Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Almejamos




O Presidente da Comissão Linguística da AGAL (CL-AGAL) Carlos Garrido anunciou a publicação de “O Modelo Lexical Galego”, texto normativo que, com o subtítulo de “Fundamentos da Codificação Lexical do Galego-Português da Galiza, representa o primeiro documento específico e abrangente da Comissão Linguística no domínio da regulação do léxico da variedade galega da língua galaico-português:


            “A recente saída do prelo de O Modelo Lexical Galego constitui, de facto, todo um acontecimento no percurso da CL-AGAL e um pequeno marco no desenvolvimento do Reintegracionismo, porquanto O Modelo Lexical vem a lume cerca de 24 anos depois de terem aparecido os últimos textos normativos de grande envergadura produzidos pola Comissom, isto é, a segunda ediçom do Estudo Crítico e o Guia Prático de Verbos Galegos Conjugados (ambos, de 1989). Ficamos, assim, mais perto de completarmos a padronizaçom básica da variedade galega do galego-português, umha vez que a CL-AGAL já realizou a codificaçom ortográfica (mediante o Estudo Crítico [1983 e 1989], o Prontuário Ortográfico Galego [1985] e a Atualizaçom da Normativa Ortográfica [2010]) e a morfológica (mediante o Estudo Crítico [1983 e 1989] e o Guia Prático de Verbos Galegos Conjugados [1989]), restando apenas a codificaçom prosódica à espera de algum contributo específico.

O Modelo Lexical Galego, após o preámbulo e antes do capítulo final de bibliografia, estrutura-se em duas partes dispositivas, bastante diferentes entre si, mas as duas necessárias e mutuamente complementares: a primeira parte (cap. 2) é de natureza analítica (e didática!) e consagra-se a exercer umha prescriçom enunciativa, quer dizer, expom umha série de regras, medidas ou enunciados cuja aplicaçom coerente, focalizada em cada um dos fatores e processos degradativos que incidem sobre o léxico galego contemporáneo, determina a plena regeneraçom formal e funcional do nosso léxico e, em simultáneo, fai surgir o padrom lexical galego (PLGz). Exponhem-se, assim, de modo sucessivo e sistemático, medidas regeneradoras, norteadas por umha constante e enriquecedora coordenaçom com os padrons lexicais lusitano e brasileiro, que som concebidas para debelar os fatores degradativos da variaçom sem padronizaçom (geográfica, de registo, de freqüência), da substituiçom castelhanizante, da erosom, da estagnaçom, da suplência castelhanizante e do diferencialismo espúrio. Esta primeira parte, cuja redaçom se baseia na monografia de Carlos Garrido Léxico Galego: Degradaçom e Regeneraçom (Edições da Galiza, 2011), pode entender-se, pois, como verdadeiro inventário analítico da histórica degradaçom do léxico galego e das estratégias mais eficazes para a combater.

Já a segunda parte dispositiva de O Modelo Lexical Galego (cap. 3), mais breve e de caráter fundamentalmente prático, constitui um corolário ou derivaçom lógica do capítulo de prescriçom enunciativa e consta de quatro vocabulários, de pequena extensom, destinados a explicitar (prescriçom propositiva) em pouco espaço as unidades que fam parte do PLGz. Os dous primeiros vocabulários compreendem unicamente os elementos e configuraçons lexicais que som diferentes no padrom lexical da Galiza aqui definido e no padrom lexical de Portugal (PLPt), resenhando as pertinentes equivalências, de modo que o primeiro vocabulário é organizado no sentido PLPt → PLGz, e o segundo vocabulário, inverso do primeiro, no sentido PLGz → PLPt. Trata-se, portanto, de umha estratégia de codificaçom propositiva assaz económica, baseada na exclusiva indicaçom das exceçons à regra geral do isomorfismo ou identidade existente entre os sistemas lexicais lusitano e galego, e em que os meios e instrumentos definidores do padrom lexical lusitano, hoje bem eficazes e acessíveis na Galiza (internet!), som propostos como supletórios para definir o padrom lexical galego. Os vocabulários 3 e 4, por seu turno, apresentam caráter auxiliar e destinam-se a relacionar com os correspondentes elementos do padrom lexical galego duas categorias freqüentes de vozes alheias a tal padrom: os dialetalismos galegos ou variantes geográficas registadas na Galiza que nom pertencem ao padrom lexical galego (Vocabulário 3) e os diferencialismos espúrios ainda hoje freqüentemente usados por utentes cultos de galego (Vocabulário 4).

