sentencioso se carimbava como “situaçom de diglossia”.
Também naqueles anos, a
ideologia isolacionista gozava de bastantes adeptos entre os sectores mais
favoráveis à língua, seguramente por vender um produto ancorado em variedades
dialetais e noutra crença: a de que pretendia representar o “galego vivo”.
Quanto ao herético
reintegracionismo, era condenado como inimigo da normalizaçom, tanto polo
espanholismo como por boa parte das elites culturais galegas.
Acho que, com a perspetiva que
dam os anos transcorridos, já podemos dizer que o senso comum histórico tem
mudado, acompanhando umha transformaçom de fundo que reduziu o galego à mínima
expressom quantitativa (falantes) e sem grandes avanços no aspeto qualitativo
(consideraçom e utilidade).
Para já, hoje fica difícil
basear a defesa do galego no seu objetivo caráter maioritário. A deserçom
massiva do nosso povo, nada espontánea e ainda em marcha, é um facto. O
processo de transculturaçom tem hoje expressons muito claras nas mais diversas
áreas da reproduçom social, incluída a língua.
O escassíssimo alcance de
medidas governativas de apoio a umha língua funcionalmente mutilada, num país
sem soberania e atrelado a umha corrente cultural da potência que a espanhola
tem ficou também em evidência. A ingenuidade da identificaçom entre “governo
nacionalista” e “normalizaçom lingüística” numha sociedade em processo de
avançada desnacionalizaçom é reconhecida já até polos nacionalistas galegos
mais “possibilistas”.
Quanto à “ameaça lusista” a
que as autoridades académicas apelavam para defender a sua posiçom de poder na
autonomia galega, ficou também totalmente diluída à medida que a parcela de
poder a conservar por aquelas elites isolacionistas ia minguando, devido à
reduçom do papel do galego como “arma política”.
Entretanto, umha parte do
movimento reintegracionista fai esforços nos últimos anos para obter algum
reconhecimento por parte do “poder lingüístico”. Conformando-se com a difusom
do português como segunda língua, garante que nom irá contestar a “devida”
hegemonia do espanhol e, para aliciar esse poder, larga lastro identitário e
evita qualquer compromisso com a reivindicaçom soberanista em termos
lingüísticos, culturais e políticos.
Assi sendo, e recorrendo ao
tópico, pode-se afirmar que estamos hoje numha situaçom “de impasse”, em que a
condena da heresia lusista ficou démodé e a prática totalidade da
intelectualidade autonómica assume um discurso inócuo de diálogo com o “português-língua-estrangeira-mais-próxima”.
Nesse novo senso comum que
está a estender-se, a proposta é de convívio entre o galego “normativo”
(isolacionista) e aquilo que umha parte do reintegracionismo batizou como
“galego internacional”, em referência ao português, entendido como complemento
do galego e evitando atritos com o domínio do espanhol.
Um reintegracionismo
despossuído do seu potencial na construçom nacional mostra-se disponível para
desproblematizar o conflito lingüístico, assumindo a posiçom subsidiária do
galego e reduzindo as reivindicaçons lingüísticas a um diálogo “bem entendido”
entre a Galiza e Portugal, com a devida bençom oficial.
Seguramente nom seria justo
responsabilizar esse reintegracionismo do “New Deal” polo novo senso comum em
que estamos a instalar-nos. As limitaçons de um movimento patriótico que
pudesse propor e praticar a soberania galega para além das palavras abriu
espaço para visons relativistas que tentam “salvar os móveis” num processo
histórico desnacionalizador como o que vivemos.
Tampouco vale a pena discutir
se era isso que a corrente histórica reintegracionista pretendia, pois ela foi
sempre um magma que arrastou visons muito diversas do que a Galiza deveria
aspirar a ser em termos de política lingüística e de país.
Entendida nesses termos, a
contraditória linha atual do “magma reintegracionista” nom deixa de refletir a
real correlaçom de forças que o configuram como movimento social, num processo
que, apesar da difícil situaçom que como país atravessamos, nom concluiu. Maurício Castro – Galiza in “Associaçom
de Estudos Galegos”
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