Ilona
e Renilo mudaram-se há cerca de dois anos de armas e bagagens para a cidade do
Porto. Nesta cidade, encontraram aquilo que procuravam para desfrutar da
reforma: uma cidade pequena com todas as acessibilidades necessárias. Além
disso, a isenção fiscal concedida pelo estado português surgiu como fator
adicional à sua escolha.
Por esse motivo, esperam que
esta tenha sido a última mudança de país nas suas vidas, até porque não têm
outro plano senão ficar.
Numa tarde cinzenta, a
swissinfo.ch encontrou-se no centro da cidade do Porto para tomarmos um café e
conversarmos sobre a experiência de Ilona, 71 anos, e Renilo, 75, em Portugal
e, particularmente, de que forma contribuiu o estatuto de residente não
habitual para deixarem França e como decorreu todo esse processo.
A
partida rumo à cidade do Porto
Nos últimos 30 anos, Renilo e
Ilona viveram na região da Alsácia, em França. As suas vidas profissionais
continuaram na Suíça, especificamente em Basel, o que lhes proporcionou terem
optado por residir em França e trabalhar na Suíça, apesar de ambos terem
igualmente trabalhado em França. Quando se reformaram, permanecerem ainda por
algum tempo em França. No entanto, com o passar dos anos, começaram a
confrontar-se com a ideia de que “não vamos ficar em França para sempre”, mas
também não tinham vontade de regressar à Suíça, “porque após 30 anos no
estrangeiro, já não te sentes em casa. A Europa mudou. A Suíça permanece
bastante Suíça” confidencia-nos Renilo, notando que não é uma crítica mas uma
constatação.
Começaram a estudar a opção de
irem para a Alemanha e, durante esse tempo, Renilo conversou com a sua irmã,
que reside no Porto com o marido, e ela sempre lhe disse para ambos irem
conhecer a cidade. Assim que olharam o Porto apaixonaram-se imediatamente. A
comprová-lo foi a sua viagem a Lisboa, quando se disseram: “pensa se nós
tivéssemos vindo para aqui. Não, impossível”.
Desde que decidiram abandonar
França até se fixarem no Porto, demorou cerca de dois anos. Durante esse
período, conversaram com os seus cunhados no Porto, leram informações sobre a
vida na cidade, procuraram apartamentos e estudaram cada freguesia recorrendo
ao Google Earth. O seu cunhado disse-lhe que, para além de gostarem da cidade,
deveriam aproveitar a isenção fiscal; “francamente, não foi a razão principal
mas no final foi determinante para a escolha”, conta-nos Renilo. Ele destaca
que não aconselharia ninguém a mudar de país apenas pelo facto de não pagar
impostos, “porque mais cedo ou mais tarde as coisas mudam”, salienta.
A
burocracia portuguesa
Curiosamente, ambos não tecem
muitas críticas à burocracia portuguesa. Ilona nomeia o facto de terem ido
quatro vezes à Câmara Municipal do Porto para efetuarem o registo de cidadão
como algo aborrecido, facto que Renilo consente, “mas sempre gentilmente”,
destaca. Na Junta de Freguesia da área de residência, o processo de inscrição
foi mais simples e tinha de ser feito para terem acesso a médico de família ou
usufruírem do Serviço Nacional de Saúde, independentemente de terem seguros de
saúde privados.
No que concerne à assistência
médica, como têm os seus descontos na Suíça, a segurança social paga as
despesas com saúde no sistema nacional de saúde português. No entanto, foi
necessário preencher o formulário S1, carimbar nos serviços de saúde e reenviar
para a Suíça. Este processo demorou cerca de um ano, normalmente necessita seis
meses, e Ilona destaca que isso foi outro momento um pouco stressante. Renilo,
contudo, diz que “sabemos que as coisas não são tão rápidas como na Suíça; por
isso, temos de esperar”. A única ajuda que receberam, e ainda continuam a ter,
foi de uma técnica oficial de contas (TOC) que lhes preenche a declaração anual
de rendimentos (IRS). A única alteração neste momento é a obrigatoriedade de
declarar todas as contas bancárias estrangeiras que possuam.
