Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Galiza - Vigência do projeto AGAL

«Creio no galego e no português mas nom acredito em qualquer híbrido entre ambos», sentenciava em conversa privada um eminente representante da cultura galega a propósito da minha tese de doutoramento. A tese, defendida na Faculdade de Económicas da USC, trata sobre a banca compostelana dos Pérez e foi redigida e defendida em norma AGAL por simples lealdade ao idioma nativo do autor. Optei por esta norma nom sem antes ponderar a possibilidade da versom em português padrom, mais adequado decerto para um trabalho que visa o acesso à comunidade académica sem fronteiras. Prevaleceu a lealdade e a convicçom da plena aptidom do galego para qualquer uso e circunstáncia.

A opiniom do meu interlocutor, bem instalado na norma galega habitual e apreciador do português, pouco diferirá da que um pode esperar de qualquer conspícuo partidário do “português da Galiza”: “nom brinquem com o idioma –quer seja galego consagrado, quer português padrom–, fora da norma todo é artifício vao”.

A opçom pola norma AGAL comporta, ademais – será bom deixar constáncia –, um esforço suplementar que um pode aforrar se optar polo português padrom. Contamos em tal caso com excelentes instrumentos auxiliares, magníficos dicionários disponíveis e um competente corretor lingüístico que facilita grandemente o fluxo da escrita a pouco que um conheça o idioma. Por quê entom empenhar-se em contrariar nada menos que duas doutas academias a nobilitada com a dignidade real e a empenhada à proclamaçom do “português da Galiza”?

No que a mim respeita, a resposta afinca na convicçom de a Galiza ser um sujeito histórico singular dotado de língua própria com atributos de naçom. Haverá quem sustenha que tal categoria é mera ilusom, mas talvez poda reconhecer que também é a hipótese de nom existirem sociedades senom apenas átomos individuais desvinculados. Numha perspetiva nacionalitária, nem o caráter descaradamente regionalista do galego em vigor simples apêndice pitoresco do castelhano nem o esplendor internacional do idioma português honram como merece a secular história do galego e a exigência política de reagir contra a sua degradaçom e perigo de assimilaçom polo espanhol. Por desídia servil no primeiro caso, por abandono do inescusável confronto com a realidade do idioma vivo no segundo.

A agenda tradicional da AGAL consistiu desde sempre na reabilitaçom do idioma menosprezado perante o espelho do português em funçom de língua teito. A superaçom do isolamento regionalista que abafa o galego requer como precondiçom nom cairmos no abandono do inevitável confronto com a degradaçom e a reabilitaçom do idioma. Sob esta perspetiva, o refúgio no «português da Galiza» parece umha saída errada da imprescindível tarefa pendente. O modelo AGAL promete recuperar o coraçom do galego, operaçom incompatível com um transplante de coração com previsível resultado de rechaço.

O stablishment político, económico e mediático felizmente imperante garante e usufrui a tese implícita de o galego ser um apêndice do castelhano. A proclamaçom do «português da Galiza» em substituiçom do galego vivo parece acreditar numha conceçom do galego como fruto prematuro e gorado do idioma português. Hipótese atrevida que trai à memória a afirmaçom do Marx mais teleológico de que «a anatomia do homem explica a do símio».

A procura dum novo consenso para dignificar o idioma é a tarefa certa e inevitável e o seu destinatário o conjunto da sociedade galega sem exclusons. O idioma é o mais alto monumento que tenhamos produzido, património coletivo como as Fragas do Eume, as Ilhas Atlánticas ou o Pórtico da Glória. O momento é propício para relançar a proposta da AGAL; basta como observar a esperançosa movimentaçom social emergente a prol de umha Galiza sem inúteis tutelas como no crescente ativismo em prol de um grupo parlamentar próprio nas Cortes espanholas.

A tarefa de reabilitaçom do idioma é difícil mas nom ilusória. Nom estará de mais lembrar que Catalunya grafa com o seu dígrafo identificativo “ny” apenas desde o ano 1913, e que o euskara batua é um formato de recentemente construçom como som os dígrafo “tx, ts, tz”. Nada a ver com a magnitude demográfica e opulência secular da nossa língua teito, o português padrom. A norma AGAL está construída com material de excelente qualidade e irreprochável rigor filológico, apenas falta a cumplicidade do poder político, mas isso tem remédio e a isso estamos.

No próximo 24 de outubro de 2015 está convocada Assembleia Extraordinária para a renovaçom do Conselho da AGAL. Seria bom que o novo Conselho procedesse a revalidar a agenda fundacional da Associaçom mediante os instrumentos que o próprio movimento foi criando: infantários monolingües, ediçom de livros, recuperaçom de neofalantes, clubes de leitura, intervençom freqüente de sócios e simpatizantes em redes sociais e debates. Tornar normal o ativismo em volta do idioma – que é património quase exclusivo hoje do movimento reintegracionista – é o eixo da agenda.

A bússola do ativismo linguístico nom aponta hoje para gramáticas e prontuários, senom para a prática acrescentada do idioma reabilitado através das redes sociais e a difusom de textos cuidados de toda índole, da crónica ao ensaio, do artigo à tese doutoral. A freqüentaçom da literatura portuguesa é o melhor guia para configurar um galego literário, limpo e reconhecível. Um galego renovado que prenuncia e acompanha a emergência dessa Galiza reconciliada consigo mesma que tenta de novo afirmar-se. Lopes Facal – Galiza in “Portal Galego da Língua”



Joám Lopes Facal - Nascim e vivim na aldeia até os quinze anos, Toba, ao pé da ria de Corcubiom, frente ao Pindo. Figem-me economista despois de engenheiro e aí desenvolvim a minha atividade profissional até o momento de me reformar. A economia é ademais um vício particular: ler atentamente e tentar compreender a informaçom económica cotidiana, ter sempre sobre a mesa um livro de economia.

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