I
À época em que era escrita
apenas para a publicação em jornal diário, a crônica tinha caducidade precoce.
Talvez por isso o gênero tenha sido sempre visto como pouco merecedor de
tratamento crítico, o que nunca o impediu de ser cultivado no Brasil desde o
século XIX por escritores eminentes como José de Alencar (1829-1877) e Machado
de Assis (1839-1908), passando por sua fase de ouro com João do Rio (1881-1921)
e Rubem Braga (1913-1990), que seriam seguidos por mestres do quilate de Carlos
Drummond de Andrade (1902-1987), Fernando Sabino (1923-2004), Paulo Mendes
Campos (1922-1991), Henrique Pongetti (1898-1979), Luis Martins (1907-1981), Lourenço
Diaféria (1933-2008), Raquel de Queiroz (1910-2003) e outros tantos.
Agora, em época de Internet,
essa caducidade já não é tão precoce, mas o gênero igualmente precisa do papel
impresso para ganhar perenidade e talvez a pretensa eternidade dos arquivos e
bibliotecas públicas, que o preservariam do esquecimento. Além disso, a
crônica, espécie de conversa à beira do fogo ou debaixo da árvore, é ainda a
melhor maneira de se dizer de maneira simples verdades que ditas de forma mais
pomposa ou solene talvez não conquistassem tantos corações e mentes.
Foi o que “descobriu” Rivaldo
Chinem (1952), experiente jornalista formado nas redações das principais
publicações do País e hoje consultor da área empresarial, ao escrever, em
formato de crônica, textos dirigidos ao mundo corporativo. Inicialmente
destinadas a sua coluna num site da Internet, estas crônicas ganham agora a
edição impressa com o livro 101 reflexões
para evitar que sua empresa entre crise (São Paulo, Editora Ideias e
Letras, 2016), que coloca em debate uma série de temas comuns no dia a dia das
empresas. “São provocações relacionadas ao vastíssimo universo da comunicação,
resultado de suas andanças, conhecimentos, conversas, entrevistas e observações
do mundo”, diz o jornalista, comunicador e escritor Luiz Márcio Ribeiro Caldas
Junior, autor do prefácio.
II
Bem lidas por empresários ou
executivos de baixo ou alto escalão em suas horas de descanso, estas reflexões,
por certo, ajudarão os leitores a colocarem em prática no dia seguinte algumas providências
que podem mudar o rumo de suas empresas nestes dias de angústia provocada por
uma crise político-financeira originada da insensibilidade daqueles que
deveriam bem cuidar dos destinos da Nação. Seus temas são atuais, variados e
constantemente discutidos em locais de trabalho e nascem da leitura de jornais,
sites, redes sociais ou mesmo de livros recém-lançados. São todos, porém,
vistos sob a luz da comunicação, sejam de fundo científico, econômico,
literário ou ainda notícias a respeito de figuras notórias na vida nacional. Em
cada crônica, o consultor/cronista nunca deixa de reservar as últimas linhas
para uma reflexão sobre o caso abordado, aplicando-o à rotina da empresa e do
andamento dos negócios.
Em “Bioética em questão”, por
exemplo, Chinem discute a afirmação do psicólogo norte-americano Howard
Gardner, criador da Teoria das Inteligências Múltiplas, segundo a qual a ética
neste século XXI vai valer mais que o conhecimento. E o que isso pode
significar na vida das empresas, ou seja, cada vez mais o empresário e os
gestores de empresas deverão estar atentos a questões morais, condutas e
políticas. Tal como hoje no campo da bioética já não é admissível experimentos
médicos sem o consentimento das pessoas ou que idosos sejam obrigados a tomar medicamentos
contra à própria vontade, nas empresas é preciso vigilância para que nenhum
funcionário seja constrangido por superiores hierárquicos. Um caso de assédio
sexual, por exemplo, pode colocar em xeque a imagem de uma empresa, jogando por
terra anos de trabalho sério.
Mais adiante, na crônica
“Jornais empresariais”, Chinem resenha o livro Jornalismo organizacional – produção e percepção (São Paulo, Summus
Editorial, 2011), da professora Marlene Branca Sólio, para concordar com a
autora que, em geral, os jornais empresariais são pobres em pautas e que lhes
falta qualidade na produção de textos. E que tudo isso resulta da ingerência de
leigos em jornalismo que se sentem com autoridade para cortar, rabiscar ou
vetar textos mais apurados, em nome de interesses mesquinhos ou a pretexto de
não promover possíveis concorrentes. Em consequência, o que se vê são jornais
corporativos com textos mal escritos, repetitivos, bajuladores, cheios de erros
de gramática, “o que desmotiva o leitor”, diz Chinem.