Normalmente procuram
diversificar os locais onde vão. Reúnem-se nos clubes suíço, francês e
italiano. Dizem que o clube suíço do Porto não tem muitas atividades como os
restantes, que todos os dias têm eventos. Particularmente no clube francês,
todas as semanas chegam novos reformados. O próprio clube disponibiliza um
serviço em que as pessoas são ajudadas com todo o processo burocrático de
aquisição da residência não habitual.
Após cerca de dois anos, não
se arrependem da mudança e estão felizes. Costumam frequentar as salas de
cinema e os concertos da Casa da Música, para além das caminhadas que
realizam junto à praia que são “as mais bonitas de Portugal, apesar de não se
poder ir ao banho”, sorri Ilona. O único problema que assumem ter é a barreira
linguística, “que soa muito bem mas é muito difícil”, ri-se Renilo. A sua irmã
tinha-o avisado para essa questão que ele percebe que seja um problema, mas,
simultaneamente, a gentileza que encontra facilita a compreensão.
Na opinião de ambos, Portugal,
com esta medida, pode estar a ser vítima do seu próprio sucesso porque “os
preços das casas estão a subir demasiado e muitas vezes os portugueses não
conseguem pagar esses preços”. Contudo, alerta as pessoas que possam ter
vontade de se mudar para que “vão visitar a cidade e entrem em contacto com
pessoas que já passaram pela experiência para que fiquem bem informadas”
sublinham os dois.
A isenção de impostos ainda
vai durar alguns anos. No entanto, o seu projeto de vida será na cidade e ambos
assumem que vieram para Portugal para ficar. Por isso, “mesmo que tenhamos de
pagar impostos, iremos pagar”, dizem-nos Renilo e Ilona felizes pela sua
decisão.
Regime
fiscal para o residente não habitual
Desde 2009 que o estado
português concede um regime fiscal especial para
trabalhadores estrangeiros que desempenhem funções de
elevado valor acrescentado em áreas científicas, tecnológicas e artísticas (a
lista que especifica as diferentes profissões é extensa), numa tentativa de
atrair “cérebros” e know-how relevante para Portugal. Em 2013, após
clarificação acerca da isenção de tributação das pensões de reforma obtidas no
estrangeiro, o número de pedidos de reformados de diversos países europeus,
para mudarem a sua residência fiscal para Portugal, aumentou exponencialmente.
Segundo dados fornecidos pelo Ministério das Finanças à imprensa portuguesa, em
2015 havia um total de 5653 a quem foi concedido este estatuto de residente não
habitual. Do total de pessoas abrangidas por esse estatuto, 3474 são reformados
estrangeiros.
Não foi possível aferir
especificamente o número de reformados suíços que requereram este estatuto. No
entanto, segundo dados fornecidos pela embaixada suíça em Portugal, havia em
2015 um total de 3425 suíços a viver em Portugal, tendo aumentado para 3723 em
2016. A larga maioria encontra-se em idade ativa, entre os 18 e 65 anos. O
número de cidadãos suíços com mais de 65 anos registados em Portugal, no ano de
2016, era de 814.
Para requerer este estatuto
junto da Autoridade Tributária e Aduaneira, é necessário não ter tido
residência em Portugal nos cinco anos anteriores ao ano em que se candidata. As
pessoas adquirem um regime fiscal especial, o que significa que todos os
trabalhadores abrangidos têm uma taxa de 20% de impostos e os reformados que
recebem as suas reformas de outro país estão isentos de impostos. Em ambos os
casos, o regime fiscal especial é aplicado durante 10 anos. Filipe Carvalho – Suíça in “swissinfo.ch”
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