Em Cabo Verde, o português é
língua oficial, mas não é língua materna para a maioria dos seus cidadãos. O
mesmo acontece em Angola, em Timor ou em Moçambique. Estes países enfrentam,
por essa razão, enormes dificuldades no ensino do português. Para grande parte
dos alunos, o contacto mais intenso e continuado com o português faz-se apenas
aos 6 anos, quando chegam à escola. Tudo é ainda mais difícil porque não se
trata apenas de aprender a falar, a ler e a escrever uma língua que, para todos
os efeitos, é uma segunda língua. Trata-se também de, logo no primeiro ano,
aprender em português, isto é, numa língua pouco conhecida para as crianças,
todas as outras matérias, da matemática ao estudo do meio e às expressões.
Ensinar a ler e a escrever uma
criança que não fala português porque é outra a sua língua materna requer
metodologias e técnicas de ensino diferentes das que são usadas no ensino de
crianças que já falam a língua, ou para as quais o português é a primeira língua.
Isso é, aliás, o que acontece com o ensino de qualquer língua. Por exemplo, os
nossos alunos em Portugal aprendem inglês, isto é, aprendem a falar, a escrever
e a ler inglês de forma diferente daquela que é usada para ensinar os alunos
ingleses.
Porém, isso não acontece no
ensino do português nestes países, sendo de facto enormes as dificuldades
enfrentadas pelos professores e pelos alunos. Não acontece porque essas
metodologias e materiais de ensino não tinham sido desenvolvidas e não estavam
disponíveis até há pouco tempo. Os programas de ensino de português nesses
países foram por isso definidos a partir dos existentes em Portugal.
Os referenciais para o ensino
de português como língua não materna, ou como língua segunda, ou ainda como
língua estrangeira, foram homologados pelo Ministério da Educação há cerca de
dez anos, com bastante atraso em relação a outras línguas muito faladas no
mundo, como é o caso do inglês ou do espanhol. Desde então, em várias das
nossas universidades tem crescido o número de cursos de formação de professores
de Português para Estrangeiros. Têm sido também produzidos e publicados manuais
e outros manuais pedagógicos destinados ao ensino tanto de crianças como de
adultos. Tal crescimento tem permitido, em primeiro lugar, responder de forma
mais eficaz às necessidades do nosso sistema de ensino que, em todos os níveis
de escolaridade, do primeiro ciclo à universidade, é hoje frequentado por
milhares de alunos de diferentes origens e nacionalidades, que precisam de
aprender o português. Tem, também, permitido ao Instituto Camões inovar nos
seus polos de ensino de português no estrangeiro.
Porém, onde este tipo de
metodologias de ensino e materiais pedagógicos pode fazer a diferença e ser de
grande utilidade é nos países onde o português é língua oficial mas não é
língua a primeira língua materna. Sobretudo naqueles em que há uma aposta séria
na democratização do ensino, na inclusão escolar da maioria das crianças,
independentemente da sua origem social. Se já é difícil ensinar a uma criança
uma segunda língua com o sucesso requerido para que a partir de então essa seja
a língua da sua aprendizagem escolar, mais difícil ainda é fazê-lo tendo como
objetivo esse sucesso para todas as crianças.
O futuro do português como
língua mundial joga-se, verdadeiramente, em países como Cabo Verde. Países que,
sem complexos, têm sabido distinguir o acessório - o método - do objetivo, isto
é, a aprendizagem, por todos, com sucesso, da língua portuguesa. Portugal pode
ter um papel muito importante, apoiando estes esforços através da capacitação
dos professores e da disponibilização de meios técnicos e pedagógicos. M Lurdes Rodrigues – Portugal in “Diário
de Notícias”
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