SÃO PAULO – Uma máxima do pensamento
brasileiro diz que o Brasil cresce de noite, enquanto os políticos dormem. É
possível que muitos estejam dormindo também durante o período diurno porque o
País tem crescido em vários segmentos, embora os índices desse crescimento
apareçam igualmente de forma negativa, como na questão da violência social,
cujos números superam os de países em guerra civil.
A que vêm estas reflexões? Vêm a
propósito de um dado que não pode passar despercebido. E que, de certa maneira,
assemelha-se à boutade com que se
abriu este artigo: apesar de todo o empenho dos últimos governos para baixar o
volume de comércio com os Estados Unidos, a pretexto de diminuir uma possível
dependência econômica e política, a nação norte-americana constituiu no
primeiro semestre o maior mercado importador de produtos manufaturados
brasileiros, superando a Argentina. Além disso, os Estados Unidos são também o
maior cliente do agronegócio brasileiro.
Doze anos passados depois que essa
visão terceiromundista tomou corpo em Brasília, a estratégia de diminuir a
dependência em relação aos Estados Unidos com a abertura de outros mercados,
especialmente na África, Ásia e Oriente Médio, mostrou-se inócua. Hoje, por
exemplo, o mercado africano representa apenas 4% do total das exportações
brasileiras, segundo a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
Apesar da retórica governamental, uma
estratégia nunca excluiu a outra, pois o Brasil poderia ter continuado a vender
cada vez mais para os Estados Unidos, sem deixar de ampliar sua participação no
mercado mundial, tivesse sua diplomacia buscado outros tratados e acordos de
preferências tarifárias. Como preferiu ficar limitado ao Mercosul e apostou
cegamente na Rodada Doha, da Organização Mundial do Comércio (OMC), que prevê a
liberalização tarifária entre seus países-membros, o Brasil acabou por se
isolar, a ponto de correr o risco de fechar 2014 no negativo.
Sem alternativas para o Mercosul, o
País hoje sofre com a redução de negócios com a Argentina: em 2014, as vendas
para o país vizinho responderam por 77% da queda da exportação brasileira,
segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
(Mdic). Para piorar, nem as commodities
deverão ajudar a reverter o baixo desempenho. Afinal, o preço do minério de
ferro está cada vez mais baixo. E tanto o preço da soja como o do milho estão
em queda.
É de se ressaltar que a soja e o milho
são também os principais produtos da pauta de exportação argentina, o que
significa que a receita das vendas externas do país vizinho deverá cair,
prejudicando assim as exportações brasileiras para aquele mercado. Por fim, não
se pode esperar muito do petróleo em bruto, já que para 2015 a previsão é de um
crescimento de apenas 10% na quantidade de vendas.
Em outras palavras: talvez seja o caso
de o governo brasileiro fazer vistas grossas para o episódio de espionagem
norte-americana sobre suas ações e retribuir os acenos de reaproximação que
Washington tem feito para Brasília. Em questão de negócios, como bem sabem os
asiáticos, o pragmatismo sempre foi a melhor política. Milton Lourenço - Brasil
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Milton Lourenço é presidente da Fiorde
Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos,
Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da
Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística
(ACTC). E-mail: fiorde@fiorde.com.br. Site: www.fiorde.com.br.
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