Um projeto fotográfico sobre
as prisões portuguesas abriu as grades das cadeias portuguesas, através das
objetivas dos fotógrafos suíço e português Peter M. Schulthess e Luis Barbosa,
respectivamente. O resultado foi mostrado ao público numa exposição que teve
como local a Cadeia da Relação, no Porto, que alberga atualmente o Centro
Português de Fotografia (CPF)
A ideia partiu de Daniel Fink,
professor de História na Universidade de Lausanne, com quem Schulthess trabalha
há 12 anos. Assim que conheceu a antiga prisão, onde o escritor português
Camilo Castelo Branco esteve detido cerca de um ano, Fink achou que este era o
local ideal para uma exposição fotográfica e uma conferência internacional
sobre prisões.
Para concretizar o projeto
intitulado "The Portuguese Prison Photo Project", o académico falou
com o fotógrafo suíço que se tem focado neste tipo de instituições nos últimos
15 anos, assim como com o Diretor do CPF, Bernardino Castro, e o anterior
Diretor da Escola de Criminologia da Universidade do Porto, Cândido da Agra.
O Centro Português de
Fotografia indicou o fotógrafo português Luis Barbosa para participar no
projeto. "Perguntámos ao Centro Português de Fotografia se nos podiam
recomendar um fotógrafo, porque nós não conhecíamos ninguém aqui, e o Luís
Barbosa foi o primeiro nome que nos apontaram. Foi uma boa escolha convidá-lo,
porque com as suas fotos a preto e branco temos dois pontos de vista
completamente diferentes", realça Schulthess.
Sete
prisões fotografadas
No ano passado e durante este
ano, os fotógrafos retrataram sete estabelecimentos prisionais diferentes:
Leiria, Guarda, Viseu, Lisboa, Carregueira, Santa Cruz do Bispo e Izeda. Nas
grandes prisões passaram dois dias, nas pequenas apenas um. "É pouco
tempo, porque há muitos espaços e luzes diferentes… E para combinar os espaços
com a melhor luz e com as pessoas é difícil", sublinha o fotógrafo
helvético.
15 anos, 50 prisões
"Há
15 anos visitei pela primeira vez uma prisão na minha cidade natal Basileia.
Era uma prisão antiga de 1864. Foi impressionante em termos visuais e
acústicos", relembra Peter M. Schulthess, que com base no que sentiu,
decidiu continuar "com esta temática, mas leva algum tempo…"
Começou
por fotografar prisões suíças, trabalho que já resultou num livro e deve, em
breve, dar origem a outros dois, pois "metade das cadeias são novas e o
primeiro livro tem 12 anos".
Em
15 anos, o fotógrafo suíço já retratou "cerca de 50 prisões", na Suíça,
na Alemanha e em Portugal, sendo que agora se prepara para fazer o mesmo na
Bélgica.
O suíço concentrou-se, como
sempre, na arquitetura, e o português na atmosfera e no ambiente. Schulthess
debateu-se com a barreira da língua, Barbosa com o facto de ter sido a primeira
vez que entrou numa cadeia. "Para mim foi muito difícil por causa da
língua. Eu não falo bem inglês e não falo de todo português. Por isso, é muito
difícil para arranjar as coisas, porque é preciso gente para traduzir, fazer a
conversação. Não gosto disto!", diz em tom de desabafo, antes de abordar
as dificuldades do colega. "Não foi muito fácil para ele, porque o Luis
nunca tinha trabalhado numa prisão. Por isso, teve de decidir qual era o seu
foco. Eu sei como gerir estas coisas na prisão, para dizer o que quero, mas ele
não tinha qualquer ideia. Por isso, demorou algum tempo a ambientar-se e a
saber o que podia fazer ou não".
As condições das prisões
portuguesas surpreenderam pela negativa o fotógrafo que já tinha retratado
dezenas de cadeias na Suíça e na Alemanha: "Há muitas diferenças. Na
Suíça, nos últimos dois anos construímos muitas prisões novas. 50% dos
estabelecimentos prisionais são edifícios novos, enquanto aqui, em Portugal, as
duas prisões mais recentes são de 2004. Acho que as condições das prisões
portuguesas são muito más. Há muitas coisas degradadas. Na Suíça está tudo em
boas condições, mas claro que é uma questão de dinheiro…".
Mas houve algo que surpreendeu
o suíço pela positiva: " A abertura dos diretores e dos funcionários das
prisões. Quando faço este trabalho na Suíça, é tudo mais fechado. Quanto aos
procedimentos para pedir permissão para a publicação das fotos, surpreendeu-me
que eles nos tivessem impedido de publicar tão poucas fotografias".
A swissinfo acompanhou uma das
visitas guiadas pelo fotógrafo suíço à exposição. Um grupo interessado e atento
de portugueses e estrangeiros foi colocando imensas perguntas a Schulthess
sobre as fotografias que iam vendo e sobre a vida nas prisões.
"Surpreende-me que haja centenas de pessoas a ver a exposição diariamente.
É uma sensação boa", congratula-se Schulthess.
"Estamos a discutir levar
este projeto a Lisboa, talvez a Coimbra e esperamos continuar, porque é um tema
nacional, que inclui prisões de todo o país", deseja o fotógrafo.
Está prevista a publicação de
um livro de atas da conferência internacional e ainda a edição de um livro
fotográfico sobre o projeto.
As
Prisões em Portugal
Portugal tem atualmente 49
estabelecimentos prisionais. De acordo com dados do World Prison Brief, do
Institute for Criminal Policy ResearchLink externo, citados pelo The Portuguese
Prison Photo Project, "desde 1985 que o número de reclusos excede a
capacidade dos estabelecimentos prisionais: o nível de ocupação no final de
2016 atingia uma média de 108%; chegando a 170% em algumas prisões.
Comparativamente à Europa,
Portugal tem uma alta taxa de detidos, o que pode ser explicado pelo grande
número de sentenças de detenção de longa duração. No entanto, o código penal
está a ser alvo de revisão, estando a ser dado maior ênfase a medidas de
vigilância electrónica. A intenção é reduzir o número de detidos
institucionalizados em prisão efetiva". Filipa Soares – Suíça in “Swissinfo”
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