SÃO PAULO – Antes de fechar a
questão em favor da derrubada da cláusula que obriga os parceiros do Mercosul a
negociar em conjunto a assinatura de acordos de livre-comércio, o Itamaraty
deveria avaliar muito bem as consequências para a indústria nacional da
flexibilização do bloco, que permitiria aos demais sócios fechar tratados
bilaterais de forma isolada. Assim, a Argentina poderia fechar um acordo com a
China, reduzindo a zero a alíquota de produtos manufaturados que o Brasil
exporta para aquele país. Isso significaria a perda de mercado para setores
como o calçadista e o de máquinas e equipamentos, que são grandes exportadores
para a Argentina.
Ao que parece, o governo
interino entendeu que a Argentina tem sido o principal obstáculo para que o
Brasil firme um número maior de acordos. De fato, por intermédio do Mercosul, o
Brasil assinou só três acordos de livre-comércio com economias pouco representativas
– Egito, Palestina e Israel. Desses, o único que está em vigor é com Israel.
Além disso, a Palestina nem nação é, mas apenas uma instituição estatal
semi-autônoma que governa nominalmente as regiões da Cisjordânia e toda a Faixa
de Gaza dentro do estado israelense. É de se reconhecer que a negociação para
um acordo de livre-comércio com a União Europeia (UE), que se arrasta desde
1999, não tem avançado em razão da resistência argentina.
É verdade que, depois da
eleição de Maurício Macri, a Argentina parece mais disposta a avançar nas
negociações, mas, de prático, até agora, nada se constatou. Sem depender da
Argentina, o governo brasileiro espera lograr em pouco tempo a assinatura de
vários acordos bilaterais, principalmente com Canadá, Japão, Coreia, Efta
(Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein) e, em especial, com a UE.
Diante disso, afigura-se urgente
uma revisão nas negociações com a UE, pois a impressão que se tem é que o bloco
europeu já descartou o Mercosul de seu quadro de prioridades. E que a troca de
ofertas não passa de mero jogo diplomático, para não se dizer perda de tempo.
Portanto, a continuar nesse diapasão, o Brasil só terá a perder, pois é o que
vem acontecendo nos últimos cinco anos.
De acordo com os números do
Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), a corrente de
comércio (importação/exportação) entre Brasil e UE caiu de US$ 99,6 bilhões, em
2011, para US$ 70,5 bilhões, em 2015, um decréscimo de 30%. As exportações
brasileiras para aquele bloco têm caído todos os anos: foram US$ 53,1 bilhões
em 2011; US$ 49,1 bilhões em 2012; US$ 47,7 bilhões em 2023; US$ 42 bilhões em
2014; e US$ 33,9 bilhões em 2015.
Já as importações subiram de
2011 a 2013, mas caíram em 2014 e 2015: foram US$ 46,4 bilhões em 2011; US$
47,7 bilhões em 2012; US$ 50,7 bilhões em 2013; US$ 46,7 bilhões em 2014; e US$
36,6 bilhões em 2015. Em 2016, a corrente de comércio continua em queda: no
período de janeiro a junho, as exportações caíram de US$ 16,6 bilhões, em 2015,
para US$ 15,6 bilhões em 2016; e as importações, desceram de US$ 15,8 bilhões
em 2015 para US$ 15,2 bilhões em 2016, no mesmo período. Houve superávit na
corrente de comércio de 2010 a 2013, mas, desde então, a balança tem sido deficitária
para o Brasil.
Dentro da UE, os Países Baixos
costumam ter maior participação como compradores do Brasil – em média, 30% –,
seguidos por Alemanha (15%), Itália (9%) e Reino Unido (9%), que, recentemente,
deixou de integrar o bloco. As importações vêm da Alemanha (30%), Itália (13%),
França (12%) e Espanha (8%).
O Brasil costuma exportar
produtos básicos, especialmente minério de ferro, farelo de soja, café, soja e
óleos brutos de petróleo, que representam mais de 50% do total. As importações
são majoritariamente de produtos manufaturados, ou seja, mais de 95%. Em outras
palavras: a UE, embora seja um parceiro extremamente relevante, nunca irá
substituir os mercados argentino e venezuelano para os produtos manufaturados
brasileiros, que podem perder competitividade com a flexibilização do Mercosul.
Milton Lourenço - Brasil
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Milton Lourenço é presidente
da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de
Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e
da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e
Logística (ACTC). E-mail: fiorde@fiorde.com.br. Site: www.fiorde.com.br
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