Sou
um viguês nascido na década de 70. Fui
programado para falar em castelhano, como todos os rapazes da minha geração na
minha cidade, em tantas cidades, em tantos lugares. O grau de sucesso do programa foi
muito elevado, alcançando a quase unanimidade. Portanto, sou um minúsculo erro
de sistema.
O
erro de sistema que eu sou foi educado para ver a língua galega como local,
inútil e dialetal. Local porque só se falava na Galiza, ou
ainda pior, nas aldeias, ou pior ainda, só nos corpos humanos mais lesados polo
tempo. Inútil porque não dá os serviços mínimos que dá a língua castelhana,
aquilo que exige um cidadão corrente do século XXI, textos, software, música. Dialetal porque é um
arremedo do castelhano, porque não é autêntica, porque é uma cópia má.
O erro de
sistema decidiu falar em galego no final da adolescência e contestar esta visão
de uma língua que passava agora a ser dele. No entanto, tinha uma limitação
séria. Fora programado nas aulas de língua galega
para a ver, e portanto para a viver, como sendo só da Galiza. A língua das
sociedades brasileira, angolana ou portuguesa era outra, portanto era
estrangeira, portanto
não era dele e as produções que gerava, textos, software, música, eram alheias. A consequência direta desta
prescrição era que… o galego tinha pouca produção e tinha um padrão de língua
muito dependente do castelhano, eufemismos de “inútil” e “dialetal”.
Pouco depois, o
erro de sistema decidiu formatar o seu disco rígido, de vez. Formatar a
programação social a respeito da nossa língua, a que assentava em várias
gerações de galegos e galegas, a que irradiavam as elites e ecoavam aqueles que
as mantêm. E não só. Formatar a programação do galego da transição,
que como tantos produtos da transição era uma fantasia, um parece-que que
acabou sendo um para-nada, uma ilusão para satisfazer os que não sonham e os
que têm pesadelos que, por vezes, são os mesmos.
Duas décadas depois, o erro de sistema vive instalado na sua
língua. Ora, mudou a programação. A nova inclui uma língua internacional e
compartilhada, uma alta gama de produtos para viver nela e um formato de língua
soberano a respeito do castelhano. A minha filha, de poucos anos, conversa com
a Dora, a aventureira ou joga a ligar imagens de animais com uma voz que lhe
diz: tartaruga, tubarão, golfinho. A minha filha nasceu livre de programas
maliciosos, de esses que limitam. Somos já vários milhares de pessoas as que
formatamos o nosso disco rígido e tudo vai mais rápido, mais ágil, mais limpo.
A que estás esperando? A uma nova versão do mesmo programa? Que tal se
mudamos o sistema? Valentim Fagim – Galiza in “Praza Pública”
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