Nem será preciso dizer que umha regulaçom e regeneraçom do léxico galego como a que O Modelo Lexical postula se revela bem mais necessária e urgente para os utentes da língua (ainda) nom reintegracionistas do que para os já reintegracionistas, pois se estes, inspirados polo princípio inerente ao Reintegracionismo de coordenaçom lingüística galego-luso-brasileira, realizam em geral usos lexicais caraterizados por umha grande vernaculidade, coerência e eficácia, aqueles, orfos de referência fiável, manejam, quase sem exceçom, um léxico pobre, deturpado, incoerente e disfuncional. Ora, também para os utentes reintegracionistas da língua O Modelo Lexical pode e deve erigir-se num útil instrumento para orientar com segurança os usos lexicais em casos naturalmente proclives à dúvida e às irregularidades, como som os constituídos pola conceituaçom dos particularismos lexicais galegos (no seio da Lusofonia), pola divergência designativa entre Portugal e o Brasil, pola conceituaçom de castelhanismos presentes nos padrons lusitano e brasileiro, pola substituiçom castelhanizante de reforço, pola eventual inadequaçom em galego de algumhas (muito poucas) denominaçons luso-brasileiras, etc., de modo que todas estas questons, e ainda outras similares, encontram em O Modelo Lexical umha resposta prática.

Como nom pode deixar de acontecer numha abordagem racional da problemática lingüística galega, o padrom lexical galego que O Modelo Lexical contribui para definir é essencialmente galego e, por isso, substancialmente coincidente com os padrons lexicais brasileiro e, sobretodo, lusitano. A respeito deste último, o PLGz aqui definido incorpora um reduzido número de peculiaridades, que, em todos os casos, som justificadas pola sua genuinidade, funcionalidade, significaçom social e releváncia expressiva. Deitando umha olhadela às páginas dos Vocabulários 1 e 2, que apenas registam divergências entre os padrons galego e lusitano, vemos que som relativamente numerosos os casos em que as diferenças dim respeito à configuraçom lexical, em que o número ou a natureza dos elementos semanticamente relacionados varia entre as duas vertentes da língua (ex.: PLGz: acirrar ==> PLPt: acirrar = açular; PLGz: anho > cordeiro ==> PLPt: cordeiro; PLGz: gago > [tatejo = tato] > tartamudo ==> PLPt: gago > tartamudo > tato; PLGz: sapo-concho ==> PLPt: cágado > sapo-concho), freqüentemente pola circulaçom na Galiza de um elemento de caráter popular que está ausente no padrom de Portugal (ex.: PLGz: [calma = sossego] + acougo pop. ==> PLPt: calma = sossego; PLGz: clérigo + crego pop. ==> PLPt: clérigo). Quando a divergência di respeito apenas aos elementos lexicais, som abundantes os casos em que a variaçom se restringe a umha letra ou fonema (ex.: PLGz: anaco ==> PLPt: naco; PLGz: fento ==> PLPt: feto; PLGz: renger ==> PLPt: ranger), mas também ocorrem casos de plena divergência lexemática (ex.: PLGz: palheira ‘ave do gén. Stercorarius’ ==> PLPt: moleiro; PLGz: rapante ==> PLPt: areeiro; PLGz: zichar ==> PLPt: esguichar). Casos extremos som aqueles em que se verifica assimetria lexical absoluta entre as duas vertentes da língua, já que um dos padrons lexicais carece de soluçom equivalente (ex.: PLGz: maniotas ==> PLPt: 0). Casos curiosos, enfim, som aqueles em que um dado elemento lexical tem valores semánticos ou pragmáticos diferentes nas duas vertentes da língua (ex.: PLGz: serpente + serpe pop. ==> PLPt: serpente + serpe poét.; PLGz: jantar ==> PLPt: almoço / PLGz: ceia ==> PLPt: jantar; PLGz: rodavalho ‘peixe Psetta maxima’ ==> PLPt: pregado / PLGz: corujo ‘peixe Scophthalmus rhombus’ ==> PLPt: rodovalho). Em qualquer caso, convém insistir em que, naturalmente, as coincidências entre os dous padrons lexicais, o lusitano já definido e o galego que aqui começamos a definir, avultam muitíssimo mais do que as divergências (será arriscado aduzir c. 95% de coincidências?).

Padronizar de modo eficaz o léxico de umha modalidade lingüística é tarefa muito mais complicada do que codificar a sua ortografia ou a sua morfologia, de tal modo que a Comissom Lingüística, com realismo, apelida O Modelo Lexical de «fundamentos da codificaçom lexical do galego». Entende, assim, a Comissom que O Modelo Lexical é um primeiro contributo neste campo, inexoravelmente necessitado de ulterior refinaçom, polo que, de facto, na nota de rodapé número 202, ela explicitamente convida os consulentes do texto para lhe remeterem «sugestons de emenda e melhoramento»; porém, ao mesmo tempo, ao abrir o subtítulo do documento com a palavra fundamentos, a Comissom Lingüística também quer manifestar a sua convicçom de que O Modelo Lexical Galego representa um sólido alicerce conceptual, um robusto quadro geral de referência, para orientar com eficácia os usos lexicais da variedade galega do galego-português e para, assim, podermos configurar também na Galiza a língua verdadeiramente extensa e útil que todos almejamos.” Portal Galego da Língua - Galiza

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