Em outro texto, “Os press releases”, Chinem cita pesquisa
que envolveu quase 500 profissionais de imprensa do Brasil, Estados Unidos e
Europa e apontou que a primeira fonte dos jornalistas ainda são os press releases das assessorias de
comunicação. No Brasil, onde foram ouvidos 84 profissionais, 62% recorrem às
assessorias de imprensa e 59% aos porta-vozes das empresas. Para checagem,
66,6% recorrem ao Twitter, 59,3% ao Facebook e 57,1% aos blogues. No País,
32,1% dos repórteres usam o press release
como primeira fonte, seguido dos sites com 16,6% e os porta-vozes com 14,2%. É
de se observar que, no tempo em que Chinem dava seus primeiros passos na
imprensa, todo bom profissional tinha uma caderneta, geralmente sebenta, com os
telefones de suas fontes e não passava a maior parte do tempo na redação, mas atrás
de notícias na rua, que era o lugar de todo bom repórter.
O livro termina com uma
crônica, “Voz da razão”, que pode ser lida como uma homenagem aos 80 anos de
Alberto Dines, em que esse mestre de todos nós lembra que há centenas de
jornalistas com 65 ou 70 anos sem espaço nas redações porque empresários botaram
na cabeça que o profissional, chegando aos 60, está na hora de ser cortado.
“Eles inventaram esse raciocínio de que o novo custa menos. Não, o novo custa
mais, porque faz coisas ruins, vai levar tempo para aprender e acaba
prejudicando os outros”, ensina Dines.
Por estes exemplos, o leitor
pode ter uma ideia do que o espera ao ler este livro que tem como pano de fundo
o fascinante mundo da comunicação.
III
Rivaldo Chinem, jornalista e
consultor na área de comunicação empresarial, formado em 1974 pela Faculdade de
Artes e Comunicação Social (Facos) da Universidade Católica de Santos
(Unisantos), começou a trabalhar como repórter no extinto diário Cidade de Santos em 1972 e, depois, foi
para a Agência Folha, Folha de S. Paulo,
O Estado de S. Paulo e revista Veja. Dirigiu o jornalismo da TV Gazeta
e da Rádio Tupi, em São Paulo. Foi ainda um dos jornalistas que enfrentaram a
ditadura militar (1964-1985) colaborando com a imprensa alternativa, tendo
passado pelas redações de Repórter, Versus, Opinião, Movimento e de O São Paulo, então combativo jornal da
Cúria Metropolitana de São Paulo, que tinha à frente o cardeal Dom Paulo
Evaristo Arns.
Apresentou o programa Imprensa e Comunicação em Debate na
Rádio Bandeirantes. Foi articulista da Agência Estado com a coluna Leitura do Empresário, do site
Topnegócios, do portal Terra, com a coluna Marketing
Empresarial, e do portal Megabrasil, com a coluna O dia a dia das assessorias de comunicação, que mantém até hoje.
Prestou assessoria de
imprensa para empresas multinacionais, associações de classe, empresários,
políticos em São Paulo e em Brasília, governo e embaixada. Foi assessor de
imprensa do ex-presidente Jânio Quadros (1917-1992). Ganhou o Prêmio Wladimir
Herzog de Reportagem, instituído pela Federação Nacional dos Jornalistas
(Fenaj). Deu cursos no Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae),
Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil (ADVB), Associação
Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje), Pontifícia Universidade
Católica (PUC), de São Paulo, e Universidade de São Paulo (USP).
Publicou os livros Terror policial (São Paulo, Editora
Global, 1980), em co-autoria com o jornalista Tim Lopes (1950-2002), Sentença: padres e posseiros do Araguaia
(Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1983), Imprensa
alternativa – jornais de oposição e inovação (São Paulo, Editora Ática,
1995), Assessoria de imprensa – como
fazer (São Paulo, Summus, 2003), Jornalismo
de guerrilha – a imprensa alternativa brasileira da censura à Internet (São
Paulo, Editora Disal, 2004), Comunicação
empresarial – teoria e o dia a dia das assessorias de comunicação (Vinhedo,
Editora Horizonte, 2006), Marketing e
divulgação da pequena empresa (São Paulo, Editora Senac, 2009), Introdução à comunicação empresarial
(São Paulo, Editora Saraiva, 2010); Comunicação
corporativa (São Paulo, Editora Escala, 2011); e Comunicação empresarial: uma nova visão da empresa moderna (São
Paulo, Discovery Publicações, 2012). Adelto
Gonçalves - Brasil
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101 reflexões para
evitar que sua empresa entre em crise, de Rivaldo Chinem.
São Paulo: Editora Ideias & Letras, 117 págs., R$ 20,90, 2016. Site: www.ideiaseletras.com.br
E-mail:
vendas@ideiaseletras.com.br
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Adelto Gonçalves, jornalista, é doutor em Literatura Portuguesa
pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de Os vira-latas da madrugada (Rio de Janeiro, José Olympio Editora,
1981; Taubaté, Letra Selvagem, 2015), Gonzaga,
um poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona brasileira (Lisboa, Nova
Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002), Bocage – o perfil perdido (Lisboa, Caminho, 2003), Tomás Antônio Gonzaga (Academia
Brasileira de Letras/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2012), e Direito e Justiça em terras d´El-Rei na São
Paulo colonial (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2015), entre
outros. E-mail: marilizadelto@uol.com.br
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