O etnomusicólogo e docente
universitário Eduardo Lichuge sustenta que a colonização dos territórios
africanos contribuiu em grande medida para a introdução do conceito de música
que, no caso de Moçambique passou a designar qualquer tipo de prática musical executada
pelas populações moçambicanas.
Este facto significou a
“exclusão” das práticas musicais autóctones, uma vez elas passaram a ser
nomeadas, de acordo com a perspectiva ocidental.
Eduardo Lichuge falava durante
a 9ª sessão das Tertúlias Itinerantes 2017, subordinada ao tema “Timbilas e
Pianos: diálogos, sonoridades e performances”, evento que juntou, na última
quarta-feira, na Fundação Fernando Leite Couto, na cidade de Maputo, investigadores
de vários campos do saber.
Na sua apresentação, Eduardo
Lichuge começou por contextualizar o conceito de música, referindo que o mesmo
surgiu através do primeiro contacto entre Moçambique e Europa, através de
Portugal, estabelecido no século XVI, por missionários jesuítas que nomearam
estas práticas com conceitos retirados do universo estético e musical
ocidental, que é diferente do sentido que estas tem no contexto africano.
“Por um lado, os europeus
definiam a música como um meio para atingir a sabedoria, o intelecto e o belo,
ou se quisermos a música no contexto europeu é definida como conjunto de sons
agradáveis ao ouvido, enquanto para os africanos, ela tinha funções mais
específicas, ora relacionadas com o nascimento, a colheita, os casamentos, as
cerimónias fúnebres, o pedido de chuva e muito mais”, explicou o orador.
“O facto de a música ser
escrita na pauta, na perspectiva europeia, influenciou para a colonização da
música moçambicana”, considerou, acrescentando que, “a partir desta forma
escriptocêntrica, de chamar a música a partir de um referencial teórico
ocidental, acabou por matar a música feita, por exemplo, pelos chopes”.
“A partir do momento em que a
nossa música foi tida como primitiva naquele contexto colonial, estava-se também
a dizer que ela não tem história, porque não é escrita”, explicou.
Segundo Eduardo Lichuge, por
ser de natureza oral, a música feita pelos chopes e outras grupos culturais
nacionais, e africanos em geral, não obteve validade visto que, na perspectiva
ocidental de construção do conhecimento e do saber na Europa, só é válido
aquilo que é escrito.
O orador deu exemplo da
palavra “orquestra”, um termo que, no sentido europeu está associado a
agrupamento instrumental que inclui várias secções instrumentais como é o caso,
das cordas, madeiras, percussões entre outros que não pode ser transposto, por
exemplo, para um “mgodo” chope, que é o conjunto das timbila, dos tocadores,
dos dançarinos, ou seja, aplicar o conceito de orquestra para designar um grupo
de timbileiros seus membros, é retirar o sentido deste termo do seu contexto
sociocultural.
“A orquestra é um termo
europeu que, no nosso contexto, é o Mgodo. Mas esta palavra não a utilizamos
por causa do nosso passado colonial, que começou a nomear estas práticas a
partir de um referencial teórico ocidental que exclui e nega a existência da
outra música”, concluiu.
Importa referir que Tertúlias
Itinerantes é a designação de um ciclo de palestras que traz, a Maputo,
reflexões de investigadores de Moçambique, Brasil e Portugal, sobre as
dinâmicas da sociedade global. São coordenadores desta iniciativa os
investigadores Sara Laísse, da Universidade Politécnica, Eduardo Lichuge da
Universidade Eduardo Mondlane e Lurdes Macedo, da Universidade Lusófona de
Portugal. In “Olá Moçambique” - Moçambique
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