Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

quarta-feira, 12 de agosto de 2020

Macau – Tem condições para ser um Centro de Arbitragem entre a China e os países lusófonos

Macau tem condições para se tornar no local preferencial para as questões de arbitragem entre a China e os países lusófonos, acredita a advogada Fátima Dermawan, que aponta dois motivos: a questão da língua portuguesa e o estatuto de Região Administrativa Especial. Ainda assim, indica a causídica, para isso falta “hardware” que passa tanto por um bom centro de arbitragem como pela formação de profissionais

A Lei da Arbitragem “é o primeiro passo numa série de melhorias significativas a ter lugar em Macau enquanto local preferido de arbitragem lusófona de acordo com as melhores práticas internacionais, tendo especialmente em consideração a localização estratégica, a economia crescente e a disponibilização de profissionais qualificados bilingues para eliminar a distância entre a China e os Países Lusófonos”. Esta ideia consta das conclusões de um artigo intitulado “A nova Lei da Arbitragem de Macau – Um novo capítulo para a arbitragem em Macau?”, da autoria da advogada Fátima Dermawan que considera que a RAEM é o local ideal para a arbitragem entre a China e a Lusofonia, por dois motivos.

“Para já, a questão da língua. Temos muitas pessoas bilingues e, como a China tem o desejo de tornar Macau numa plataforma entre os chineses e os países lusófonos, temos uma grande vantagem em termos de língua. Depois, é também a localização geográfica de Macau, que é uma região que faz parte da China mas é uma Região Administrativa Especial e tem as suas leis específicas. Acho que isso é uma segurança também para os investidores estrangeiros”, frisou a causídica em declarações ao Jornal Tribuna de Macau.

Questionada sobre o panorama do sector da arbitragem local, Fátima Dermawan começou por referir que há “software” para o seu desenvolvimento, uma vez que “temos finalmente uma lei que é muito organizada e que se inspirou na de Singapura e de Hong Kong que, na Ásia, são os dois centros de arbitragem internacional”.

No entanto, falta o “hardware”, ou seja, “a formação dos profissionais aqui e também os centros de arbitragem, porque até agora os que nós temos têm muito pouca actividade e para uma instituição crescer é muito importante ter casos, ter experiência”. “É assim que uma instituição se torna mais sofisticada e também atrai mais empresas para virem a Macau resolver os litígios por meios alternativos”, defendeu ainda.

“Pelo que sei, no Brasil e em Portugal já é um meio bastante comum [a arbitragem], mas têm as instituições e as pessoas têm formação. Macau tem um grande potencial mas falta mesmo isso. Precisamos de ter uma câmara de arbitragem como deve ser”, frisou Fátima Dermawan.

A advogada que trabalha na firma “MdME Lawyers” explica que há uma diferença entre o que acontece em Hong Kong ou Singapura e a situação em Portugal, uma vez que na RAEHK, por exemplo, as câmaras de arbitragem são empresas privadas. “Em Portugal, acho que não é totalmente privado, é preciso apoio do Governo. E, como o nosso ordenamento jurídico tem matriz portuguesa, é preciso ter o apoio do Governo para isso acontecer”, e que “os próprios profissionais tenham formação para aconselhar os clientes a recorrer a arbitragem”.

Além disso, “se nos contratos que fazemos em Macau indicarmos sempre os tribunais para resolver os litígios, assim, nunca vai haver casos suficientes para os centros de arbitragem”.

No artigo que escreveu, Fátima Dermawan refere que o Governo estava, no final do ano passado, a estudar a possibilidade de combinar os cinco centros de arbitragem existentes no território criando uma instituição internacional especializada, o que seria positivo. “Em vez de termos vários centros dispersos, porque não fazemos só um muito bom? Nos países ou regiões que apostam mais na arbitragem conseguimos identificar um centro, é aquele específico. Em Macau isso não acontece. Ainda estamos numa fase inicial, o bom é concentrar os recursos”, sustenta a advogada.

Arbitragem internacional ficou por definir

No referido artigo, a causídica refere que as principais mudanças trazidas pela nova Lei da Arbitragem incluem a aglomeração dos conceitos de arbitragem doméstica e internacional, anteriormente definidos por dois diferentes decretos-lei. No entanto, ressalva Fátima Dermawan, “ao contrário do antigo regime, não fornece uma definição para arbitragem internacional ou arbitragem comercial externa”. “Além disso, a nova lei não distingue o regime aplicável à arbitragem doméstica e o aplicável à arbitragem internacional”.

No texto pode ler-se que, embora a opção de regular a arbitragem doméstica e internacional de uma maneira uniforme seja uma tendência, na maioria das legislações a nível internacional há disposições “aplicáveis exclusivamente à arbitragem doméstica e/ou à arbitragem internacional”, referindo uma definição de arbitragem internacional, abordagem que em Macau não foi adoptada.

Por outro lado, a nova lei continua a exigir que um acordo de arbitragem continue a ser firmado por escrito. Porém, a nível internacional, os regimes mais recentes nomeadamente os adoptados com base no modelo definido pela Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (UNCITRAL, na sigla inglesa) incluem uma definição mais abrangente do que constitui um acordo de arbitragem por escrito, incluindo “qualquer documento assinado pelas partes, troca de cartas, fax, e-mail ou outros meios de telecomunicação escrita”.

A nova legislação também inclui “importantes disposições de alívio em situações de emergência, incluindo a adopção de um conjunto de regras específicas e a adopção de um capítulo separado, dedicado à definição de medidas provisórias e ordens preliminares, em linha com o modelo da UNCITRAL”.

Nas conclusões do artigo, Fátima Dermawan frisa que a nova lei “fornece uma nova ferramenta para o desenvolvimento da arbitragem” no território, no entanto, “o hardware é determinante no sucesso de Macau” nesta matéria.

Centro de Arbitragem de Consumo instaurou 635 casos desde 1998

O Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo de Macau instaurou 635 casos de arbitragem desde a sua criação, em 1998, indicou o director dos Serviços de Assuntos de Justiça numa resposta a uma interpelação de Ho Ion Sang. Liu Dexue indicou ainda que o Centro de Arbitragens Voluntárias da Associação dos Advogados e o Centro de Arbitragem do Centro de Comércio Mundial de Macau lidaram, por sua vez, com dois e quatro casos respectivamente. No documento, assegura ainda que o Governo vai aumentar “ainda mais o nível de internacionalização e de profissionalização dos árbitros, bem como desenvolver plenamente as vantagens de Macau como plataforma de serviços para a cooperação económica e comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa”. Inês Almeida – Macau in “Jornal Tribuna de Macau”

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