Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Galiza - A peneirar ideias, a debulhar grafias

Hoje decido que não quero que a minha língua seja um tição cinzento que esmorece numa noite de inverno, senão uma chama que medra

Chegou o dia de apanhar a fouce e começar a roçar o caminho de silveiras por onde hoje decido avançar, depois de três anos a morar na ostrácia intelectual. Hoje penduro às costas a toalha alaranjada após muito cavilar, após noites sem dormir, após muito debater. Hoje decido que não quero que a minha língua seja um tição cinzento que esmorece numa noite de inverno, senão uma chama que medra, que quanto mais a intentam sufocar mais aviva a sua força. Hoje quero luitar por este sonho que aos poucos se torna real, um berro de esperança frente a anos de desesperação, uma luz que pode virar o rumo dos dados apresentados no 2013 polo IGE, que pode ser a alternativa a um panorama linguístico desolador.


E perguntareis-vos que necessidade tinha eu de mover-me do meu lugar de acomodo, sabendo que vou perder mais que ganhar (embora nunca se sabe…), que já há pessoas que me deitaram fora de projetos literários polo simples facto de ter dúvidas, e quem nesta vida não as tem? Foram apenas os meus olhos que da caverna quiseram sair, exercendo o seu direito de liberdade; eu não sou ninguém para negar-lhes tal decisão! As pessoas experimentamos mudanças ao longo da vida, bem seja porque adquirimos novos conhecimentos ou polas experiências do dia-a-dia; o certo é que o nosso pensamento, a nossa forma de sentirmos, de entendermos se vai atualizando.

Foi assim como eu tomei consciência da minha língua, o galego, aquela que mamara dos primeiros dias da minha existência, e decidi defendê-la publicamente e empregá-la sempre e em todos os contextos com não poucas burlas por parte de conhecid@s, companheir@s… Isso fez-me mais forte como vai acontecer coas críticas que receba por este meu manifesto. Porque é agora quando começo a defesa duma alternativa padrão que foi negada polas instituições, que sofre discriminação ao igual que uma criança galegofalante na escola: a norma do Acordo Ortográfico de 1990.

Para mim foi chave entrar em contacto com as variedades de galego-português empregues fora da Galiza há coisa de três anos, na Escola Oficial de Idiomas. Como era possível que só acudindo a aulas um trimestre pudesse obter o nível avançado? Além disto, eu fui percebendo, como falante do dialeto oriental que sou, que este se semelhava muito mais à norma padrão que à norma RAG-ILG. Aginha entendi a mania de não mencionar na Faculdade de filologia galega este dialeto e por que numas conferências do ILG um reputado professor diz «nessa banda só ficam quatro velhos».

Desta maneira, cheguei à conclusão de que o galego e o português não eram duas línguas diferentes, pois a sua cosmovisão, quer dizer, a forma de verem o mundo, é a mesma. Mais tarde, também compreendi que para manter as estruturas e expressões herdadas durante séculos dos meus pais, das minhas avós, dos meus bisavôs, e já quase desaparecidas na transmissão intergeracional, devíamos mirar além Minho. Foi aqui onde o galego-português se pôde desenvolver com total normalidade, chegando a converter-se na língua da informação, isto é, adequando-se aos novos usos modernos, frente ao padrão ILG-RAG, incapaz de regenerar os velhos usos sem olhar para o castelhano.

Por último, apresenta-se frente a mim, frente a tod@s nós, uma norma a nível escrito que nos une com 280 milhões de pessoas, que nos conecta com novas músicas, novas literaturas, novas pinturas, novas investigações, sem termos que mudar de língua porque já é a nossa!

Este é o meu manifesto, um manifesto ortográfico que pretende peneirar ideias, debulhar grafias, que quer fazer-vos reflexionar, incomodar-vos, virar as coisas de pernas para o ar. Nesta vida ri-se, chora-se, namora-se, esquece-se, cai-se, ergue-se, sai-se, entra-se, berra-se, defende-se, luita-se! Não deixes de falares, esbardalhares, bisbilhotares, insultares, debateres, berrares, escreveres na nossa língua! Eva Xanim – Galiza in "Portal Galego da Língua"


“AS MARGENS SÃO OS MELHORES LUGARES
PARA COMPREENDERMOS O MUNDO
DAS INJUSTIÇAS E TENTARMOS MUDÁ-LAS”


Eva Xanim - (Návia de Suarna, Ancares) é quase graduada em Língua e Literatura Galegas e Língua e Literatura Espanholas pola USC. Ainda, é escritora de algum que outro texto poético e narrativo e tem colaborado em numerosos projetos literários, revistas e apresentações de livros. A investigação, a arte, a natureza e a língua são apenas algumas das suas paixões.

Sem comentários:

Enviar um comentário