Não, ao olhar para o céu, por
mais limpo que esteja, não conseguimos detectar as rápidas explosões de luz de
que vamos falar. Foi preciso usar muitos telescópios ligados entre si para
descobrir de que sítio vêm do Universo. Nas revistas Nature e The Astrophysical
Journal Letters, uma equipa internacional de cientistas revela agora que
estas explosões de luz na frequência de rádio tiveram origem fora da nossa
galáxia (a Via Láctea), mais exactamente numa galáxia anã muito longe de nós, a
3000 milhões de anos-luz de distância.
Decorria 2007 quando o
radiotelescópio Parkes, na Austrália, detectou umas misteriosas explosões de
rádio. Este fenómeno veio a ser designado por “explosões de rádio rápidas
121102”. E, em Novembro de 2012, detectou-se o primeiro e único conjunto
consecutivo de explosões, na constelação de Auriga, com o radiotelescópio de
Arecibo, em Porto Rico.
Mas permanecia a questão: de
onde vinham afinal estas explosões, que duravam fracções de segundo mas eram
muito energéticas? Sabemos agora que vieram de uma velha galáxia anã a mais de
3000 milhões de anos-luz da Terra. Fazendo contas, o Universo surgiu há 13.800
milhões de anos e a luz destas explosões levou 3000 milhões de anos a chegar
até nós. O que significa que o Universo tinha então 10.800 milhões de anos desde
o Big Bang – nessa altura, estavam a surgir no nosso planeta as primeiras
células.
Para identificar a localização
destas explosões foi preciso realizar observações em radiotelescópios de
grandes dimensões, ao longo de 83 horas, distribuídas por seis meses em 2016.
Primeiro, o radiotelescópio Very Large Array (VLA), no Novo México, nos EUA,
detectou nove explosões de rádio isoladas.
Estas observações permitiram
determinar a localização no céu das explosões e, em seguida, os cientistas
apontaram para aí o telescópio Gemini Norte, no Havai, para obter uma imagem da
luz visível (aquela que os nossos olhos vêem) do que se encontrava nessa região
– e foi assim que identificaram uma galáxia anã muito ténue.
Depois, a equipa usou vários
radiotelescópios espalhados pela Europa, Ásia, África do Sul, Estados Unidos e
Austrália, ligados pela técnica da interferometria. Através destas redes de
radiotelescópios os cientistas conseguiram localizar, por fim, a posição das
explosões de rádio com uma precisão cerca de dez vezes superior à das
observações anteriores. “Com este nível de precisão, obtivemos provas fortes de
que a origem das explosões está fisicamente relacionada com uma fonte
persistente de emissões de rádio”, afirma Benito Marcote, um dos autores da
descoberta, em comunicado da Faculdade para Investigação da Astronomia da
Holanda.
Até agora, descobriram-se 18
explosões de rádio rápidas. Caracterizam-se por serem altamente energéticas,
mas têm uma duração extremamente curta, de um a cinco milissegundos.
Esperava-se que viessem de grandes galáxias, tanto com grande número de
estrelas como de estrelas de neutrões (os restos mortais de estrelas maciças
que explodem como supernovas e ejectam materiais para o cosmos).
Contudo, a galáxia anã onde
ocorreram as explosões de rádio rápidas tem apenas 1% da massa da Via Láctea e
poucas estrelas. Além disso, as suas estrelas nascem e morrem a grande
velocidade, o que sugere que as explosões de rádio rápidas provêm de estrelas
neutrões jovens.
Mas qual será a origem destas
explosões? Podem ter sido estrelas de neutrões extremamente magnéticas (ou
magneto-estrelas). Ou um buraco negro supermaciço activo no centro da galáxia,
com emissões de rádio nas suas redondezas. E existem ainda outras hipóteses:
explosões de longa duração de raios gama; e supernovas superluminosas, que
ocorrem frequentemente em galáxias anãs.
“Há ainda muito trabalho até
se desvendarem os contornos misteriosos das explosões de rádio rápidas”, diz a
física Victoria Kaspi, também autora do estudo e da Universidade de Montreal,
do Canadá. “Mas ter identificado a galáxia em que se localizam estas explosões
já é um grande passo para resolver o puzzle.”
No comentário ao artigo
científico publicado também na Nature,
Heino Falcke (do Instituto para a Matemática, Astrofísica e Física de
Partículas, da Universidade de Nijmegen, na Holanda) escreve que estas
explosões são “espectacularmente diferentes” porque vêm de um Universo muito
distante. “As explosões de rádio rápidas são os sinais de rádio mais distantes
de que temos conhecimento no Universo”, sublinha. “Foi uma surpresa, quando,
quase uma década depois [em 2016], flashes
de rádio aparentemente isolados foram descobertos com uma duração de poucos
milissegundos.”
Mas este é apenas um começo na
investigação das explosões de rádio rápidas no Universo. Continuarão a ser
estudadas com telescópios capazes de ver na banda dos raios gama, dos raios X
ou na luz visível, salienta a equipa. Para já, Laura Spitler, do Instituto Max
Planck para a Radioastronomia, na Alemanha, dá um exemplo do que se pode
desvendar: “Se conseguirmos encontrar uma periodicidade para a chegada das
explosões, então teremos provas fortes de que são originadas pela rotação de
estrelas de neutrões.” Teresa Serafim –
Portugal in "Jornal
Público"
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