Acho que tudo está já dito no
debate sobre qual é a melhor ortografia para representar o galego: se a da
língua espanhola, que emprega atualmente o sistema educativo e a administração
galega, ou aquela que empregam o resto de países do mundo que falam a nossa
língua. Não sei se há algum argumento a favor ou em contra dalguma destas duas
posturas que ainda não fosse discutido veementemente no mundo cultural galego
durante as últimas décadas, mas com certeza eu não tenho nada novo que dizer.
Por que, pois, dedicar tempo a escrever mais um artigo sobre a questão
normativa? Na verdade, acabo de ver o magnífico documentário da Sabela
Fernández e do José Ramom Pichel, "Porta para o exterior",
e senti o pulo de voltar a escrever sobre este tema da língua, após muito tempo
sem o fazer. A minha situação profissional e vital mudou muito desde a última
vez que escrevi sobre estas questões, e nunca esteve mais convencido da
conveniência da estratégia reintegracionista para o galego como o estou agora.
Assim, após um ano e meio a morar em Nova Iorque, trabalhando para as Nações
Unidas, o potencial do reintegracionismo para a sociedade galega nunca se me
manifestara de forma mais evidente. É uma interação habitual:
-E como você fala tão bem o
português?
-É que eu sou galego. A
Galiza…
Aqui a descrição varia,
depende de como tenha eu o dia e da nacionalidade do meu interlocutor… Se falo
com americanos tendo a empregar aquela brincadeira do Julián Hernández:
-…A Galiza é o lugar da Europa
mais perto do Mississippi… Ouvimos o blues nos dias de vento. E ademais de
espanhol, falamos português.
-Ah, a sério? Guau, vaia
sorte!
Se falo com brasileiros, a
verdade é que de forma mais habitual do que poderia imaginar-se, a cousa é
assim:
-É que eu sou da Galiza…
-Ah! Já, galego. Vocês estão
na Espanha, mas perto de Portugal, não é?
Numa ocasião eu, coitado,
iniciei uma explicação detalhada da história da língua com o dono dum popular
restaurante brasileiro de Manhattan. Aos dez segundos ele interrompeu para
dizer:
-Eu sei. Da Galiza. Vocês
inventaram a língua portuguesa!
Mais de uma caipirinha seguiu
àquele momento de orgulho patriótico.
Os amigos portugueses
respondem amiúde: De Vigo ou da Corunha? Para depois comentar eles as suas visitas
à Galiza e eu as minhas a Portugal.
Acho que a pessoa que mais se
surpreendeu do meu português galego foi uma mulher angolana. Era a primeira vez
que escutava aquilo do galego e interessou-se muito pola sociolinguística da
Galiza. A conversa decorria enquanto nos dirigíamos a uma receção da CPLP.
Lembro que pouco antes de entrar no prédio ela disse, muito séria: Vocês os
galegos tinham que lograr a independência para entrar a fazer parte da CPLP.
Superado polas circunstâncias, veu-me à mente a imagem de Messi driblando toda
a defesa do Madrid. Gol de Angola.
Enfim, é claro, o uso do
espanhol cria automaticamente uma relação de proximidade especial com os amigos
venezuelanos, colombianos, peruanos, chilenos, argentinos, dominicanos… e de
tantos outros países hispanófonos do mundo. Ademais, oferece umas oportunidades
diplomáticas, culturais, económicas e mais, fora de toda dúvida para os
governos destes países. O galego também o faz com os países de língua
portuguesa, indiscutivelmente. A pergunta não pode ser outra: Para quando a
Galiza aceitará o seu lugar privilegiado no mundo, assumindo com orgulho que
nela se falam habitualmente duas das línguas mais importantes do planeta? Arturo De Nieves – Galiza in “Portal
Galego da Língua”
Arturo
de Nieves Gutiérrez de Rubalcava (A Corunha, 1983), Doutor
Internacional pola Universidade da Corunha, com uma tese sobre comportamento
eleitoral desenvolvida na Universidade de Edimburgo, na Universidade do Minho e
na Universidade da Corunha. Formado em investigação social e política na
University of Abertay, na Universidade da Corunha, na Universidade de Salamanca
e em Harvard University. Trabalhou como sociólogo no 'Centro de Investigaciones
Sociológicas', no Concelho da Corunha, na Universidade de Santiago de
Compostela, na eurorregião Galiza-Norte de Portugal, e também como consultor
político independente. Desde fevereiro de 2015 trabalha para a Organização das
Nações Unidas, em Nova Iorque.
Sem comentários:
Enviar um comentário